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ELIO GASPARI
Boa notícia: "Free" chegará às livrarias
Com a economia da abundância, o século 21 terá o mercado do grátis, onde se ganhará muito dinheiro
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CHEGA NAS PRÓXIMAS semanas às livrarias "Free - O Futuro de um Preço Radical", de Chris Anderson, editor da revista "Wired". A palavra inglesa "free" quer dizer livre, mas também significa grátis. Sua tese é fascinante: dado que os custos da memória dos computadores, do armazenamento e da transmissão de informações tornaram-se desprezíveis, o século 21 assistirá ao crescimento da economia das coisas sem custo, como o Google, a Wikipedia e os softwares abertos. (Em 1960, um transistor custava US$ 100, foi vendido a US$ 10 e hoje custa zero (na verdade, US$ 0,000015).
Quem reage ao preço de R$ 0,00 argumentando que "não existe almoço grátis" ganhará com "Free" uma rica aventura intelectual. Ele não prova que o almoço exista, mas mostra quando e como ele aparece.
Na hora em que a Microsoft, a maior empresa de comercialização de programas de computadores resolve se associar ao Yahoo!, um instrumento de busca e serviço de e-mail gratuito, fica claro que até Bill Gates resolveu ganhar dinheiro oferecendo algo que custa nada. O Google vale hoje US$ 20 bilhões, ervanário superior ao da soma de todas as montadoras de automóveis e companhias aéreas dos Estados Unidos.
O famoso "um é dois, três é cinco" não tem muito a ver com o "Free". A telefônica que dá o celular e vende o serviço é apenas parte de sua história. O mesmo sucede com a banda brasileira Calypso, que vende seus CDs na rede de camelôs para promover seus shows. (A turma da Calypso voa pelo país no seu próprio avião.) Os melhores momentos de "Free" estão nas exaustivas descrições do lucrativo mercado da gratuidade.
Um caso exemplar, repassado por Anderson. Três pesquisadores montaram duas mesas no saguão de um prédio público, oferecendo dois tipos de chocolates. Numa puseram as deliciosas trufas suíças Lindt a 15 centavos cada uma. Na outra, os proletários Kisses, da Hershey, a 1 centavo. Funcionou a racionalidade e 73% dos fregueses preferiram as trufas. Em seguida, baixaram o preço dos chocolates em um centavo. A conta inverteu-se irracionalmente: 69% preferiam os Kisses grátis. Nas suas palavras: "Há o mercado do zero e há o outro, o dos demais preços".
"FREE" CUSTARÁ R$ 59, SEM VERSÃO GRÁTIS
A edição eletrônica do livro
"Free" foi oferecida de graça
aos americanos durante algumas semanas. Agora o livro
de papel custa US$ 27 (R$ 52)
e uma versão digital sai por
US$ 10 (R$ 19). No Brasil, o
volume custará R$ 59,90 (US$
31), e a editora Elsevier-Campus ainda não decidiu se colocará na rede uma versão digital grátis, ou mesmo paga, a
um preço mais baixo. Dói
pensar que uma exaltação da
economia do grátis (ou dos
produtos baratos) do século
21 só seja comercializada no
Brasil como se fosse um impresso do século 15.
Depois de atravessar a Revolução Industrial investindo na mão de obra escrava e
de entrar na alvorada do
mundo dos computadores
pessoais com uma reserva de
mercado retrógrada e cartorial, o Brasil corre o risco de
perder o passo da economia
digital. As grandes operadoras de telefonia ficam com os
benefícios dos custos baixos
das comunicações de voz sobre IP. O mercado editorial
ainda não conseguiu oferecer
versões digitais de seus livros.
As assinaturas de jornais e revistas americanos e europeus
estão a preço de banana. Giram em torno dos US$ 10
("Financial Times" e "Herald
Tribune") e US$ 15 ("Wall
Street Journal" e "Le Monde").
Desse jeito, o andar de cima nacional acabará impondo uma tributação indireta a
quem só lê em português.
Mau negócio para ele.
VERDADE E MENTIRA
O tucanato fala sério quando
oferece uma trégua ao PMDB no
Senado. Trata-se de reeditar o clima de compreensão que o PSDB
manteve em 2005 com a turma do
mensalão depois que abriram as
arcas do caixa dois de sua nobiliarquia mineira.
E o PT não fala sério quando finge que desautoriza o senador Aloizio Mercadante por ter pedido a
saída de José Sarney da Presidência do Senado.
O comissariado sabe que, se
Mercadante continuasse na defesa do senador em nome da "governabilidade", teria dificuldade para
se eleger deputado federal por São
Paulo.
MADAME NATASHA
Depois de velha, Madame Natasha resolveu fazer vestibular e
inscreveu-se no Enem. Tentou
passar pelo teste simulado do Inep
e percebeu que os educatecas precisam de uma de suas bolsas de estudo.
Há um teste de "linguagens, códigos e suas tecnologias". É aquilo
que a patuleia chama de "português". Na primeira questão, Natasha soube do seguinte: "Em uma sociedade letrada como a nossa, são
construídos textos diversos para
dar conta das necessidades cotidianas de comunicação". Madame
acredita que quiseram dizer o seguinte: "Na nossa sociedade usa-se
a escrita". Por essas e outras apareceu o seguinte pedido num portal
que tratava do teste do Enem: "Se
for pocivel de me mandar o simulado para que eu possa estar estudando".
GRANDES MUDOS
O tucanato tem dois candidatos à Presidência da República
(José Serra e Aécio Neves).
Ganha uma passagem de ida e
volta a Paris quem souber de uma
palavra de qualquer um dos dois
condenando a crise do Senado e
as malfeitorias praticadas no
Congresso.
GOLPE DUCAL
Há uma explicação para a permanência do segundo suplente
Paulo Duque na cadeira de senador que foi do governador Sérgio
Cabral e que deveria ser ocupada
por Regis Fichtner. Aquilo que
Duque fizer pelo Planalto enquanto preside o chamado Conselho de Ética do Senado será devidamente creditado ao PMDB
fluminense. Sérgio Cabral receberá uma mãozona, capaz de tirar
do caminho de sua reeleição a
candidatura do petista Lindberg
Farias, prefeito de Nova Iguaçu.
Como Duque não tem voto, nada
tem a perder.
HONESTIDADE
Uma vinheta para juízes que têm
vergonha de mudar de opinião. Em
1991, o juiz David Souter, da Corte
Suprema dos EUA, deu um voto
que atribuiu às municipalidades o
poder de fechar casas noturnas onde se apresentavam dançarinas
nuas. A medida baseava-se na intenção de proteger as crianças que
vivem nas proximidades dos cabarés. Nove anos depois, num caso semelhante, ele votou na direção
contrária, argumentando que cabe
à autoridade provar que a boate pode prejudicar a garotada.
Ele reconheceu que "leitores cuidadosos" perceberiam o conflito
entre os dois votos e valeu-se do escritor inglês Samuel Johnson para
qualificar seu "erro": "Ignorância,
meus senhores, ignorância".
Souter é um solteirão religioso e
misantropo. Reconheceu que continua ignorante em matéria de dançarinas peladas, mas aprimorou a
qualidade de seu julgamento. (Em
tempo: o doutor não é gay.) Ele decidiu deixar o cargo vitalício de juiz
da Corte Suprema pouco depois da
posse do companheiro Obama. É
provável que sua decisão de ir embora tenha sido tomada em 2000,
quando o tribunal deu a eleição
presidencial a George Bush.
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