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REED BRODY
"EUA são recordistas em violações de liberdades públicas"
LIANE FACCIO
DA REDAÇÃO
O advogado Reed Brody, 49,
veio ao Brasil mais de uma vez
quando sua causa mais famosa
ganhou notoriedade. De 1998 a
2000, o mundo todo acompanhou
o processo que Brody, então advogado da Human Rights Watch,
moveu contra o ex-ditador chileno Augusto Pinochet na Corte
britânica, preso por ordem do juiz
espanhol Baltazar Garzón.
Hoje mora em Nova York, é
porta-voz da Human Rights
Watch, uma das mais influentes
organizações de defesa de direitos
humanos do mundo, esteve no
país, na semana passada, e participou do 3º Colóquio Internacional de Direitos Humanos. Ele critica o que considera violações às
liberdades públicas nos EUA. "Os
EUA travam uma jihad ideológica
contra a justiça internacional."
Leia trechos da entrevista.
Folha - Como é morar em Nova
York depois do 11 de setembro?
Reed Brody - Vive-se com dificuldade porque há um sentimento de que somos vítimas, e não
perpetradores. Eu vi as torres gêmeas caírem. Mas as consequências sobre a vida e a situação dos
direitos humanos têm sido nefastas. Muitos países violam os direitos humanos e usam como pretexto a luta contra o terrorismo.
Folha - Os EUA usam isso?
Brody - Nos dois últimos anos, vi
nos EUA os maiores recordes de
violações de liberdades públicas
desde a Segunda Guerra Mundial.
Juízes federais aceitam que cidadãos sejam detidos indefinidamente e percam o acesso a advogados, porque são considerados
"combatentes inimigos". Crianças de 13 e 14 anos são presas em
Guantánamo [base americana em
Cuba] e argumenta-se que não há
como contestar sua detenção, que
não há autoridade
sobre a legalidade
da detenção por
tempo indefinido.
Folha - Qual a repercussão disso?
Brody - Quando
os EUA, um dos
mais fortes para reclamar sobre os direitos humanos,
cometem violações
que antes denunciavam, é difícil defender direitos humanos. Nos EUA,
as restrições não
afetam o cidadão
comum, estão dirigidas aos não-cidadãos norte-americanos, aos de ascendência árabe e muçulmana.
Folha - O fato de os EUA desrespeitarem as indicações da ONU
contra a guerra não afeta as ONGs?
Brody - A melhor
arma das ONGs de
direitos humanos é
a lei. Quando os
EUA ferem esse direito, esse sistema
fica vulnerável.
Folha - Seu país
tem sofrido limitações à liberdade de
expressão?
Brody - Há um clima que dificulta a
crítica. Fui à TV falar sobre Guantánamo e fui tratado como traidor. Assim
se reduz o espaço
para o debate.
Folha - Qual a
maior tensão?
Brody - Quando os prisioneiros
começaram a chegar a Guantánamo. Quem fala em direitos humanos é visto como opositor. Se é interesse dos EUA que haja justiça e
o terrorismo se alimenta da injustiça e da desigualdade, temos de
lutar contra essas causas.
Folha - Como vai funcionar o Tribunal Penal Internacional?
Brody - É uma esperança. Os
EUA travam uma "jihad ideológica" contra a justiça internacional,
vista como uma forma de limitar
a ação americana. Para o Pentágono, não há interesse em se vincular às mesmas regras que os outros países. Os EUA pressionam
outros países para firmar acordos
de impunidade bilaterais que os
obrigam a não mandar cidadãos
americanos à Corte Internacional. Na semana passada, Albânia
e Bósnia assinaram esses acordos.
Ou seja, o país que impulsionou
o Tribunal de Nurembergue, que
estabeleceu o juízo contra o nazismo, quando se trata de seus interesses, age diferente. Os dirigentes
dos EUA preferem a lei da selva ao
pensamento do direito.
Folha - E os crimes cometidos no
Iraque?
Brody - Nossa idéia é um tribunal internacionalizado. Estimamos em pelo menos 250 mil as vítimas iraquianas de Saddam Hussein. Os EUA querem um tribunal
de iraquianos, e essa idéia é sedutora, pois os iraquianos cometeram atrocidades contra eles.
Folha - O sr. criticou a atuação do
Brasil na comissão de direitos humanos da ONU...
Brody - A resolução das atrocidades na Tchetchênia foi rechaçada, e o Brasil votou contra e se
absteve na questão de Cuba. Esperava mais do governo Lula.
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