São Paulo, domingo, 04 de junho de 2000


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QUESTÃO AGRÁRIA
Dinheiro é arrecadado por meio de contribuições e bazares e financia projetos do movimento
ONGs européias mandam ao MST US$ 1 mi por ano

DE LONDRES

O comércio que mais cresce em Londres são pequenas lojas, quase sem decoração, com roupas usadas penduradas em cabides e cartazes colados na vitrine anunciando as ofertas. Para os ativistas brasileiros do MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra), essa é uma ótima notícia. Foi com o dinheiro arrecadado nesses bazares que se pagou os honorários dos advogados que tiraram da prisão cem integrantes do movimento, em Pernambuco.
Em toda a Europa, religiosos, consumidores e, mesmo sem saber, todos aqueles que pagam impostos estão ajudando a bancar os sem-terra brasileiros. O MST é um dos movimentos mais populares entre as organizações não-governamentais (ONGs) européias que realizam projetos sociais em países pobres.
Mais de dez ONGs européias financiam o MST. Um levantamento parcial indica que o valor dos contratos chega a quase US$ 1 milhão por ano. Em geral, o dinheiro vem de recolhimento de contribuições em igrejas, venda de roupas usadas ou campanhas de solidariedade social. Mas boa parte dos recursos sai diretamente dos cofres de governos europeus.
Em três anos, a União Européia está investindo US$ 900 mil na criação da escola de técnicos agrícolas Florestan Fernandes, em São Paulo. Outros US$ 900 mil serão divididos entre a Caritas alemã, a Terre des Hommes francesa e o próprio MST.
"Financiamos projetos de 200 ONGs no Brasil, entre elas o MST. Mas só participamos de projetos que claramente não tenham conotação política", diz Maria Helena Neves, responsável por projetos da União Européia no Brasil.

Grife
Para muitas ONGs européias e norte-americanas, o MST é uma grife das lutas sociais, assim como os zapatistas mexicanos. O Movimento dos Sem Terra está na capa da última revista Nacla (North-American Congress on Latin American) dedicada a movimentos sociais. Financiar projetos de assentamento agrícola, escolas ou advogados para os sem-terra é uma causa amplamente reconhecida pelo público europeu.
"O MST não é nossa prioridade, mas contribuímos com a organização em casos nítidos de defesa de direitos humanos e porque ajudar o movimento é um sinal de nossa preocupação com a injustiça social", disse à Folha Marlu Dresens, da organização católica holandesa Cordaid, que deu US$ 210 mil, por três anos, para publicação de material sobre o Massacre de Eldorado de Carajás e sobre o julgamento de José Rainha.

Financiamento
As ONGs européias financiam várias atividades dos sem-terra brasileiros, da impressão de cartilhas à compra de maquinários para os agricultores. Dos bazares mantidos pela Foxham, ONG britânica sem bandeira política nem religiosa, saem US$ 50 mil por ano para pagar os advogados do MST em Pernambuco e para formar cooperativas de trabalhadores no Maranhão.
"Financiamos o MST porque o padrão de vida de quem faz parte de um assentamento é cinco vezes melhor do que o de quem trabalha a terra por conta própria", diz Jessica Pelham, da Foxham.
A Trocaire, organização católica irlandesa, dá cerca de US$ 30 mil por ano para o MST fazer campanha pela reforma agrária e treinar agricultores.
Já a britânica Action Aid financia diretamente 13 assentamentos de terra em Pindaré, Mearim e Itapecuru, no interior do Maranhão.

Polêmicas
Se os assentamentos atraem os recursos de algumas ONGs européias, também criam dificuldades para obter ajuda de outras instituições. Como muitas ONGs recebem dinheiro de governos, não podem se envolver em problemas políticos de outros países nem defender causas polêmicas.
"Não financiamos ocupações porque isso é ilegal e é problemático para nós. Queremos financiar projetos do MST que defendam a igualdade das mulheres ou que estejam ligados à educação, à ecologia e à saúde", diz Claudio Moser, da alemã Misereor.


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