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CELSO PINTO
Aposta contra o Brasil
A nova onda de desconfiança
em países emergentes, que vem
tomando corpo desde o mês passado, voltou a polarizar opiniões
em relação ao Brasil. Muita gente
aposta que o Brasil atravessará
até 99 sem encarar outra crise
monetária, mas há exceções.
Uma delas é a análise feita pela
Bank Credit Analyst (BCA), uma
respeitada empresa de pesquisa,
sediada no Canadá, usada por
bancos e investidores institucionais internacionais. Assinada por
David Abramson, datada de 23
de junho, a análise da BCA traça
alguns paralelos entre o Brasil de
hoje e o México anterior ao colapso de 1994.
Mesmo sem prever que o Brasil,
necessariamente, vai passar por
uma crise idêntica à sofrida pelo
México, a BCA sugere que os investidores apostem no pior. Como
eles consideram que o custo de
apostar diretamente contra o real
é muito alto, em razão dos prêmios no mercado futuro e dos
controles sobre capitais especulativos, "a melhor estratégia envolve vender a Bovespa, pelo menos
até que a pressão contra a moeda
atinja extremos insuportáveis".
Traduzindo: a maneira clássica
de apostar na desvalorização de
uma moeda é comprar dólares no
mercado futuro à cotação atual
na moeda local. Se houver a desvalorização, os dólares que serão
recebidos no futuro valerão muito mais quando trocados pela
moeda local.
Como no Brasil o custo de fazer
essa especulação é alto, a BCA
sugere que se aposte na queda da
Bolsa de Valores de São Paulo,
como uma alternativa. A BCA vê
quatro cenários nos quais aumentam as chances de haver uma
desvalorização desordenada do
real e um tombo na bolsa.
O primeiro seria uma queda de
15% ou mais na bolsa americana.
Nesse caso, "provavelmente seria
necessário adiar a privatização
da Telebrás, que tem cativado a
atenção dos investidores estrangeiros e das corretoras". A bolsa
despencaria.
O segundo seria uma desestabilização na Rússia ou uma desvalorização do iene superior a 150
ienes por dólar. Qualquer dos
dois eventos elevaria o prêmio de
risco para países emergentes "e
tornaria as moedas ligadas ao
bloco do dólar mais caras". É o
caso do real.
O terceiro seria uma forte queda adicional nos preços do petróleo e do cobre. Isso afetaria México, Venezuela e Chile, que representam 4,8% do comércio brasileiro. Uma desvalorização do peso mexicano além de 10 pesos por
dólar "exacerbaria a sobrevalorização do real".
O quarto seria o temor de um
descontrole fiscal no Brasil que
acompanhasse uma queda na popularidade do presidente. Principalmente se o candidato de oposição "não der seu endosso integral ao regime cambial".
A BCA sugere que o potencial
brasileiro é enorme, pelo fim da
inflação, o tamanho do mercado
interno e o preço barato das
ações. Só que o Brasil "é viciado"
em capital externo, dado seu baixo nível de poupança interna, e a
crise asiática complicou a situação para o país.
O potencial positivo do país é
uma das semelhanças apontadas
entre o Brasil de hoje e o México
de 94. Existem outras.
Nos dois casos há uma forte sobrevalorização cambial, embora
o déficit externo mexicano fosse o
dobro (8% do PIB) do que é o
déficit brasileiro hoje. O Brasil
tem emitido muito papel indexado ao dólar, como o México fez, e
há um acúmulo de vencimentos
da dívida interna a curto prazo.
No México, a bolsa atingiu o pico
algum tempo antes da crise; no
Brasil, o pico foi no ano passado.
Nos dois casos, o ciclo econômico é de baixa, com desemprego
em alta. Nos dois casos, há uma
eleição presidencial que, no México, levou a gastos eleitoreiros,
risco que a BCA também vê no
Brasil.
As diferenças, contudo, são significativas em favor do Brasil:
metade do déficit externo, reservas muito mais altas, menor proporção de títulos indexados ao
dólar, prazo médio da dívida interna maior e uma política cambial recente com desvalorização
acima da inflação. "Mesmo assim, o preço de manter um câmbio vinculado aumenta a cada
novo sinal de deflação em mercados emergentes", observa o trabalho.
As próprias ressalvas da análise
mostram que há um exagero na
comparação entre o Brasil de hoje e o México de 94. A análise
serve, de todo modo, como ilustração do tipo de percepção que
parte do mercado tem, hoje, do
Brasil.
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