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"TERRORISMO"
Encenado pela Visceral Cia., espetáculo dos irmãos Presnyakov é obra-prima da nova dramaturgia russa
Peça incorpora tragédia da pós-modernidade
SERGIO SALVIA COELHO
CRÍTICO DA FOLHA
O aeroporto está fechado
porque uma mala foi abandonada na pista. Um passageiro
se indaga: haveria algum político
entre eles? Não: agora o alvo terrorista é o homem comum. Escrita pelos irmãos russos Presnyakov (o psicólogo Vladimir e o
professor de literatura Oleg), a peça "Terrorismo" foi escrita em
2000, antes, portanto, do 11 de Setembro de Nova York e dos atentados no teatro e na escola russos.
Como um diagnóstico sinistramente preciso da modernidade,
esta obra-prima da nova dramaturgia russa (fomentada, ela também, pelo Royal Court de Londres) ganhou nos últimos tempos
montagens por todo o mundo.
Além do tema urgente, isso se explica pelo seu humor sutil e profundo e a grande habilidade da
narrativa.
De fato, o encadeamento de cenas curtas, variando cenários, parece querer traçar um painel sobre as várias formas de terror (na
infidelidade, no trabalho, na família), um pouco como o "Terror
e Miséria no Terceiro Reich", de
Brecht. Mas aos poucos o público
vai montando o quebra-cabeças:
o marido traído é o executivo que
não embarca, que surge no parque onde as velhinhas tramam a
morte do genro, esbaforido porque surpreendeu a mulher, e por
isso na origem de um novo atentado.
O fato de tudo se encaixar demonstra com maestria a tese de
que o terrorismo faz hoje com que
todos sejam não só vítimas mas
cúmplices: além da liberdade,
perde-se o sentido da vida.
O primeiro mérito de Cristina
Cavalcanti é o de ter percebido a
importância deste texto. Levada a
dirigi-lo ela mesma, acumulando
funções (o que pode ter prejudicado sua performance enquanto
atriz, um pouco tolhida) sua encenação é meticulosa e promissora,
denunciando a inexperiência apenas em um excesso de esquematismo.
Amparado em um cenário ágil e
luz precisa, o espetáculo ganharia
com uma direção de atores mais
aprofundada, o que em parte é
compensado pela cancha de Lilian Blanc e uma bela cena de
Marcos Cesana, na qual o comandante do esquadrão anti-bomba
expõe a fragilidade do mundo
imitando o "happy birthday" de
Marlyn Monroe para Kennedy.
Momentos assim, com uma
surpreendente mistura de lirismo
e grotesco, impõem "Terrorismo"
como um gênero novo: uma tragédia da pós-modernidade. Sem
retórica, faz seu diagnóstico incômodo e devastador da globalizada
onda de atentados: "Por que, afinal de contas, não se trata de
quantos morrem... é coisa mais
assustadora. É o início de uma
reação em cadeia... pessoas inocentes são mortas; assim os inocentes se contaminam e os pacifistas vão fazer violência com o zelo de convertidos". Bem-vindo ao
século 21.
Terrorismo
De: Oleg e Vladimir Presnyakov
Direção: Cristina Cavalcanti
Com: Visceral Cia. (Eduardo Semerjian,
Marcos Cesana, Marcelo Góes, Lilian
Blanc, Tatiane Daud, Maristela Chelala,
Vera Kowalska, Marcelo Pacífico, Rogério
Rizzardi e Cristina Cavalcanti)
Onde: Viga Espaço Cênico (r. Capote
Valente, 1.323, Pinheiros, tel. 3801-1843)
Quando: ter. e qua., às 21h; até 15/12
Quanto: R$ 20
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