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OPERAÇÃO SOCIAL
Equipe petista vê falhas no cadastramento de pessoas pobres que custou R$ 100 milhões ao governo FHC
Lula pode descartar Cadastro Único social
MARTA SALOMON
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
Um dos principais legados da
era Fernando Henrique Cardoso
na área social corre o risco de ir
para o lixo. Depois de ter custado
aos cofres públicos R$ 100 milhões, o Cadastro Único para programas sociais do governo federal
vai passar pelo menos por uma
reforma na administração Luiz
Inácio Lula da Silva, que cogitou
até de descartar o trabalho já feito.
O sinal mais forte dado até aqui
contrário ao cadastro foi o critério
de escolha das primeiras famílias
beneficiadas pelo Fome Zero,
principal programa social de Lula: a prioridade foi dada a famílias
que não constam do cadastro. Em
quase 10% delas, os chefes nem
sequer têm documentos. Das
1.000 famílias do projeto-piloto
em Guaribas e Acauã (PI), 477
(48%) estão no Cadastro Único.
Ainda não se sabe ao certo o que
vai sobrar do que deveria ser o
banco de dados unificado com o
perfil dos pobres brasileiros
-aqueles cujas famílias têm renda de até meio salário mínimo por
pessoa-, base para o acompanhamento da eficiência dos programas sociais. O trabalho foi deixado incompleto por FHC. Chegou a ser atualizado no primeiro
mês de governo Lula, até alcançar
66% dos 9,3 milhões de famílias
(estimativa de pobres, com base
no Censo de 2000) em 96% dos
municípios do país.
A ministra Benedita da Silva
(Assistência e Promoção Social),
que herdou o cadastro da Secretaria de Assistência Social, informa
que ele está sob avaliação. O novo
diretor do departamento de informação e avaliação do ministério,
Cláudio Roquette, disse que a intenção é aproveitar pelo menos
em parte o trabalho já feito, mas
não descarta uma nova ida a campo depois de uma ampla discussão. Previsão para a terminar o
trabalho não há.
Desmonte
Contra o resultado do Cadastro
Único, erguem-se alguns argumentos. O principal seriam indícios colhidos pela equipe do Fome Zero em Guaribas e Acauã. Lá
teriam sido encontradas pessoas
pobres fora do cadastro e pessoas
cadastradas indevidamente.
Soma-se a isso a suspeita levantada em município de Pernambuco, cujo nome não é revelado, em
que 95% da população teria o
mesmo endereço, o da prefeitura.
As falhas no cadastro são confirmadas por auditoria do TCU (Tribunal de Contas da União), que
apurou a qualidade e a confiabilidade dos dados. Em relatório de
270 páginas, pronto para ser votado pelo tribunal, técnicos constataram que o cadastro inclui gente
que não deveria estar lá e há omissões. A renda declarada pelos entrevistados nem sempre confere
com a realidade. Mas, segundo
auditoria, a influência eleitoral se
resume a fatos isolados.
A falta de critérios mais precisos
para identificar o público do cadastro (quem aponta os pobres
são as prefeituras) também é um
risco apontado em estudo de Carlos Alberto Ramos, professor da
UNB (Universidade de Brasília),
feito a pedido do governo tucano.
A pesquisa conclui que, apesar
do risco de as informações do cadastro terem "consistência próxima de zero", os resultados não
confirmam a tese quase "apocalíptica". "O cadastro foi imaginado como sendo um potencial instrumento para subsidiar e avaliar
as políticas públicas na área social
e, nesse sentido, parece ter passado a primeira tentativa de validação", resume Ramos.
Espécie de "mãe" do cadastro, a
economista do Ipea (Instituto de
Pesquisa Econômica Aplicada)
Ana Lobato enxerga motivos políticos na ameaça de implosão do
cadastro. Por trás das críticas técnicas, haveria um ataque à tentativa de unificação dos programas
sociais, indicada por FHC, e uma
grande disputa entre os pelo menos quatro ministérios que cuidam diretamente da área social
no governo Lula. "Acho uma loucura acabar com o cadastro, que
custou racionalidade e recursos
públicos", alega.
O cadastro unificado e o cartão
magnético único para saque do
dinheiro repassado às famílias
pobres seriam o primeiro passo
para a unificação dos programas
sociais. O passo foi dado por FHC,
mas enfrenta resistências no governo Lula. "A tendência é cada
ministro ter seu feudo, querer ter
seus "pobres'", diz Ana Lobato.
A equipe de transição, coordenada por Antonio Palocci Filho,
sugeriu que todos os programas
de transferência de renda e mais o
programa que seria criado (o Cartão-Alimentação, do Fome Zero),
assim como o cadastro, fossem
coordenados por um único ministério ou secretaria. A recomendação foi ignorada na escalação
do governo Lula.
O Cadastro Único foi lançado
em julho de 2001 e pretendia traçar um perfil completo das famílias pobres. O banco de dados foi
centralizado na Caixa Econômica
Federal -que até hoje não permite acesso inteligente às informações e, por isso, provavelmente perderá o papel de processadora dos dados.
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