São Paulo, terça-feira, 26 de junho de 2001

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OPINIÃO

Uma nova política sanitária

JOSÉ HERMETO HOFFMANN

O GOVERNO do Rio Grande do Sul tem uma visão crítica sobre as regras internacionais de controle da febre aftosa, que não levam em consideração a realidade econômica e social dos países em desenvolvimento.
A febre aftosa é uma doença de impacto econômico e não afeta a saúde do ser humano. Depois de erradicada em alguns países que influenciam diretamente as normas da Organização Internacional de Epizootias (OIE), a doença passou a ser manipulada como barreira comercial. Os países que a erradicaram não mais aceitaram comprar produtos originários de zonas onde a aftosa ainda se manifestava nos rebanhos.
O acordo agrícola da Rodada Uruguai do GATT (Acordo Geral de Tarifas e Comércio), de 1995, e a posterior criação da Organização Mundial do Comércio acabaram com as limitações tarifárias, mas elas foram substituídas porbarreiras sanitárias, que, na verdade, funcionam como restrições econômicas contra os países em desenvolvimento.
Somente quem viu de perto o descalabro econômico e social provocado pela doença no município gaúcho de Jóia, no ano passado, sabe da seriedade com que o assunto deve ser tratado. A morte de mais de 11 mil animais em uma região de agricultura familiar, onde predomina a atividade leiteira, deixou estigmas profundos na população local.
Desde então, vínhamos alertando para a necessidade de modificar as políticas de combate à doença, inclusive as regras internacionais.
Para controlar a febre aftosa são necessárias ações de caráter continental, adequadas às características sociais, econômicas e geográficas de cada região.
O conceito de rifle sanitário, que implica o sacrifício de animais, é inaceitável. Não podemos concordar com a inutilização, para o consumo humano, de toneladas de proteínas de boa qualidade, em um mundo em que milhões de pessoas passam fome.
A credibilidade do Brasil no mercado internacional de carnes está mantida porque a eclosão de focos de aftosa ficou restrita a um único Estado, o Rio Grande do Sul. O presidente da OIE, Romano Marabelli, com quem mantivemos contato em Paris, em maio passado, foi categórico ao dar essa garantia.
A recente liberação da compra de carne brasileira pelo Reino Unido é prova disso. Em outras palavras, servimos de escudo sanitário para o rebanho nacional, contendo o avanço do vírus através dos mais de 1.800 km de fronteira aberta com o Uruguai e a Argentina.
A melhor notícia que nós, gaúchos, obtivemos em Paris, foi a garantia de que em 90 dias, não havendo novo foco, poderemos retomar a condição de zona livre de febre aftosa com vacinação.
A concretização dessa perspectiva está atrelada a um processo acelerado de vacinação e à eliminação da doença no Rio Grande do Sul.
Se hoje sacrificamos animais doentes é porque nossos apelos precoces ao retorno da vacina preventiva não foram atendidos pelo governo federal.
Sempre consideramos inconsistente o argumento de que a volta à vacinação prejudicaria a carne brasileira no mercado externo, o que ficou comprovado quando a União Européia informou que retomará as importações de carne gaúcha após a eliminação do último foco.
O controle da doença na região da fronteira demonstra a eficiência do trabalho de vigilância sanitária e o empenho dos técnicos gaúchos na luta contra a febre aftosa.
O Uruguai, considerado detentor do melhor sistema de vigilância da América Latina, já confirmou cerca de 1.600 focos da doença, enquanto aqui foram registrados apenas 21.
Comparado a outras regiões brasileiras, o Rio Grande do Sul tem a mais importante rede de controle do país, pois detém 10% das inspetorias veterinárias, embora seu território corresponda a apenas 3% do território nacional.
O sistema de vigilância sanitária gaúcha já demonstrou sua eficiência e capacidade técnica que derrubam, por inconsistentes, os argumentos que tentam desqualificá-lo perante a opinião pública nacional e o mercado externo.


José Hermeto Hoffman é secretário de Agricultura e Abastecimento do Rio Grande do Sul.



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