São Paulo, quinta-feira, 01 de abril de 2004

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SOMBRA NO PLANALTO

Ministro da Justiça diz que negociação de fita em que Waldomiro pede propina "parece ilegal"

Planalto vê conspiração para destruir Dirceu e depor Lula

IURI DANTAS
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

Designado como porta-voz do governo, o ministro da Justiça, Márcio Thomaz Bastos, definiu ontem como "conspiração" a reunião entre o subprocurador-geral da República José Roberto Santoro e o empresário de jogos Carlos Augusto de Almeida Ramos, o Carlinhos Cachoeira. O único objetivo de Santoro seria "destruir o ministro José Dirceu [Casa Civil] e derrubar o governo Lula".
"Havia, de fato, e a fita [com os diálogos] denota isso, uma espécie de conspiração. Para quê? Para apurar o caso Waldomiro? Para descobrir delitos cometidos por essa pessoa, que é o que a fita indicava? Não. Muito mais que isso, conforme verbalizado, até num calão duvidoso, pelo subprocurador Santoro, o que se verifica dessa reunião na madrugada é que se pretendia ferrar, entre aspas, o ministro Zé Dirceu e derrubar o governo Lula", afirmou.
Anteontem, o "Jornal Nacional", da TV Globo, divulgou trechos de uma conversa em que Santoro tenta convencer Cachoeira a lhe entregar a gravação em que Waldomiro Diniz, ex-subchefe na pasta de Dirceu, pede propina ao empresário de jogos em 2002. A divulgação da fita em 13 de fevereiro deu início à principal crise do governo Lula. Com os diálogos trazidos à tona anteontem, o governo pôde respirar.
"Falei com o presidente da República, ele se mostrou indignado com o conteúdo da fita, como também fiquei", disse o ministro.
Ontem, o "Jornal Nacional" divulgou novo trecho no qual Santoro diz a Cachoeira que poderia resguardar o jornalista Mino Pedrosa, assumindo o vazamento da fita com o episódio envolvendo Waldomiro. "O Mino tá doido. Eu tô com pena, que ele chegou pra mim e falou assim: "Olha, Santoro, essa... vai estourar nas minhas costas porque eu tive com a desgraçada desta fita 24 horas"."
Pedrosa afirmou que sua relação com Cachoeira, se restringe hoje a um contrato de assessoria de imprensa. "Cachoeira se comprometeu com um jornalista -que divulgou reportagem mostrando a proximidade entre Waldomiro e a GTech-, que, se fosse necessário, mostraria a fita em que Waldomiro pede propina."

Conduta de procurador
Thomaz Bastos, que advogou por 45 anos, disse que a conduta de Santoro "parece ilegal". "Toda situação descrita naquela fita parece ilegal. Ele [Santoro] não era o promotor natural, ia ouvir de madrugada, e as ameaças de baixo calão, "estou empenhado em derrubar o governo, estou empenhado em ferrar o ministro Zé Dirceu". Havia efetivamente ali uma interação, uma conspiração que não visava ao conteúdo da fita."
Na avaliação do ministro, Santoro feriu o princípio do promotor natural, segundo o qual não se pode escolher quem se vai investigar. "Agora, essas tarefas [dos procuradores] têm que ser realizadas com impessoalidade, atendendo ao princípio da moralidade, ao princípio do promotor natural, que é fundamental, a fim de que, no Estado de Direito, no Estado republicano, escapemos do arbítrio, da possibilidade de sermos escolhidos arbitrariamente para sermos objeto de investigação, objetos de perseguição."
Thomaz Bastos concedeu a entrevista após conversar por telefone com o procurador-geral da República, Claudio Fonteles, superior hierárquico de Santoro, que pediu à Corregedoria do Ministério Público Federal para investigar a conduta do subprocurador.
"Não apenas fazer uma investigação simplesmente pericial dessa fita, mas uma apuração dessas articulações, como nós determinamos que a Polícia Federal fizesse do caso Waldomiro", frisou.
O delegado da PF Giácomo Santoro participou da conversa do subprocurador com Cachoeira. Segundo o ministro, será aberta sindicância sobre a conduta dele.


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