São Paulo, domingo, 02 de agosto de 2009

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Tutor de cabo Anselmo é acusado de tortura

Associação de perseguidos políticos afirma que há depoimentos de pessoas torturadas no Dops por delegado, que nega acusações

Carlos Alberto Augusto diz que atuou somente como informante na perseguição a militantes e que se sente preparado para novo golpe

LUCAS FERRAZ
EM SÃO PAULO

O delegado Carlos Alberto Augusto, do 12º distrito de São Paulo, é suspeito de comandar sessões de tortura no Dops (Departamento de Ordem Política e Social) da capital na ditadura militar (1964-85). Amigo e tutor do cabo Anselmo, ambos participaram como informantes de um dos mais violentos episódios do regime.
Carlos Alberto trabalhou de janeiro de 1970 a 1977 no Dops, onde respondia diretamente ao chefe do órgão, Sérgio Paranhos Fleury. De acordo com Ivan Seixas, diretor do Fórum dos Ex-Presos e Perseguidos Políticos de São Paulo, há vários testemunhos de pessoas torturadas por ele nas dependências do Dops. "Ele era conhecido lá como Carlinhos Metralha. Eu mesmo o via andando sempre com uma metralhadora pendurada no ombro."
Ivan apontou Carlos Alberto como torturador em audiência recente no Ministério Público Federal de SP. O delegado nega.
"Isso é mentira. Eu era agente de informação, não trabalhava em ações", afirma. "Apenas cumpri meu dever de defender o país do comunismo. Não me arrependo de nada."
Aos 66 anos, Carlos Alberto ainda parece viver nos anos de chumbo. Diz estar pronto para servir as Forças Armadas caso seja necessário um novo golpe.
"O país que eu desejo não é este que está aí. Esses caras do governo [Lula] são todos sanguinários. Tudo comunista bandido e covarde. Estou à disposição dos militares na hora em que eles precisarem de novo."
O delegado considera Anselmo, tido como um dos maiores delatores da ditadura, um injustiçado. Em sua conta, só no Dops paulista havia mais de 50 informantes da repressão que eram de organizações de esquerda. "Havia de tudo. De padres a médico. No trabalho que fazia, tinha acesso a alguns."
José Anselmo dos Santos, o líder dos marinheiros que detonou a queda do governo João Goulart, em 64, e que depois virou informante da repressão, tenta 45 anos depois reaver seus documentos originais. Na última quinta, ele fez perícia na Justiça Federal de SP para obter de novo carteira de identidade, CPF e título eleitoral.

Massacre
A última ação de Anselmo ocorreu junto com Carlos Alberto. No episódio, conhecido como massacre de São Bento, foram assassinados seis militantes da VPR (Vanguarda Popular Revolucionária). No livro "A Ditadura Escancarada", o jornalista Elio Gaspari descreveu a ação como uma "das maiores e mais cruéis chacinas da ditadura".
O ex-marujo tinha vida dupla: fingia militar na organização, mas entregava companheiros. Carlos Alberto também se infiltrou na VPR por três anos.
Na época, a versão oficial era de que houve tiroteio quando os oficiais cercaram o local.
Mas os seis da VPR foram capturados em pelo menos quatro lugares diferentes. Os corpos, encontrados na chácara. "Os mortos da VPR teriam disparado dezoito tiros, sem acertar um só. Receberam 26, catorze na cabeça", escreveu Gaspari.


Colaborou ANDRÉ CAMARANTE , da Reportagem Local


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