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São Paulo, quarta-feira, 02 de abril de 2003

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TENSÃO NO CAMPO

Para dom Tomás Balduíno, governo evita "confronto com latifúndio" para não ferir "lógica da governabilidade"

Pastoral diz sentir "frustração" com Lula

RAFAEL CARIELLO
DA REPORTAGEM LOCAL

O presidente da CPT (Comissão Pastoral da Terra), dom Tomás Balduíno, disse ontem que existe um sentimento de frustração na entidade em relação à política de reforma agrária do governo Luiz Inácio Lula da Silva.
"Não se tocou ainda na questão do latifúndio", disse Balduíno, que participou da reunião da CPT que avaliou ontem a política agrária do governo federal. A discussão faz parte da 16ª Assembléia Nacional da pastoral, que acontece até amanhã, em Goiânia (GO).
Segundo Balduíno, a análise da entidade é que "não houve resposta sinalizadora clara de confronto com o latifúndio, como era esperado" nesses primeiros três meses de governo Lula.
Ou seja, a avaliação dos integrantes da CPT é que a desapropriação de terras para assentamento de trabalhadores rurais é lenta. A opinião é secundada por dom Pedro Casaldáliga, bispo aposentado de São Félix do Araguaia (MT, divisa com TO) e um dos fundadores da CPT -braço agrário e progressista da Igreja Católica que tem como tradição o apoio às ações do MST e que no governo Lula comanda duas superintendências estaduais do Incra (Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária).
Casaldáliga afirma que o sentimento na reunião foi de "um certo cansaço na paciência" com o governo.
Em discurso para trabalhadores sem-terra em Mato Grosso do Sul na semana passada, Lula disse que a prioridade do governo é com a "qualidade" dos assentamentos, e não com a quantidade.
Dom Tomás Balduíno avalia que a "ausência de confronto com o latifúndio" se deve à prioridade dada pelo governo à "lógica da governabilidade".
"Talvez considerem que isso iria tocar nesse ponto sensível. Então essa expectativa passa para o segundo plano", afirmou. O bispo diz acreditar que a lógica seguida pelo governo independe da vontade do presidente. "Lula representa a esperança ainda."
Balduíno afirma que ainda há a expectativa de que ocorra "enfrentamento ao latifúndio". Ele diz, entretanto, que isso geraria "descontentamento de uma força que está dentro do próprio governo". "Essas expectativas contrariam o que para o capital é dogma: a propriedade privada."
Balduíno comentou a aparente mudança de opinião do ministro Miguel Rossetto (Desenvolvimento Agrário) sobre a medida provisória herdada do governo anterior que torna terras invadidas indisponíveis para vistorias com fins de desapropriação por dois anos. Em palestra a proprietários rurais anteontem em São Paulo, Rossetto disse que o governo não pretende modificar a MP.
O presidente da CPT disse preferir acreditar em afirmações anteriores do ministro, contrárias à MP. Questionado sobre se Rossetto não teria mudado de opinião, disse: "Terá mudado ou é tática?".
Ele diz, repetindo trecho de nota da CPT à imprensa, que "a medida provisória que criminaliza as ocupações no campo é a principal responsável pelo aumento da violência contra os trabalhadores". A entidade critica também a formação de milícias privadas pagas pelos proprietários rurais no país e cobra do governo o seu "desmantelamento".
Na mesma nota, a CPT afirma que nos primeiros dois meses deste ano foram assassinados 10 trabalhadores -um aumento de 10% em relação ao mesmo período do ano passado- e defende o encaminhamento de um projeto de lei que limite o tamanho das propriedades rurais.


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