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RUMO A 2002
Governadora do Maranhão diz que não tem medo da morte e que está preparada para assumir a Presidência
Pefelista vê preconceito por ser "bonitinha"
DA ENVIADA ESPECIAL AO MARANHÃO
Segunda colocada nas pesquisas para a Presidência, Roseana
Sarney Murad, 48, se diz vítima de
preconceito por ser "bonitinha".
"Tem muito preconceito do tipo: é mulher, é bonitinha", disse
Roseana ao ser indagada se seu
crescimento nas pesquisas seria
fruto de marketing. Embora negue que esteja em campanha, ela
se diz preparada para assumir a
Presidência: "Não tenho medo de
governar o Brasil".
Roseana diz que as 12 cirurgias
que sofreu mudaram sua maneira
de encarar a política. "Hoje encaro a morte com tranquilidade. No
campo político, passei a aceitar
melhor as coisas, a ter mais tranquilidade para governar."
Ela governa há sete anos o Maranhão, um dos Estados mais pobres do país, mas diz que os indicadores sociais da região melhoraram. Seus adversários criticam
o excessivo poder que deu ao marido, Jorge Murad. Em 1999, Roseana trocou as secretarias por gerências, e Murad comanda a principal delas, a de Planejamento.
Nesta entrevista exclusiva à Folha, Roseana diz que, se chegar ao
Planalto, o marido não terá o
mesmo papel que tem no Estado.
"Não conversei sobre isso, mas
não acredito. É outra coisa. Não
dependo dele para governar."
(ELVIRA LOBATO)
Folha - Como a sra. está vendo a
possibilidade de ser a primeira mulher a chegar à Presidência?
Roseana Sarney - Ainda não me
lancei candidata. O que fiz foi lançar, nos programas eleitorais, o
discurso sobre discriminação e
preconceito, sobretudo em relação à mulher. As mensagens foram bem aceitas, daí o movimento de candidatura. Mas na realidade não tenho nenhuma decisão a
esse respeito. Minha primeira
preocupação é com meu Estado.
Folha - Em um dos filmes do PFL,
a sra. diz que a mulher não deve ser
vice do homem. Deve ser entendido que não aceitará ser vice numa
chapa liderada pelo PSDB?
Roseana - Quando começou a
surgir meu nome, disseram que
eu daria uma boa vice. Não tenho
nenhum preconceito contra vice.
Acho que a mulher pode ser vice,
mas pode ser versa também. Depende da preparação, de a pessoa
ter competência para assumir o
cargo. Se tiver, o fato de ser mulher não pode ser impedimento.
Folha - A sra. se acha preparada
para ocupar a Presidência?
Roseana - Não tenho a menor
dúvida. Trabalho desde os 20
anos. Fui assessora de meu pai na
Presidência da República, deputada federal e estou há sete anos
no governo do Maranhão. Não tenho medo de governar o Brasil.
Folha - Mas, com seu crescimento
nas pesquisas, admitiria ser vice?
Roseana - Ainda tem muita coisa
pela frente. Posso disputar o Senado. Tenho muitas chances de
me eleger senadora. A Presidência não estava nos meus planos,
não era meu desejo natural. Vou
pensar o que é melhor para o Brasil, para o Maranhão e para mim.
Folha - Seu crescimento nas pesquisas mostraria um descrédito da
população no comando masculino?
Roseana - Estou terminando o
sétimo ano de mandato como governadora. Não resolvi todos os
problemas, mas fiz uma administração transparente, diferente.
Mudei muito a face de meu Estado, que hoje tem finanças saneadas e é respeitado. Isso chamou a
atenção das pessoas. De uns três
anos para cá, tive a melhor avaliação entre os governadores.
Folha - Alguns já a comparam a
Collor. Outros acham que esse crescimento é passageiro.
Roseana - Não sou analista. A
gente só vai poder comentar dentro de uns seis meses. Meu trabalho no Maranhão tem consistência, e a aprovação de meu governo
tem consistência também. Também tem muito preconceito do tipo: é mulher, é bonitinha.
Folha - Embora a sra. diga que a
mulher não deve ser vice do marido, chama a atenção o poder de seu
marido, Jorge Murad, que comanda a gerência responsável pelo Orçamento, agricultura, indústria e
comércio e ciência e tecnologia.
Por que ele tem tanto poder?
Roseana - Ele tem um poder
igual ao dos outros gerentes. As
pessoas querem distorcer isso. É
outro tipo de preconceito contra o
qual a gente tem de ser vacinado.
Quando assumi, diziam que meu
pai ia mandar no governo. Depois
disseram que o Jorge ia mandar,
mas o maranhense sabe que o Jorge não manda. Pode perguntar a
qualquer um que não seja oposição. Depois disseram que meus
irmãos iriam mandar. Hoje, passados sete anos, qualquer um sabe
que há uma equipe sob meu comando. Não abro mão do meu
comando. Sempre ditei as regras
do jogo e cobro de todos. Trato
Jorge como os demais gerentes.
Ele está nesse lugar porque tem
competência. Se não tivesse, estaria fora: não abro mão das minhas
prerrogativas de governadora.
Folha - Se a sra. chegar à Presidência, seu marido terá papel de
destaque no governo também?
Roseana - Na Presidência? Não.
Não conversei sobre isso, mas não
acredito. É outra coisa. Não dependo dele para governar.
Folha - A sra. sofreu 12 cirurgias.
Isso influenciou sua visão política?
Roseana - Tive duas cirurgias
muito complicadas. Uma em 82,
quando parte do intestino foi retirada, e outra em 98, quando perdi
o útero. Isso me fez ver que não
sou nada, que não vou levar nada
dessa vida. Hoje encaro a morte
com tranquilidade. No campo político, passei a aceitar melhor as
coisas, a ter mais tranquilidade
para governar. Não tenho mais
aquela coisa de ficar brigando. Se
tem coisa errada, é preciso reconhecer o erro, ser mais humilde.
Mudei muito após as cirurgias.
Acho que faço uma política diferente. Talvez eu seja a antipolítica.
Folha - Falam que 210 das 217
prefeituras estão nas mãos de seus
aliados e que a sra. tem hegemonia
no Maranhão, mas cinco das seis
maiores cidades são de oposição.
Roseana - Meus aliados também
têm queixas de mim. A classe política não é totalmente fechada comigo. Fiz uma ponte com o povo.
Folha - Seus adversários na Assembléia dizem que a sra. comanda
com mão de ferro e que nunca admitiu emenda ao Orçamento.
Roseana - Ainda bem que eles
admitem que eu comando, pois
você acabou de me perguntar se é
meu marido quem manda. Não é
que eu rejeite as emendas. Faço
um governo descentralizado e itinerante. As prioridades dos municípios são definidas nas minhas
viagens pelo interior. As prioridades dos municípios têm de ser
compatíveis com a estratégia de
desenvolvimento do Estado. O
Maranhão é pobre. Não temos
tanto dinheiro para investimento.
Folha - A sra. extinguiu quase todas as estatais e substituiu as secretarias por gerências. Qual é o resultado dessa reforma?
Roseana - Eu não governo do gabinete, não tenho um governo estático. Ás vezes chegam os relatórios dos técnicos e parece que está
tudo às mil maravilhas. Se você
não sair do gabinete, não vai ver
os problemas. Fiz a reforma com
base na experiência que acumulei
rodando pelos Estado. Quando
vou a um município, leio em praça pública tudo o que foi feito lá.
Muitas vezes, surge uma voz dizendo que um projeto não foi feito. Vou atrás e mando investigar.
Folha - Há denúncias sobre uso
político e desvio de verba nos projetos do Programa de Combate à
Pobreza Rural, o Comunidade Viva,
gerido pelo Estado com recursos do
Banco Mundial. Foram aprovados
projetos que dependem de eletricidade em regiões sem energia.
Roseana - Não sou eu que aprovo os projetos, e esses problemas
são deficiências da democracia.
As pessoas têm de começar a ter
responsabilidade.
Folha - Em Caxias, projetos de
criação de vaca leiteira do Comunidade Viva foram intermediados pelo deputado Paulo Marinho (PFL),
que é seu aliado. Os agricultores dizem que foram induzidos a comprar as vacas da fazenda dele. Há
denúncias de interferência política
em vários municípios, envolvendo
deputados federais e estaduais ligados à sua base governista.
Roseana - Os projetos, antes de
serem analisados pelo governo,
são aprovados pelos conselhos
municipais, chamados Fumacs.
Espero que os conselhos sejam
bem representados. Não posso
impedir que um deputado esteja
presente na assinatura dos contratos. O deputado também tem a
função de atrair benefícios para a
sua comunidade. Mas estamos fazendo uma auditoria em todos os
projetos do Comunidade Viva.
Folha - Em 99, na CPI do Crime Organizado, o ex-deputado Francisco
Caíca disse que os projetos do Comunidade Viva eram loteados entre os deputados governistas e que
ele próprio havia recebido uma cota de dez projetos para distribuir às
comunidades de sua base eleitoral.
Roseana - Não tenho conhecimento desse assunto.
Folha - Em maio deste ano, 50 associações de pequenos produtores
rurais foram a Brasília e também
denunciaram a interferência política no Comunidade Viva ao Incra.
Roseana - O Incra é responsável
pela fiscalização dos projetos do
programa nos assentamentos.
Folha - Há denúncias de interferência política nos assentamentos.
A Procuradoria Geral do Estado
abriu 324 ações judiciais contra associações de agricultores que não
prestaram contas da aplicação do
dinheiro e há 3.000 projetos concluídos sem prestação de contas.
Roseana - As associações são
formadas por pessoas simples, e a
burocracia para a prestação de
contas é grande. A maior parte
dos problemas é por despreparo
das associações.
Folha - A sra. apóia a reserva de
vagas em universidades para negros e alunos das escolas públicas?
Roseana - Tem de haver solução
para os preconceitos. Ontem, eu
olhava uma pesquisa sobre o desemprego entre as mulheres. O
desemprego entre os homens
cresceu de 10% a 15%, e a taxa entre as mulheres aumentou 20%.
Enquanto os homens ficam dois
anos desempregados, as mulheres ficam cinco. Isso é um tipo de
preconceito. Quanto aos negros, é
preciso abrir o mercado para eles.
É muito bonitinho o brasileiro dizer que não tem preconceito, mas,
no fundo, são preconceituosos.
Folha - A sra. apóia a criação de
uma reserva de mercado de trabalho para o negro?
Roseana - Pode-se tomar medidas de apoio por certo período,
embora a situação seja um pouco
diferente no Maranhão e na Bahia, onde a grande população é
negra ou descende de negros.
Folha - Qual é sua posição sobre a
legalização do aborto?
Roseana - Prefiro não responder.
Folha - E sobre a descriminação
da maconha?
Roseana - Também não respondo.
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