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NO PLANALTO
Sob Paulo Renato, escola cria o bolsa-avacalhação
JOSIAS DE SOUZA
DIRETOR DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
De Paulo Renato para a
Folha, duas semanas
atrás: "Eu era o candidato [à
Presidência" com maior capacidade de agregar os aliados". Desagregado, o tucanato negou-lhe até bilhete para a disputa ao
Senado. Ótimo. Pode, agora,
perseguir objetivo mais modesto: desatar encrenca que, por
omissão, ajudou a criar.
Deu-se o seguinte:
1) há nove meses, aportou em
Brasília denúncia de funcionário de uma escola de Belém.
Chama-se Cefet/PA (Centro Federal de Educação Tecnológica
do Pará). Integra rede de 72 escolas técnicas e agrotécnicas espalhadas pelo país. Pende do organograma do MEC;
2) acionada, a Secretaria Federal de Controle, órgão de auditagem do governo, destacou
seis fiscais para vasculhar os arquivos do Cefet/PA. Documento
de 27 de novembro de 2001 contabiliza os primeiros achados;
3) levantaram-se: a) gastos de
R$ 3,9 milhões sem documentos
que os comprovem; b) desvios de
R$ 604 mil; c) vestígios de manipulação de concursos; d) de falsificação de documentos; e) contabilidade paralela...;
4) meticuloso, o trabalho reconstitui, por exemplo, compra
feita em 2000. Gastaram-se R$
60 mil em computadores. Os auditores foram à loja (Alves Elétrico e Eletrônicos). Deram de
cara com um açougue. A nota,
segundo o governo do Pará, é
gelada;
5) sob a alegação de que o Cefet/PA sonegava dados, os auditores pediram, no próprio relatório de 27 de novembro, o afastamento do diretor da escola.
Chama-se Sérgio Cabeça Braz.
Exemplo de longevidade: 18
anos no posto;
6) os investigadores pediram
também o afastamento de cinco
auxiliares de Sérgio Cabeça. Recomendaram, por último, que
Brasília nomeasse um interventor para o Cefet/PA;
7) o Ministério da Educação
caminhou em sentido oposto.
No apagar das luzes de 2001,
confiou a um Sérgio cuja cabeça
mal se aguentava sobre o pescoço uma missão de R$ 3,8 milhões: a implantação de escola
técnica em Palmas (TO);
8) sobravam pretextos para
que Paulo Renato sacrificasse
Sérgio Cabeça. Estruturadas como autarquias, as escolas do
MEC sujeitam-se ao controle do
TCU. E o tribunal rejeitara as
contas de Sérgio de 1991 e de
1997. Julgou-as, respectivamente, em 1997 e 2000, sempre sob
Paulo Renato;
9) rezam a lei e o bom senso
que administradores carimbados pelo TCU devem ser mantidos longe das arcas. O ministro,
porém, piscou para o azar. Havia reconduzido Sérgio Cabeça
à direção do Cefet/PA em janeiro de 1999 e em janeiro de 2001.
Sob protestos dos auditores, permitiu que sobrevivesse aos fogos
que saudaram a chegada de
2002;
10) Paulo Renato alega que só
soube das suspeitas que rondavam o Cefet/PA em janeiro.
Ruim. Sua assessoria soube antes. Só em 1º de fevereiro, sob insistência dos auditores, Sérgio
Cabeça foi exonerado. O ministro manteve a escola, porém, sob
comando da velha equipe. Nada de intervenção;
11) saído do forno há dez dias,
novo relatório dos auditores revela: montou-se no Pará uma
espécie de bolsa-avacalhação.
Pelo menos R$ 1,2 milhão escorreu de contas da escola no Banco do Brasil para contas particulares;
12) o repórter descobriu que,
entre os beneficiários, figuram
dois nomões do time de Paulo
Renato: Ruy Leite Berger Filho,
chefe da secretaria incumbida
de supervisionar as escolas técnicas, e Manoel Mendes de Oliveira, coordenador de Planejamento da mesma repartição;
13) na conta de Ruy Berger
pingou um depósito de R$ 5.000,
em 29 de dezembro de 1999. Ouvido na quarta-feira, ele disse:
"Em princípio, não era para ter
nada. Vou verificar". Na quinta, entregou a Paulo Renato carta na qual informa ter sido procurado pelo repórter e pede
afastamento por 60 dias. A que
se refere o depósito? Prefere não
dizer. Há outros repasses? Assegura que não;
14) Manoel Mendes, subordinado de Berger, foi premiado
com três repasses vindos de Belém, entre março de 1998 e junho de 1999. Somam R$ 8.000.
Procurado, não deu resposta;
15) entre os sócios do bolsa-avacalhação destacam-se funcionários que serviram ao diretor Sérgio Cabeça e continuam
na escola. Maria Auxiliadora
Gomes Araújo, chefe de gabinete da direção do Cefet/PA, beliscou R$ 225.830. Foram 31 transferências, entre 1998 e 2000.
"Não sei de nada disso", afirmou ao repórter;
16) Pedrina Wânia Mesquita
Gomes, irmã de Maria Auxiliadora, também lotada na direção da escola, petiscou nove repasses: R$ 48.168,97. "Não tenho
conhecimento";
17) o professor Francisco Solano Rodrigues Neto abiscoitou
R$ 73.575,40, em 13 cotas. "Você
me pegou de surpresa. Preciso
averiguar";
18) até Wilson Tavares Von
Paumgartten, que dirige interinamente a escola desde a exoneração de Sérgio Cabeça, figura,
modestamente, na lista: R$
1.000, em 17 de dezembro de
1999. "Não sei disso";
19) O diretor afastado Sérgio
Cabeça e cinco ex-auxiliares
contrataram o advogado Inocêncio Coelho Filho. Ele acusa
os auditores de "agirem com
parcialidade". Tenta responsabilizá-los criminalmente. Quer
melar a investigação;
20) na sexta-feira, Paulo Renato fez por pressão o que não
fizera por convicção. Afastou
Ruy Berger por dois meses, acomodou no lugar dele Pedro Paulo Poppovic, abriu sindicância e
nomeou, finalmente, o professor
Paulo de Tarso Costa Henriques
para intervir em Belém. Manoel
"R$ 8.000" Mendes foi poupado;
21) para reforçar o cheiro de
queimado, o TCU informou que
Ruy Berger foi condenado, junto
com outras três pessoas, a devolver R$ 120.500 enterrados indevidamente num programa de
"modernização" de escola técnica do Espírito Santo. É confusão
velha. Vem de 1995. Mas Paulo
Renato diz que ficou sabendo
agora. Berger recorreu;
22) o TCU analisa caso idêntico ocorrido no Piauí, também
em 1995. Pelas mesmas razões,
Berger é réu num inquérito em
Mato Grosso. Tenta-se reaver
R$ 590 mil em gastos supostamente ilegais;
23) moral da história: em certos casos, Paulo Renato há de
concordar, é melhor agir duas
vezes antes de pensar.
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