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TRANSIÇÃO NO ESCURO
"Como presidente, sou tolhido, não falo o que penso. Depois, vou falar"
FHC ataca "choramingões" "pessimistas" e "sonho vazio"
CHICO SANTOS
ENVIADO ESPECIAL A ARACRUZ (ES)
O presidente Fernando Henrique Cardoso abandonou ontem o
tom dos últimos dias -marcado
pela frustração em relação às respostas do mercado financeiro às
ações do governo em busca da estabilidade econômica- para fazer um discurso de otimismo. Ele
atacou os "pessimistas", os "choramingões" e o "sonho vazio".
O pretexto para a passagem da
defesa ao ataque foi a inauguração
de uma obra de expansão (de 1,3
milhão para 2 milhões de toneladas de capacidade de produção)
da fábrica da Aracruz Celulose, no
Espírito Santo (a 73 km de Vitória). FHC usou a fábrica como
analogia para criticar, sem citar
nomes, os que, segundo ele, só sabem reclamar e não têm propostas consistentes.
"Quando o sonho é vazio, vira
pesadelo para os outros, porque é
promessa que não vai ser cumprida e que vai dar dor de cabeça,
com certeza", afirmou em um trecho do discurso de aproximadamente 15 minutos.
Na platéia, empresários e políticos, como a candidata do governo
à vice-presidência, deputada federal Rita Camata (PMDB-ES).
Após elogiar o norueguês Erling
Lorentzen, presidente do Conselho de Administração da Aracruz,
FHC usou a nacionalidade do anfitrião como pretexto para dizer
que não importa a origem do capital, "desde que ele produza
aqui, dê empregos aqui, faça o
Brasil crescer".
"É isso que estamos fazendo, é
com gente que acredita no país,
não é com choramingões, não é
com gente que só sabe criticar e
que na hora de propor, ai meu
Deus", prosseguiu.
A seguir, FHC afirmou que não
fala mais sobre porque é tolhido
por sua condição de presidente.
"Eu fico vendo e não falo nada.
Enquanto sou presidente, eu sou
muito tolhido, não posso falar o
que penso. Mas depois, eu vou dizer, porque dizem tanta coisa vazia, tanta crítica que não tem base
na realidade", disse.
Para FHC, o Brasil precisa de
gente capaz de "juntar a crença à
capacidade de realização" e que
"avance dentro de um programa". "Eu sempre ataco os pessimistas porque são gente que não
acredita", afirmou.
Agruras
O presidente não fez nenhuma
menção direta à crise do mercado
financeiro, preferindo fazer referências de passagem ao problema, no meio do discurso otimista.
"Não se enfrenta as agruras do
mundo, e são muitas as agruras,
se não tivermos capacidade. Não
adianta reclamar, não adianta
chorar. É preciso saber propor,
saber avançar", afirmou.
Em outro trecho, ele disse não
gostar da distinção entre "a pátria
financeira e a pátria da produção". Segundo ele, "não há produção sem finanças".
FHC rebateu as críticas ao ritmo
de crescimento do país. "Eu vejo
tantos derrotistas dizendo: "Ah,
vamos perder mais uma década".
Perder o quê, se estamos construindo um país que avança, que
dá educação?", disse.
"Falta muito e vai continuar faltando décadas afora. Mas não vai
faltar muito a esperança, a coragem do brasileiro e o rumo de o
país crescer sempre", continuou.
FHC disse que "às vezes não se
consegue crescer tanto quanto se
deseja, mas o importante é que o
crescimento seja sustentável". Citou a área de agronegócios como
exemplo de que o país tem se desenvolvido. Ao longo do discurso,
voltou às estocadas políticas.
"Não se faz nada sem compromisso. Não há parceria se não
houver confiança e não há confiança se ela não for comprometida com um certo objetivo."
No final, ele disse que a "maioria operosa" (expressão que criou,
em oposição à tradicional maioria
silenciosa) manterá o país crescendo. "Se tivermos um projeto,
com disciplina, com persistência,
ninguém vai segurar nosso país."
FHC ouviu durante a cerimônia
elogios do governador do Espírito
Santo, José Ignacio Ferreira
(PTN). No discurso, o presidente
agradeceu os elogios. No mês passado, FHC impediu a intervenção
federal no governo capixaba, em
episódio que resultou na renúncia
do ex-ministro da Justiça Miguel
Reale Júnior.
Retirada
O deputado José Carlos Gratz
(PFL), presidente da Assembléia
Legislativa do Espírito Santo,
abandonou a solenidade.
Gratz teria se aborrecido ao ser
informado pela organização do
evento que não participaria da
mesa de autoridades encabeçada
pelo presidente. Ele é suspeito de
ter envolvimento com o crime organizado no Espírito Santo.
Na mesa principal, além de
FHC, ficaram ministros, o governador e diretores da Aracruz.
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