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São Paulo, segunda-feira, 02 de junho de 2003

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REED BRODY

"EUA são recordistas em violações de liberdades públicas"

LIANE FACCIO
DA REDAÇÃO

O advogado Reed Brody, 49, veio ao Brasil mais de uma vez quando sua causa mais famosa ganhou notoriedade. De 1998 a 2000, o mundo todo acompanhou o processo que Brody, então advogado da Human Rights Watch, moveu contra o ex-ditador chileno Augusto Pinochet na Corte britânica, preso por ordem do juiz espanhol Baltazar Garzón.
Hoje mora em Nova York, é porta-voz da Human Rights Watch, uma das mais influentes organizações de defesa de direitos humanos do mundo, esteve no país, na semana passada, e participou do 3º Colóquio Internacional de Direitos Humanos. Ele critica o que considera violações às liberdades públicas nos EUA. "Os EUA travam uma jihad ideológica contra a justiça internacional." Leia trechos da entrevista.
 

Folha - Como é morar em Nova York depois do 11 de setembro?
Reed Brody -
Vive-se com dificuldade porque há um sentimento de que somos vítimas, e não perpetradores. Eu vi as torres gêmeas caírem. Mas as consequências sobre a vida e a situação dos direitos humanos têm sido nefastas. Muitos países violam os direitos humanos e usam como pretexto a luta contra o terrorismo.

Folha - Os EUA usam isso?
Brody -
Nos dois últimos anos, vi nos EUA os maiores recordes de violações de liberdades públicas desde a Segunda Guerra Mundial. Juízes federais aceitam que cidadãos sejam detidos indefinidamente e percam o acesso a advogados, porque são considerados "combatentes inimigos". Crianças de 13 e 14 anos são presas em Guantánamo [base americana em Cuba] e argumenta-se que não há como contestar sua detenção, que não há autoridade sobre a legalidade da detenção por tempo indefinido.

Folha - Qual a repercussão disso?
Brody -
Quando os EUA, um dos mais fortes para reclamar sobre os direitos humanos, cometem violações que antes denunciavam, é difícil defender direitos humanos. Nos EUA, as restrições não afetam o cidadão comum, estão dirigidas aos não-cidadãos norte-americanos, aos de ascendência árabe e muçulmana.

Folha - O fato de os EUA desrespeitarem as indicações da ONU contra a guerra não afeta as ONGs?
Brody -
A melhor arma das ONGs de direitos humanos é a lei. Quando os EUA ferem esse direito, esse sistema fica vulnerável.

Folha - Seu país tem sofrido limitações à liberdade de expressão?
Brody -
Há um clima que dificulta a crítica. Fui à TV falar sobre Guantánamo e fui tratado como traidor. Assim se reduz o espaço para o debate.

Folha - Qual a maior tensão?
Brody -
Quando os prisioneiros começaram a chegar a Guantánamo. Quem fala em direitos humanos é visto como opositor. Se é interesse dos EUA que haja justiça e o terrorismo se alimenta da injustiça e da desigualdade, temos de lutar contra essas causas.

Folha - Como vai funcionar o Tribunal Penal Internacional?
Brody -
É uma esperança. Os EUA travam uma "jihad ideológica" contra a justiça internacional, vista como uma forma de limitar a ação americana. Para o Pentágono, não há interesse em se vincular às mesmas regras que os outros países. Os EUA pressionam outros países para firmar acordos de impunidade bilaterais que os obrigam a não mandar cidadãos americanos à Corte Internacional. Na semana passada, Albânia e Bósnia assinaram esses acordos.
Ou seja, o país que impulsionou o Tribunal de Nurembergue, que estabeleceu o juízo contra o nazismo, quando se trata de seus interesses, age diferente. Os dirigentes dos EUA preferem a lei da selva ao pensamento do direito.

Folha - E os crimes cometidos no Iraque?
Brody -
Nossa idéia é um tribunal internacionalizado. Estimamos em pelo menos 250 mil as vítimas iraquianas de Saddam Hussein. Os EUA querem um tribunal de iraquianos, e essa idéia é sedutora, pois os iraquianos cometeram atrocidades contra eles.

Folha - O sr. criticou a atuação do Brasil na comissão de direitos humanos da ONU...
Brody -
A resolução das atrocidades na Tchetchênia foi rechaçada, e o Brasil votou contra e se absteve na questão de Cuba. Esperava mais do governo Lula.



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