São Paulo, domingo, 01 de julho de 2007

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EUA alertavam a ditadura sobre a cobrança externa

Kissinger avisou sobre a pressão do Congresso dos EUA por causa do desaparecimento do militante político Stuart Angel

Morte de Vladimir Herzog na sede do DOI-CODI em São Paulo, em outubro de 1975, foi recebida com dúvidas pela diplomacia americana

DA REPORTAGEM LOCAL

Embora pontuados por críticas a abusos contra os direitos humanos, os telegramas do serviço diplomático americano em 1975 revelam que os EUA também trabalhavam para alertar o governo brasileiro sobre eventuais problemas políticos no exterior.
"GOB [governo brasileiro] deve ser informado rapidamente sobre o crescente interesse congressual [americano] e a possibilidade de uma forte reação sobre esse caso", escreveu, em telegrama enviado à embaixada americana em Brasília, o então secretário de Estado dos EUA, Henry Kissinger. Ele se referia ao desaparecimento, em 1971, do estudante e militante do MR-8 (Movimento Revolucionário 8 de Outubro) Stuart Edgar Angel Jones, 26, com cidadanias brasileira e americana.
Stuart era filho da estilista Zuzu Angel, que morreria num controverso acidente de trânsito no Rio de Janeiro poucos meses depois do telegrama de Henry Kissinger (o documento é de julho de 75, sua morte, abril de 76). Além de procurar personalidades e políticos americanos, ela havia entregue a Kissinger uma carta na qual narrou o drama do desaparecimento do filho.
Um dos telegramas diz que os americanos foram a campo atrás de resposta sobre o desaparecido. "Buscas em São Paulo, Rio e aqui [Brasília] não revelaram nenhuma significante informação adicional sobre o caso", diz o documento, assinado pelo embaixador em Brasília, John Hugh Crimmins.
Os americanos haviam coletado a cópia de uma carta que revelava o suposto destino de Stuart. O também preso político Alex Polari de Alverga testemunhou ter visto Stuart sofrer torturas até a morte no prédio do Cisa (Centro de Informações da Aeronáutica), em 1971.
Com base nesse depoimento, segundo os telegramas, Crimmins cobrou uma explicação do Ministério das Relações Exteriores brasileiro. O embaixador não se mostrou muito confiante nos resultados: "Nós vamos, é claro, ficar em contato com a resposta do ministro das Relações Exteriores, [mas] não vemos nenhum motivo para esperar que será diferente da resposta oficial do passado".

Herzog
Fato marcante de 1975, a morte do jornalista Vladimir Herzog na sede do DOI-CODI em São Paulo, em outubro, foi recebida pelos americanos com dúvidas, mas os 12 telegramas sobre o assunto tornados públicos não tomam partido de nenhuma das versões, a oficial, de suicídio, ou a do assassinato sob tortura seguido de uma encenação.
Os americanos receberam com ironia o resultado do inquérito do Exército aberto para apurar a morte e divulgado no final daquele ano. "Ninguém realmente esperava que o Exército acusasse a si próprio, e ninguém ficou surpreso com os resultados das investigações. A reação ao relatório tem sido escassa e silenciosa", diz o telegrama assinado pelo embaixador Crimmins. (RUBENS VALENTE)


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