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GOVERNO
Planalto crê em 2º turno, mas está pronto para antecipar transição, diz ministro
Parente sugere mandato mais longo sem reeleição
ELIANE CANTANHÊDE
DIRETORA DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
Sugestão "pessoal" do ministro
Pedro Parente, chefe da Casa Civil
e coordenador da transição, para
o sucessor de Fernando Henrique
Cardoso, seja quem for: instituir
um mandato único maior do que
os atuais quatro anos, sem a possibilidade de reeleição.
Em entrevista à Folha, ontem,
em seu gabinete no Planalto, Parente não descartou a candidatura de FHC a um terceiro mandato:
"O futuro a Deus pertence", disse,
emblematicamente.
Depois de três dias se informando sobre a transição em Washington, Parente, 49, quase 18 deles no
governo federal, disse que o Planalto e ele próprio acreditam na
realização do segundo turno, mas
estão preparados para "qualquer
das alternativas", inclusive a vitória do petista Luiz Inácio Lula da
Silva no domingo e o início da
transição já na segunda-feira. Seguem os principais trechos da entrevista.
Folha - O sr. já recebeu todo o
material dos ministérios para a
"Agenda 100", da transição?
Pedro Parente - Já recebemos o
material bruto dos ministérios.
Ela [a agenda] tem a ver com os
compromissos já existentes de
agenda interna e o cronograma
dos nossos compromissos internacionais.
Folha - A revisão de novembro do
novo acordo com o FMI, por exemplo?
Parente - Essa não estará na
"Agenda 100", que só vale a partir
da posse, em janeiro. Mas o presidente eleito e a equipe que ele indicar serão convidados a participar das discussões para a revisão
do acordo com o FMI em novembro.
Folha - E as questões que vão
realmente definir o primeiro ano
do novo governo, como a revisão
do FMI, o salário mínimo, as alíquotas da CPMF para 2004?
Parente - Qualquer assunto cuja
repercussão extrapole o atual governo, o presidente está aberto a
discutir. Mas é preciso ficar claro
que não há responsabilidade
compartilhada. A responsabilidade e a decisão são de quem está
ocupando o governo. O que a
gente pretende é, sempre que possível, aproximar as posições.
Folha - O que seria "aproximar
posições" na revisão do FMI?
Parente - Depende muito de como vão ser os primeiros passos do
presidente eleito. Se ele der um sinal claro de acalmar os investidores, os mercados, de esclarecer
dúvidas, não tenho dúvida de que
a discussão em novembro pode
ser meramente de rotina, porque
estamos cumprindo resultados.
Folha - O próprio PT já admite a
necessidade de um "ajuste fiscal
brabo". Isso vai estar na pauta da
revisão do FMI?
Parente - O Orçamento que está
no Congresso foi feito para gerar
o superávit de 3,75% [do PIB,
Produto Interno Bruto". A questão a ser colocada, e é um tema
muito mais do novo time do que
nosso, é se eles quiserem fazer
além do que está no Orçamento.
Para manter o mesmo resultado,
haverá necessidade de receitas
adicionais, certo? Aí se coloca a
discussão do salário mínimo, por
exemplo. O Orçamento prevê recursos para o mínimo que garantem o superávit de 3,75%. Se o novo presidente quiser fazer algo
maior, vai precisar discutir fontes.
Ou cortar em outros lugares, daí o
"ajuste brabo", ou aumentar receita.
Folha - É só impressão ou sua fala
contém uma pitada de prazer diante da perspectiva de ver a oposição
de hoje vivendo as dificuldades entre intenções, receitas e despesas?
Parente - O meu candidato é o
[José] Serra e acho que a história
ainda não acabou. Mas, admitindo que seja o PT, vai ser benéfico
eles terem de lidar com as restrições verdadeiras para tomar decisões. Na oposição, é fácil. Na oposição, ninguém se preocupa com
as exceções, só com a promessa,
com o lado positivo, com prometer o céu, a felicidade do decreto.
Agora, vem sentar aqui para ver
se é fácil. Não é prazer mórbido,
mas é preciso haver decisões responsáveis, com visão das restrições fiscais, financeiras, políticas.
Tudo isso faz com que o país tenha de amadurecer.
Folha - Discute-se muito o papel
do presidente da República num
quadro assim nervoso, de tantas
pressões, de um lado, e restrições,
de outro. Qual é esse papel?
Parente - Quanto maior a experiência, melhor. E é por isso que,
olhando o quadro de candidatos,
é óbvio que o Serra tem mais experiência, mais conhecimento da
máquina. Mas quem vai decidir é
o povo brasileiro.
Folha - E no caso do Banco Central?
Parente - Se o Armínio [Fraga"
fosse entendido como o homem
do novo presidente, qualquer que
seja ele, isso seria extremamente
positivo, mas já está claro que, se
for o PT, eles vão preferir botar
outra pessoa. Então, o importante
é que escolham bem essa pessoa.
Folha - O que é escolher bem?
Parente - É escolher alguém que
conheça bem teoria econômica e
os mecanismos de mercado e que
possa, portanto, trabalhar tanto
no nível estratégico e de formulação quanto entender os mecanismos de operação. E que tenha visão do país como um todo, o que
inclui as questões sociais. Ver isso
pelo ângulo do Banco Central,
que é mantendo a inflação sob
controle.
Folha - O que o governo sugere ao
sucessor quanto à redução da alíquota da CPMF para 0,08% em
2004? E a compensação de receita?
Parente - Não havendo um mecanismo de substituição da
CPMF, seja pela reforma tributária, seja por um mecanismo desenhado especificamente para isso,
não se pode abrir mão da CPMF.
Estou falando sobre a importância de manter a alíquota atual
[.....].
Folha - Como o sr. imagina um governo PT mantendo a CPMF, dando
um salário mínimo condizente com
seu discurso histórico, fazendo
uma reforma tributária consensual?
Parente - O cenário que eu vejo
é: qualquer presidente eleito, seja
o Lula, seja o Serra, vai se deparar
com um quadro de restrições que
não é desconhecido, porque o
tempo todo nós fizemos referência a ele. Mas ver de fora é diferente de ter que trabalhar esse quadro
de dentro. Haverá dificuldades
muito grandes se quiserem fazer
todas as mudanças de uma vez,
atender todas as demandas de
uma só vez. Governar não é só ato
de vontade. Se você não tiver base
sólida na economia, você não vai
ter condições de alcançar seus objetivos na área social.
- A dependência externa é outra das heranças malditas dos
dois mandatos FHC?
Parente - Nós enfrentamos dez
crises externas e recebemos nesses oito anos US$ 150 bilhões de
investimentos estrangeiros.
Achar que este país vai crescer
sem contar com poupança externa é restringir nossa capacidade
de gerar emprego e renda. Não há
como abrir mão disso.
Folha - Se tudo foi assim tão bom
quanto o sr. diz, porque os candidatos de oposição estão tão bem e
o candidato do governo parece empacado nas pesquisas?
Parente - O que posso dizer, e
disse inclusive na minha visita a
Washington, é que o país melhorou muito em todas as áreas nesses oito anos, na indústria, na
agricultura, na tecnologia, na saúde, na educação.
Folha - E a miséria e a violência?
Parente - Houve uma redução
importante de miseráveis e pobres com o Plano Real, depois a
velocidade de redução caiu bastante, mas não houve uma volta
aos patamares anteriores. E o aumento de renda por programas
de transferência direta, como Bolsa-Escola, não são computados
como aumento de renda. Quanto
à violência, é um problema de fato. A gente só tem a lamentar.
Folha - Um dos motivos
não é justamente a economia, o
desemprego?
Parente - Se você olhar em volta, nos países vizinhos, por exemplo, o quadro de desemprego não
é tão grave assim. Não é bom, mas
não explica o problema da violência.
Folha - O sr. aconselharia o futuro
presidente a manter o instituto da
reeleição?
Parente - Pessoalmente, eu prefiro um mandato mais longo, sem
reeleição. Mas isso é opinião pessoal.
Folha - O sr. diz isso porque o FHC
seria candidato a um terceiro mandato depois do futuro governo?
Parente - Ele nunca me disse isso, mas...
Folha - Mas...
Parente - Mas o futuro a Deus
pertence.
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