São Paulo, segunda-feira, 04 de setembro de 2000


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SÃO PAULO

Candidato tucano, quando prefeito de Pindamonhangaba, deu em 80 concessão sem concorrência a empresa de ônibus, que domina transporte na cidade até hoje driblando lei

Alckmin assinou contrato sem licitação

ROBERTO COSSO
ENVIADO ESPECIAL A PINDAMONHANGABA

O candidato do PSDB à Prefeitura de São Paulo, Geraldo Alckmin, assinou, em 18 de janeiro de 1980, um contrato de concessão para exploração do transporte coletivo por dez anos, em Pindamonhangaba (a 140 km de São Paulo), sem fazer licitação.
Advogados ouvidos pela Folha questionam o contrato assinado por Alckmin. Ele foi prefeito de Pindamonhangaba de 1977 a 1982. É vice-governador do Estado de São Paulo e está licenciado.
Caso seja eleito prefeito de São Paulo, Alckmin, que tem 16% da intenção de voto dos paulistanos, irá conduzir uma megaconcorrência de R$ 15 bilhões, que definirá o futuro do transporte coletivo na cidade até 2010.
A administração de Alckmin também foi marcada pela contratação de parentes. Ele deu cargos de confiança para o pai e três cunhados (leia texto abaixo).
Apesar disso, o tucano é querido pela população, que o considera um "predestinado".
Todos os prefeitos que o sucederam foram eleitos com o apoio dele. Alckmin gravou mensagem de apoio ao atual prefeito, Vito Ardito Lerario, candidato à reeleição. Lerario teve contas rejeitadas pelo Tribunal de Contas do Estado e recorreu à Justiça.

História
O transporte coletivo por ônibus em Pindamonhangaba foi regulamentado pela primeira vez em 2 de setembro de 1969, quando o então prefeito Caio Gomes Figueiredo sancionou a lei municipal 1.123, que autoriza o Executivo "a celebrar contrato de concessão de serviços" de transportes coletivos de passageiros "com prazo de vigência de dez anos".
Em 16 de dezembro daquele ano, o prefeito assinou um contrato de concessão para exploração do serviço de transporte coletivo com o empresário Francisco Teberga Alves, morador do distrito de Moreira César, que pertence a Pindamonhangaba.
A cláusula sétima do contrato prevê que o prazo da concessão seria de dez anos, "podendo ser renovado por igual prazo". A decisão sobre a renovação seria da prefeitura, desde que o concessionário apresentasse requerimento com seis meses de antecedência.
Em 18 de janeiro de 1970, a empresa Teberga Transporte Coletivo começou a operar com três ônibus verdes na cidade, que à época tinha menos de 50 mil habitantes. A maioria das ruas de Pindamonhangaba não era asfaltada.
Em 27 de dezembro de 1978, Francisco Teberga Alves assinou um termo de transferência da concessão e vendeu seus 19 ônibus para a Empresa de Ônibus Pássaro Marron S/A. O prefeito de Pindamonhangaba já era Geraldo Alckmin.
O empresário diz que vendeu sua empresa por não aguentar mais a "encheção de saco" dos vereadores da cidade. Teberga Alves diz que antes de ele concordar com a venda, a empresa já tinha em mãos um documento assinado pela prefeitura concordando com a transferência.

Sem licitação
A concessão terminaria em 18 de janeiro de 1980, mas, exatamente nessa data, o então prefeito Geraldo Alckmin assinou um instrumento particular de contrato de prorrogação da concessão para exploração do transporte coletivo na cidade, por mais dez anos, com Pelerson Soares Penido, dono da Pássaro Marron.
O contrato de prorrogação faz menção à cláusula sétima do contrato original, diz que sua renovação era "de interesse da Prefeitura de Pindamonhangaba" e afirma que a empresa teria requerido a renovação do contrato com a antecedência necessária.
Os advogados Celso Antônio Bandeira de Mello e Carlos Ari Sundfeld, ambos professores de direito administrativo da Faculdade de Direito da PUC-SP, afirmam que a cláusula do contrato original é nula e que o contrato de prorrogação é ilegal. Eles comentaram o caso sem saber quem havia assinado o ato.
Os dois dizem que a hipótese de prorrogação do contrato deveria estar expressa na lei para ser aplicada. A legislação apenas limita em dez anos o prazo do contrato.
Bandeira de Mello afirma que o princípio da estrita legalidade, que norteia a atuação da administração pública, impede os administradores de realizarem atos que não estejam expressamente previstos em lei.
Sundfeld diz que a limitação feita pela lei refere-se à duração máxima do contrato. Assim, ele poderia ter sido feito por cinco anos e depois renovado por mais cinco. Mas, como o contrato original já era de dez anos, ele jamais poderia ter sido renovado.

Sucessores
Desde que terminou, em 1990, o contrato de prorrogação assinado por Alckmin, duas novas licitações foram feitas. Mas a empresa Pássaro Marron jamais deixou de trabalhar na cidade.
Todos os prefeitos que sucederam Alckmin foram apoiados por ele e eleitos pelo partido dele.
Naquele ano, o então prefeito Vito Ardito Lerario, que hoje ocupa o cargo pelo segundo mandato, realizou uma concorrência pública. Pouco antes havia sido aprovada a Lei Orgânica, que garante a "operação do serviço por, no mínimo, duas empresas, se adotado o regime de concessão, proibido o monopólio de fato".
Os donos da Pássaro Marron abriram, então, uma outra empresa, a Expresso da Mantiqueira Ltda., e continuaram com o monopólio do transporte na cidade. As duas venceram a licitação de 1990, foram contratadas por emergência entre 1995 e 1997 e venceram a licitação de 1997.
Lerario afirma que a Lei Orgânica não é desrespeitada porque as empresas têm diretores diferentes. Os sócios da Pássaro Marron são Pelerson Soares Penido, Thadeu Luciano Marcondes Penido e Ana M. M. Penido Sant" Anna. Os da Mantiqueira são os mesmos, além de Rosa Evangelina Marcondes Penido.

Garagem
As duas empresas guardam seus ônibus na mesma garagem, na avenida Nossa Senhora do Bonsucesso, 1751. Elas são remuneradas pelo que arrecadam com tarifas, que custam R$ 1,20 -valor superior ao cobrado na capital (R$ 1,15), que tem linhas maiores.
A Prefeitura de Pindamonhangaba não dá nenhum tipo de subsídio. O dinheiro que as empresas deixam de arrecadar com a venda de passes de estudantes e de bilhetes de idosos é recuperado no próprio valor da passagem.
O prefeito Lerario afirma que o preço da passagem dos ônibus é "compatível" com os valores cobrados no Vale do Paraíba. A Pássaro Marron opera em várias cidades do vale. A empresa não mantém escritório em Pindamonhangaba, só uma garagem. A Folha não conseguiu localizar os responsáveis pela Pássaro Marron em Guaratinguetá.





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