São Paulo, sábado, 4 de abril de 1998

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QUESTÃO AGRÁRIA
Os policiais que participaram da retirada de sem-terra podem ter ganho R$ 200 cada de fazendeiros
PMs podem ter sido pagos por ação no PA


ARI CIPOLA
da Agência Folha, em Parauapebas


A Polícia Civil do Pará tem indícios de que os 11 policiais militares que participaram da desocupação ilegal dos sem-terra da fazenda Goiás 2, em Parauapebas, receberam R$ 200 dos fazendeiros.
O pagamento teria sido intermediado por um dos dois oficiais de Justiça que notificaram os sem-terra, há dez dias, da decisão judicial de reintegração de posse.
Após a desocupação, dois líderes do MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra) do sul do Pará, Onalício Araújo Barros, o "Fusquinha", e Valentin Serra, o "Doutor", foram assassinados.
A Justiça decretou a prisão provisória de 11 fazendeiros acusados pelas mortes, mas nenhum deles havia sido preso até a noite de ontem. Os fazendeiros culpam os sem-terra pelos assassinatos. Para eles, os líderes foram mortos após discutir com os sem-terra.
Em depoimento à Polícia Civil, os 11 policiais negaram ter recebido o dinheiro, mas afirmaram que foram recrutados pelo oficial de Justiça José Eduardo Ferreira do Vale e pelo proprietário da fazenda Goiás 2, Carlos Antônio da Costa, o Carlinhos.
Vale negou em depoimento ter recrutado os policiais. "Ele (Vale) nos falou que precisava da ajuda para conter a fúria dos fazendeiros e fomos mesmo assim, sem ordem do comando, disse em depoimento o sargento Luiz Augusto Costa.
"Temos depoimentos que indicam o pagamento pelo trabalho dos PMs e sabemos da existência da "caixinha' para os PMs", afirmou o delegado responsável pelas investigações, Lauriston Góes.
Apesar de terem participado da ação de desocupação, o delegado afirma que já conseguiu confirmar que os PMs não estavam no local do assassinato dos líderes. O promotor do caso, José Godofredo dos Santos, disse que os depoimentos dos PMs, presos por indisciplina, "mostram o nível terrível de ilegalidade da desocupação".
O diretor do Sindicato dos Produtores Rurais de Marabá, Sérgio Ribeiro Correa, negou ontem que os fazendeiros tenham oferecido qualquer dinheiro para os policiais militares.
O presidente do Sindicato dos Produtores Rurais de Parauapebas, Geraldo Milton Soares, também diz não ter conhecimento de "caixinha" e condenou a ação dos fazendeiros.
A ronda feita ontem por tropas do Exército nas proximidades da fazenda Goiás 2, que foi reinvadida no domingo pelo MST, impediu que um grupo de 150 sem-terra se juntasse às 35 famílias que estão ocupando a fazenda.
Técnicos da Polícia Científica do Instituto Médico Legal, em Belém, esperavam ontem que a polícia de Parauapebas conseguisse apreender as armas que mataram os sem-terra.
Sem elas, não há como comparar com o único projétil calibre 38 que foi encontrado no corpo de um dos sem-terra assassinado no conflito. O laudo, antecipado ontem pela Agência Folha, diz que "Fusquinha" morreu com cinco tiros -um deles quando já estava morto. "Doutor" morreu com um tiro no coração.
Segundo o diretor-geral da Polícia Científica do Instituto Médico Legal, Luiz Malcher, o laudo será apresentado segunda-feira.
A necropsia dos dois sem-terra ocorreu 18 horas após as mortes. Evidências como cápsulas ou projéteis podem ter sido retiradas do local dos crimes, disse Malcher.


Colaboraram Luís Indriunas e Fabiana Pereira, da Agência Folha



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