São Paulo, quarta-feira, 04 de setembro de 2002

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COMUNICAÇÕES

Pedido do colega foi direto para o gabinete do então ministro

Pimenta privilegiou Melles na concessão de TV em MG

ELVIRA LOBATO
DA SUCURSAL DO RIO

Os registros do Sicap (Sistema de Acompanhamento e Controle de Processos) do Ministério das Comunicações indicam que o ex-ministro e deputado federal Pimenta da Veiga (PSDB-MG), coordenador da campanha de José Serra, privilegiou seu então colega de governo, o ex-ministro dos Esportes, deputado federal Carlos Melles (PFL-MG), na concessão de uma TV educativa para a cidade de São Sebastião do Paraíso, no sul de Minas.
Melles disputava a concessão com o ex-vereador e empresário de radiodifusão local Antonino José Amorim, que transmite programação de TV educativa na cidade desde 89, amparado em licença do ministério.
O empresário pediu a transformação da licença em concessão (que é válida por 15 anos e permite a geração de programação local até 24 horas por dia) em 99. O processo foi cadastrado pela Delegacia da pasta das Comunicações em Belo Horizonte no dia 24 de maio de 2000, em nome da Fundação Educacional, Cultural Comunitária do Sudoeste de Minas.
Quarenta dias depois, o pedido de Melles foi protocolado no ministério, em Brasília, em nome da Fundação Educacional e Cultural do Sudoeste Mineiro e seguiu direto para o gabinete de Pimenta. Em abril do ano passado, o presidente Fernando Henrique Cardoso assinou decreto dando a concessão à fundação de Melles.
O processo do empresário ficou 23 meses no ministério sem chegar ao gabinete do então ministro. Em abril deste ano, como a concessão já havia sido dada à outra fundação, foi mandado para o arquivo morto do ministério em Minas, onde ocupa a caixa 137.
Pimenta e Melles não quiseram comentar a diferença de tratamento nos dois processos. A Folha procurou o ex-ministro das Comunicações no escritório de José Serra, em Brasília, na sexta-feira e anteontem. Em ambas as ocasiões, a reportagem forneceu os números dos processos para que pudesse conferir os registros do Ministério das Comunicações.
Também foi tentado contato com Pimenta por intermédio de seu ex-assessor político no ministério e atual coordenador do comitê de Serra em Belo Horizonte, Sílvio Mitre (ver texto nesta página). Ele não respondeu a nenhuma das tentativas.
Semelhante esforço foi feito com o ex-ministro Melles. Na sexta e ontem, foram dados três telefonemas para o escritório do deputado em São Sebastião do Paraíso, informando o conteúdo da reportagem. A reportagem não conseguiu falar com ele.
A Folha obteve os registros da evolução dos processos a partir da numeração do protocolo. A consulta pode ser feita pela internet no site do Ministério das Comunicações. A fundação do empresário Antonino Amorim recebeu o número 537100014401999. O processo da fundação ligada a Carlos Melles teve o número 530000046082000.

Caminho direto
Os dados do Sicap mostram que outras fundações ligadas a políticos, que já tiveram as concessões autorizadas por decreto do presidente da República, receberam tratamento "VIP" no ministério, pois seus processos seguiam direto do protocolo para o gabinete de Pimenta da Veiga.
Os registros contradizem a declaração de Pimenta publicada pela Folha no último dia 25, quando afirmou desconhecer que havia políticos por trás de fundações que receberam concessões de rádio e TVs educativas.
A Folha revelou que pelo menos 13 deputados federais, além de deputados estaduais, prefeitos, ex-deputados e candidatos a cargos eletivos receberam concessões de educativas do governo atual.
Em sete anos e meio do governo FHC, foram autorizadas 118 concessões de TVs educativas e 239 de rádios educativas. A distribuição foi concentrada nos três anos em que Pimenta esteve à frente do Ministério das Comunicações (de janeiro de 99 a abril de 2002).
A Fundação Quilombo, ligada ao deputado federal João Caldas (PL-AL), e a Fundação Ernesto Benedito de Camargo, ligada ao ex-deputado federal José Camargo, protocolaram pedidos de TV educativa no ministério em 26 de dezembro de 2001. Os dois processos seguiram no mesmo dia para o gabinete de Pimenta.
A Fundação Quilombo foi contemplada com uma concessão de TV em Maceió e a Fundação Camargo recebeu uma TV educativa de Guarulhos, na Grande São Paulo. Este último processo gerou um conflito para o governo, porque o canal educativo de Guarulhos -58 UHF- já está ocupado há vários anos pelo grupo Sanzone para retransmissão de programação educativa.
A Fundação Anhanguera, ligada ao deputado federal André Benassi (PSDB-SP), que ganhou concessão para TV educativa em Várzea Paulista, na Grande São Paulo, também seguiu do protocolo para o gabinete do então ministro. Na mesma situação está a Fundação Minas Gerais, ligada ao deputado federal Hélio Costa (PMDB-MG), que recebeu concessão para uma TV em Barroso (MG). O pedido foi protocolado no dia 14 de março deste ano e seguiu no mesmo dia para o gabinete do tucano.
Procurado pela Folha, o Ministério das Comunicações não informou os motivos que levaram alguns processos a seguirem direto para o gabinete do ex-ministro Pimenta da Veiga.



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