São Paulo, terça, 3 de março de 1998

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Expedição Roncador-Xingu formou 35 cidades e vilas na região central do país; Cláudio Villas Bôas morreu anteontem
Vida dedicada a tribos indígenas foi até 78

BERNARDINO FURTADO
da Reportagem Local

Jovens escriturários de empresas na cidade de São Paulo, os irmãos Orlando, 27, Claudio, 25, e Leonardo Villas Bôas, 23, decidiram, no fim de 1943, tomar o caminho da selva. Órfãos recentes - o pai e a mãe morreram em 1941- os irmãos Villas Bôas acabaram por ser reconhecidos mundialmente como pais adotivos dos cerca de 6.000 índios do Xingu, na região norte do Mato Grosso. A marcha para a selva e o contato com 19 diferentes povos indígenas arredios foram propiciados, curiosamente por uma iniciativa governamental que não tinha preocupação alguma com a vida dos índios brasileiros: a Expedição Roncador-Xingu. Novas cidades
Criada por portaria do então presidente da República Getúlio Vargas, a expedição tinha o objetivo de abrir caminho para a ocupação da região Oeste do Brasil e estabelecer uma ligação pelo interior entre São Paulo e Manaus.
Ao cabo de 24 anos, a Expedição Roncador-Xingu deixou no seu rastro de 35 cidades novas e 19 campos de pouso, dos quais 4 se tornaram bases militares. Hoje, são 54 cidades e vilas na região.
A empreitada exigiu a abertura de 1.500 quilômetros de picadas, além de 1.000 quilômetros de viagens de barco.
O saldo mais caro aos Villas Bôas é o Parque Nacional do Xingu, criado em 1961, com autorização assinada pelo então presidente Jânio Quadros, onde os índios, distribuídos em 18 aldeias, falam nove línguas diferentes. Leonardo morreu pouco depois.
"O índio foi um acidente na marcha da expedição", disse ontem Orlando Villas Bôas.
Tentativa frustrada
Na primeira tentativa de se inscreverem na Expedição Roncador-Xingu, no escritório da Fundação Brasil Central, braço institucional da expedição, os irmãos Villas Bôas foram rejeitados.
O coronel do Exército Flaviano Matos Vanique, comandante da expedição, alegou que queria apenas sertanejos rudes na empreitada, dando a entender que Orlando, Cláudio e Leonardo não resistiram às privações da marcha.
Os três irmãos Villas Bôas não desistiram. Deixaram a barba crescer e foram se alistar em dezembro de 43 na base de partida da expedição: a atual cidade de Aragarças (GO), às margens do rio Araguaia, divisa com o Estado do Mato Grosso. Acabaram sendo aceitos nas funções de trabalhadores braçais para instalar a base da expedição.
Já em 1945, Orlando Villas Bôas é nomeado comandante da coluna de vanguarda da expedição e fazem o primeiro contato com os índios xavantes. A expedição durou até 1967.
Em 1972, já morando no Parque Indígena do Xingu, os Cláudio e Orlando são encarregados pelo Exército de fazerem a expedição precursora de implantação do que viria a ser a rodovia Cuiabá-Santarém. O fruto dessa marcha foi o histórico contato com os kren-akorore (hoje panarás), os lendários índios gigantes que viviam na divisa do Mato Grosso com o Pará, às margens do Peixoto de Azevedo. Eles deixaram a selva em 1978.



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