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Marina se espelha em Davi e Dom Quixote
Pré-candidata do PV se apresenta como "sonhadora", vê Dilma no papel de Golias e diz estar numa luta contra gigantes
Senadora invoca metáfora bíblica como incentivo na corrida presidencial; para analista, discurso deve render poucos votos a ela
BERNARDO MELLO FRANCO
DA REPORTAGEM LOCAL
Resignada com a falta de aliados e o pouco tempo que terá
na TV, a senadora Marina Silva
(PV-AC) busca forças no confronto entre Davi e Golias e na
história de Dom Quixote para
encarar a corrida presidencial.
Com 8% das intenções de voto
na última pesquisa Datafolha,
ela admite ter "pouquíssima
probabilidade" de chegar ao segundo turno. Mesmo assim,
tem invocado a passagem bíblica ao prever o futuro de sua
pré-candidatura ao Planalto.
"A luta de Davi contra Golias
é uma metáfora. Mas é uma
metáfora boa, porque Davi vence no final", gracejou, no início
de sua caravana pelo agreste na
semana passada.
Em conversas informais, a
senadora deixa claro que vê a
petista Dilma Rousseff -e não
o tucano José Serra, que lidera
a disputa- como o gigante a ser
batido nas urnas.
"Já ouvi muito esse discurso:
"Seja pragmática. A senhora
não tem PAC, não tem Bolsa
Família, não tem pré-sal, não
tem Minha Casa, Minha Vida".
Mas não sou pragmática, sou
sonhadora", disse, em reunião
com empresários pernambucanos testemunhada pela Folha.
Em tom de desabafo, Marina
reconhece ter ouvido apelos
para não trocar uma reeleição
certa no Senado -onde já ocupa uma cadeira há 16 anos- pela missão quase impossível de
chegar à Presidência na garupa
de um partido nanico. Ao justificar a escolha, compara-se a
Dom Quixote, o cavaleiro trapalhão de Cervantes.
"A única diferença é que ele
duelava com moinhos de vento
como se fossem gigantes, e eu
duelo com gigantes como se
fossem moinhos de vento. Somos igualmente quixotescos",
diz a senadora. "Muita gente
não entende por que não quis
ficar no Senado. Acontece que
a política, para mim, não é essa
questão de vida ou morte."
Diante de interlocutores
mais desconfiados, Marina tem
relembrado sua biografia para
sustentar que vislumbra alguma chance de vitória em outubro. "Tenho que acreditar nisso, porque já venci eleições em
condições muito mais adversas. Impossível, não é", repete,
citando suas primeiras campanhas políticas no Acre, pelo PT.
A galeria de exemplos da
candidata verde não se limita à
Bíblia e à literatura. "Se Mandela fosse pragmático, teria renunciado ao sonho na cadeia.
Se Luther King fosse pragmático, não teríamos um negro como presidente dos Estados
Unidos", diz, numa referência
ao democrata Barack Obama.
Embora possa parecer ingênuo à primeira vista, o discurso
deve ajudar a senadora a ganhar fôlego na disputa, avalia o
cientista político Marcus Figueiredo, do Iuperj (Instituto
Universitário de Pesquisas do
Rio de Janeiro)."A metáfora do
pequeno que enfrenta os poderosos é bem compreendida pela população. Jânio Quadros já
usou essa ideia com sucesso",
diz o professor, especialista em
pesquisas eleitorais.
Na década de 1950, Jânio se
elegeu prefeito e governador de
São Paulo com o slogan "O tostão contra o milhão". O mote
embalou vitórias sobre o grupo
de Adhemar de Barros, que
concorria com mais dinheiro e
apoio partidário.
Para Figueiredo, Marina tenta marcar posição como alternativa ao establishment, representado na disputa por Serra e
Dilma. "É uma estratégia inteligente, mas não vejo muita
chance de que ela ganhe votos
com isso. Em geral, os eleitores
acabam preferindo os poderosos, por achar que eles têm
mais chances de fazer alguma
coisa por eles", avalia.
No papel de Davi, a senadora
se esforça para atirar as primeiras pedras na direção da gigante petista. Nos últimos dias, ela
deu uma pausa no discurso ambientalista para criticar o PAC
(Programa de Aceleração do
Crescimento), apontado como
o maior trunfo eleitoral de Dilma. Resta saber se Serra também entrará em sua mira.
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