São Paulo, domingo, 03 de junho de 2007

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Construtoras financiaram mais da metade do Congresso

"Aqui tem o partido das empreiteiras, muita gente tem o rabo preso", diz deputado

Vínculo das empresas com parlamentares é o principal entrave para a criação de CPI que poderia investigar o lobby do setor em Brasília

SILVIO NAVARRO
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

As empreiteiras investiram alto nas últimas eleições, financiaram campanhas vitoriosas de metade do Congresso Nacional e escolheram a dedo parlamentares de grandes partidos, com influência nas bancadas e assento nas comissões por onde fluem recursos para obras.
Agora, o Congresso está no meio de um embate para decidir se haverá ou não a CPI da Navalha para investigar a relação de empreiteiras com o poder público depois que a Polícia Federal investigou um esquema em fraude de licitações que seria comandado por uma empreiteira, a Gautama.
Levantamento feito pela Folha no TSE (Tribunal Superior Eleitoral) aponta que 54,7% do Congresso recebeu alguma quantia de empresas do setor.
Oficialmente, as construtoras injetaram R$ 27 milhões diretamente nas campanhas. Outro montante foi transferido para o caixa dos partidos. As empresas bancaram 285 dos 513 deputados (55,5% da Casa) e 40 dos 81 senadores (49,3%). No caso do Senado, o levantamento também contabilizou os eleitos em 2002, cujos mandatos estão em curso.
Segundo deputados que tentam recolher assinaturas para a CPI, esse vínculo é o principal entrave para investigar o lobby do setor em Brasília. "Aqui tem o partido das empreiteiras, muita gente tem o rabo preso", disse o deputado Chico Alencar (PSOL-RJ), um dos que encabeçam a mobilização pela CPI.
Da lista de parlamentares que ganharam recursos do setor, 40% têm cadeira na Comissão de Transportes da Câmara e 37% na de Infra-Estrutura do Senado. Os congressistas podem direcionar verbas federais para obras por meio de emendas ao Orçamento da União.
Ex-governador do Distrito Federal, o senador Joaquim Roriz (PMDB-DF) foi o campeão em arrecadação de recursos de construtoras: R$ 1 milhão, valor doado pela JM Terraplanagem (R$ 700 mil) e pela Torc Terraplanagem (R$ 300 mil), o que representa 62% da receita total de sua campanha.
Durante a gestão de Roriz, a JM Terraplanagem executou obras na DF-190, que liga a cidade goiana de Santo Antonio do Descoberto a Ceilândia, no valor de R$ 7,1 milhões. Roriz atua na Comissão de Infra-Estrutura do Senado. Ele afirmou, por meio de sua assessoria, que as doações se devem ao seu perfil de "tocador de obras" e, por isso, considera natural receber recursos desse setor.
O senador Eliseu Resende (DEM-MG), ex-ministro da Fazenda, captou R$ 567 mil. Ele também integra a Comissão de Infra-Estrutura.
Na Câmara, quem mais teve ajuda de empreiteiras foi a deputada Janete Pietá (PT-SP), com R$ 547 mil. Ela é mulher do prefeito de Guarulhos, Elói Pietá (PT). Uma das doadoras foi a Camargo Correa (R$ 200 mil), que, no ano passado, ganhou concorrência de R$ 31,8 milhões para executar obras de um complexo viário em Guarulhos. A OAS, que doou R$ 100 mil para a deputada, também realiza obras na mesma cidade.
"Todas as doações que recebi tiveram como base meu programa de trabalho. Ninguém jamais exigiu favores ou contrapartidas", afirmou a deputada. "Não tenho nada a ver com os negócios que essas empresas mantêm na esfera privada ou pública", disse Janete.
A lista dos maiores beneficiados por recursos de empreiteiras na eleição é seleta. Figuram o atual presidente da Câmara, Arlindo Chinaglia (PT-SP), que na época da eleição era líder do governo na Câmara, e o então presidente da Casa, Aldo Rebelo (PC do B-SP).
Chinaglia, que recebeu R$ 395 mil do setor, afirmou por meio de sua assessoria que "as doações foram dentro da lei e a prestação de contas é pública". Aldo arrecadou R$ 315 mil.
Outros "escolhidos" pelas construtoras foram o ex-ministro Antonio Palocci (PT-SP), R$ 325 mil; Jader Barbalho (PMDB-PA), R$ 322 mil; o primeiro-vice-presidente da Câmara, Nárcio Rodrigues (PSDB-MG), R$ 285 mil; e o presidente do PT, Ricardo Berzoini (PT-SP), R$ 248 mil.
Os parlamentares do PT foram os que mais receberam recursos: R$ 4,6 milhões. Na seqüência, os peemedebistas juntaram R$ R$ 4,5 milhões, enquanto os tucanos arrecadaram R$ 4,3 milhões. As principais doadoras -em repasses diretos- para congressistas eleitos foram a Camargo Corrêa (R$ 2,4 milhões), a Construtora OAS (R$ 1,7 milhão) e a Barbosa Mello (R$ 1,1 milhão).
Procuradas pela Folha, as empresas Camargo Corrêa, Odebrecht, Barbosa Mello, Construtora OAS e JM Terraplanagem não quiseram se manifestar sobre as doações.


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