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São Paulo, quarta-feira, 03 de dezembro de 2003

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ELIO GASPARI

Lula foi do linchamento às ilusões

Lula voltou a informar que é contra a redução da maioridade penal. Com isso, o presidente da República alimenta seu estilo de cidadão das ilusões.
Defende todas as causas sem custo e todos os custos sem causa.
No caso da redução da maioridade dos bandidos que ainda não completaram 18 anos, pode-se ficar contra ou favor sem que isso afete o Orçamento. A segurança pública é um dos únicos itens da agenda nacional em que se pode ser altruísta sem que a banca, o FMI e o doutor Antonio Palocci ameacem a choldra com uma retaliação do mercado. Pode-se defender um sistema penal finlandês sem que isso custe um só centavo.
O governo diz que não se pode baixar a maioridade de um garoto de 16 anos porque os menores de idade não podem ser colocados nas máquinas de formar criminosos das penitenciárias brasileiras. Falso. Ninguém quer colocar os delinquentes de 16 anos nas penitenciárias. Só os latrocidas. É forte? Então só os latrocidas reincidentes.
A violência urbana já fez três vítimas no círculo próximo do atual presidente da República. O primeiro marido de sua mulher foi assassinado. Depois assassinaram o pai do morto. Isso quando Lula era um sindicalista. Como presidente, mataram-lhe o segurança de um de seus filhos.
Afora Prudente de Moraes, cujo pai foi morto por um escravo, Lula é o presidente brasileiro que esteve mais perto de uma cena de violência homicida. É ele quem conta o caso, no excepcional livro "Lula, o Filho do Brasil", da jornalista Denise Paraná, editado pela Fundação Perseu Abramo: "Se não me engano, foi em 1962. Tinha uma fábrica na rua Vemag, uma pequena tecelagem, uma fábrica de meia. Lá eu presenciei a cena mais violenta de uma greve. O pessoal vinha numa passeata e tentou parar a fábrica, que era pequena. Deveriam trabalhar umas oito ou nove pessoas, no máximo. Ficava num sobrado. O pessoal entrou e foi subindo as escadarias. Então o dono da fábrica atirou. Atirou e o tiro pegou na bexiga de um companheiro que estava na frente. O pessoal ficou invocado e jogou pela janela o dono da fábrica; ele caiu do segundo andar. O cidadão caiu no chão e lá embaixo o pessoal chutou ele, agrediu. [...] Ele foi para o hospital, mas acho que ele morreu. A impressão que eu tenho é que ele não sobreviveu [...] Eu achava que o pessoal estava fazendo justiça".
Certamente Lula mudou de opinião a respeito da justiça dos linchamentos.
Lula, o ministro da Justiça e a torcida do Flamengo sabem que os estupradores não temem os códigos. O que eles temem é a lei da massa, aquela que vigora nos presídios infames do Estado brasileiro. Temem o pessoal que fica invocado.
Coisas de Lula: defende leis finlandesas, promete presídios americanos e não libera as verbas necessárias para trancar os bandidos brasileiros.
A discussão politicamente correta é assim: quando interessa, passa-se o adversário nas armas ou no pau. Fora da cena, muda-se de chapéu. O cidadão se transforma num iluminista ambulante. Um estranho iluminista, pois em nome da civilização interdita o debate. Fica a impressão de que todo bandido tem algo de carente e todo defensor da redução da maioridade tem algo de bandido. Nesse mundo politicamente correto, defender a convocação de um plebiscito para decidir com quantos anos um assassino deve pagar integralmente pelo seu crime parece coisa de selvagem.
Plebiscito? Reponde o general João Baptista Figueiredo, que governou o Brasil de 1979 a 1985. Depois de ter sido sovado na eleição de 1974, concluiu: "Povo de merda, que não sabe votar".


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