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"OPERAÇÃO GATINHO"
Maior contrabandista do país, segundo CPI, ia pagar US$ 2 mi
Empresário é preso ao tentar corromper deputado em SP
RUBENS VALENTE
CHICO DE GOIS
DA REPORTAGEM LOCAL
Em ações simultâneas deflagradas ontem à tarde em São Paulo, a
Polícia Federal de Brasília prendeu Law Kin Chong, 43, empresário chinês naturalizado brasileiro,
e o advogado e despachante aduaneiro Pedro Lindolfo Sarlo, sob
acusação de terem tentado corromper por US$ 2 milhões o presidente da CPI da Pirataria, Luiz
Antonio de Medeiros (PL-SP), 53.
A ação foi batizada de "Operação Shogun", mas, informalmente, os policiais e integrantes da
CPI a chamavam de "Operação Gatinho".
O deputado federal foi o próprio autor da denúncia. Chong,
segundo Medeiros, queria um
abrandamento das acusações no
relatório final da CPI, prestes a ser
apresentado ao Congresso.
O empresário, dono de 600 lojas
em três shoppings populares de
São Paulo, segundo a CPI, é o
maior contrabandista do país,
mas nunca havia sido preso.
Às 14h40, quatro agentes da PF
arrebentaram a chutes a porta da
sala principal do escritório do deputado, no bairro do Paraíso, em
São Paulo, e deram voz de prisão a
Sarlo. A operação foi acompanhada pela Folha, de uma sala em
frente à do parlamentar, e por
uma equipe da TV Globo, que entrou atrás dos policiais.
Sob a mira de pistolas, Sarlo foi
algemado e negou ser dono do dinheiro, mas uma câmera oculta
na prateleira da sala desmentiu o
advogado. O dinheiro foi trazido
por ele, escondido na calça e nos
bolsos internos do paletó.
Sarlo retirou os pacotes de dinheiro e estendeu-os na mesa de
Medeiros. Os policiais acompanharam tudo de outro ponto do
escritório do deputado e decidiram invadir a sala. Quando a PF
entrou, na mesa havia US$ 75 mil
em notas de cem, que o advogado
havia trazido como primeiro sinal
da corrupção. A proposta era parcelar o pagamento.
"Você está preso", afirmou Medeiros, colocando fim a um mês
de investigações e de gravações de
vídeo e de áudio que detalham o
assédio de Chong.
"Esse dinheiro não é meu", respondeu Sarlo aos jornalistas, segundos depois de ter sido algemado. Minutos mais tarde, em outra
sala, o advogado só murmurava:
"O que esse deputado fez comigo?
O que esse homem me fez?".
Sarlo pediu à PF para fazer um
telefonema e, às 14h53, falou com
seu filho pelo celular: "Seu pai está
preso". À Folha, o advogado repetiu que o dinheiro não era dele,
"não estava em minhas mãos, estava em cima da mesa". Logo depois, pediu para a polícia retirar a
reportagem da sala.
Ao mesmo tempo, no centro da
cidade, uma equipe da PF vasculhava as empresas de Chong para
tentar prendê-lo. Ele só foi localizado porque uma pessoa tentou
falar no telefone celular de Sarlo
minutos depois da sua prisão.
Um agente da PF telefonou para
o número da memória do celular
e, do outro lado da linha, ouviu:
"Aqui é o Law". O policial indagou então onde ele estava, e o empresário disse: "Na [rua] 25 de
Março". A ligação foi rastreada
pela polícia, e Chong acabou localizado num estacionamento de
veículos da avenida Senador
Queirós, no centro de São Paulo.
Ao chegar algemado à sede da
PF, Chong não deu declarações.
Seu advogado, Elcio Scapaticio,
disse que a prisão foi "armação de
Medeiros".
Hotel
A primeira proposta de Chong a
Medeiros, segundo o deputado,
ocorreu em 19 de abril último. O
advogado Sarlo telefonou para o
chefe da inteligência da comissão,
o inspetor da Polícia Rodoviária
Federal cedido à CPI, Fernando
Miranda, 39, e afirmou que tinha
informações "importantes" para
a comissão e que precisava falar
com ele e com Medeiros.
O encontro entre os três ocorreu em 23 de abril no restaurante
do Hotel Mercure, em São Paulo.
Depois das apresentações, o deputado deixou o assessor conversando com o advogado e foi embora. No final da conversa, segundo Miranda, já sem a presença do
parlamentar, Sarlo então ofereceu
US$ 2 milhões para que Medeiros
"aliviasse" as acusações contra
Chong em seu relatório.
No mesmo dia, o deputado encaminhou à PF de Brasília um relatório em que Miranda descreveu o encontro e a proposta de
Chong. "[...] O dr. Pedro Lindolfo
[Sarlo] dizia ser representante do
empresário Law e que gostaria de
propor um acordo onde o empresário Law King [sic] Chong estaria
oferecendo a quantia de sete milhões de reais para que não mais o
investigasse", diz trecho do ofício
assinado por Medeiros.
A partir daí, o deputado e seu
assessor passaram a gravar os telefonemas de Sarlo. Todas as ligações eram feitas pelo advogado a
um telefone celular dado a Miranda pelo próprio Sarlo. O advogado, segundo o assessor, disse que
o aparelho era seguro por ter sido
fornecido por contatos seus na
Abin, a Agência Brasileira de Inteligência.
Medeiros decidiu marcar um
encontro entre ele e o próprio
Chong. O deputado hospedou-se
às 9h da última quinta-feira no
quarto número 210 do Hotel Eldorado, em Araraquara, no interior paulista. Por volta das 12h30,
chegou Chong.
O quarto estava sendo filmado
por uma câmera oculta. As imagens eram acompanhadas de outro apartamento por equipe da inteligência da CPI da Pirataria e pela TV Rede Globo. "Ele me ofereceu US$ 2 milhões, depois, US$
1,5 milhão, em parcelas", disse
Medeiros que, ao final da conversa, apertou a mão do empresário
como sinal de "negócio fechado".
Imagens divulgadas ontem pelo
"Jornal Nacional" mostraram
Chong oferecendo, no hotel, "um
aluguel e meio". A expressão se
referia a US$ 1,5 milhão.
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