São Paulo, segunda-feira, 01 de novembro de 2004

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VISÃO DE FORA

Jornalista diz que complexo de inferioridade motiva país a burlar lei

"NYT" coloca sob suspeita programa nuclear do Brasil

DE NOVA YORK

O jornalista norte-americano Larry Rohter, do "New York Times", soou ontem o gongo para mais um round contra o governo Luiz Inácio Lula da Silva. Em reportagem sobre o programa nuclear brasileiro, Rohter acusa o país de tentar burlar a legislação internacional motivado por um complexo de inferioridade.
Em maio, o correspondente no Brasil já havia provocado polêmica após a publicação de texto que em afirmava existir uma suposta "preocupação do país com o hábito de beber" de Lula. O governo chegou a cancelar o visto do jornalista, mas depois desistiu.
"O Brasil sempre quis ser levado a sério como uma potência pelos pesos-pesados, e machuca os brasileiros que líderes mundiais possam confundir seu país com a Bolívia, como fez [o americano] Ronald Reagan, ou desprezar um país tão grande como "um país que não pode ser levado a sério", como fez [o francês] Charles de Gaulle", escreve Rohter, ao evocar episódios ocorridos, respectivamente, há duas e seis décadas.
O texto, sob o título "Se o Brasil quer assustar o mundo, está conseguindo", cita o país como "a terra do futebol e do samba, habitada por gente amigável", e pergunta: "Por que o país se envolveu numa disputa com a Agência Internacional de Energia Atômica, acusada por especialistas americanos e de outros países de violar as leis internacionais e ajudar países desonestos como o Irã e a Coréia do Norte?".
As negociações sobre a inspeção da AIEA à fábrica brasileira de enriquecimento de urânio em Resende (RJ) prosseguem. No último dia 19, o governo permitiu uma vistoria parcial -o acesso às centrífugas nucleares foi negado, mas uma nova inspeção está sendo debatida. De um lado, o governo alega ter o direito de manter a tecnologia nacional em sigilo e diz que a produção visa o setor energético. De outro, a agência teme que o urânio enriquecido pare nas mãos de quem o use para produzir armas, o que viola o Tratado de Não-Proliferação Nuclear, assinado pelo Brasil em 1997.
O tema entrou na pauta de discussão americana e foi debatido pelo secretário de Estado, Colin Powell, em recente visita ao Brasil. Em viagem em outubro a Boston, até o presidente do Banco Central, Henrique Meirelles, se viu inquirido por investidores sobre o programa nuclear.
O único brasileiro citado no texto de Rohter é o ex-ministro da Ciência e Tecnologia José Goldemberg, que apontou exageros tanto na posição do governo brasileiro como na reação americana. Todos as demais fontes citadas são analistas americanos.
"O programa nuclear brasileiro já consumiu mais de US$ 1 bilhão, que poderia ser usado para reduzir a pobreza, e o tom de segredo só aumentou as suspeitas da credibilidade e das intenções [do país]", escreve Rohter.

Outro lado
Por meio de sua assessoria de imprensa, o ministro Eduardo Campos (Ciência e Tecnologia) informou ontem que só voltará a comentar a questão das inspeções na unidade de Resende depois de receber uma resposta da AIEA -o que deve ocorrer em no máximo 15 dias.
De acordo com o ministério, o Brasil espera carta em que a agência dirá se aceita ou não a proposta brasileira de inspeção.
Parte da decisão da AIEA estará baseada no relatório dos técnicos da agência que visitaram o Brasil em outubro.
(LUCIANA COELHO)


Colaborou a Sucursal de Brasília


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