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Punição a teólogo é vista como recado do papa à AL
Pouco antes de vir ao Brasil, Bento 16 impõe sanção a expoente da Teologia da Libertação
Radicado em El Salvador, Jon Sobrino é acusado de valorizar lado humano de Jesus em detrimento do divino em sua obra literária
CLÓVIS ROSSI
COLUNISTA DA FOLHA
O prelúdio da viagem do papa
Bento 16 ao Brasil é uma mensagem duríssima, na forma da
punição imposta a Jon Sobrino,
teólogo nascido na Espanha
mas radicado em El Salvador
há 50 anos e um dos principais
expoentes da Teologia da Libertação, corrente da igreja que
faz uma análise radical da realidade, utilizando inclusive elementos do marxismo.
A punição "antecipa uma das
indicações que o papa ditará à
igreja latino-americana, cujos
quadros dirigentes são, em boa
parte, influenciados pelo espírito da Teologia da Libertação",
avisa Sandro Magister, respeitado vaticanista italiano.
Concorda com a avaliação
um dos principais expoentes
dessa teologia no Brasil, o dominicano frei Betto: "Roma,
que lida tanto com símbolos,
precede a visita do papa ao país
com maior número de católicos
com a censura a Jon Sobrino,
como se impusesse a quem
convidou o papa que afastasse
de sua casa um irmão querido".
O que frei Betto diz reflete à
perfeição o sentimento de irritação de outros religiosos das
correntes ditas progressistas.
Em artigo no jornal espanhol
"El País", Juan José Tamayo,
diretor da Cátedra de Teologia
y Ciências das Religiões na Universidade Carlos 3º de Madri,
afirma: "Desde 1975, [Sobrino]
vem sendo investigado detetivescamente e sem piedade".
A investigação se dá por causa de dois livros do teólogo: "Jesus Cristo libertador - Leitura
histórico-teológica de Jesus de
Nazaré" e "A fé em Jesus Cristo. Ensaio a partir das vítimas".
Para entender as "vítimas"
do título do livro, é preciso saber que Sobrino era companheiro de cinco outros jesuítas
assassinados pelos esquadrões
da morte da direita, nos anos
80, além de ser considerado
responsável pela conversão do
conservadorismo ao progressismo de monsenhor Oscar Romero, arcebispo de San Salvador, também morto em plena
missa na catedral da cidade.
A sentença contra o jesuíta
foi apresentada a Bento 16 em
outubro passado. Foi assinada
em novembro, mas só publicada em 14 de março, a menos de
dois meses da chegada do papa
ao Brasil (dia 9 de maio).
Sobrino ainda não assinou a
aceitação do castigo, que o põe
sob controle do Vaticano, lhe
impõe silêncio e o proíbe de dar
aula em universidade canônica.
A punição a um expoente da
Teologia da Libertação é coerente com o passado de Bento
16, que como chefe da Congregação para a Doutrina da Fé, já
havia criticado duramente essa
corrente da igreja.
Mas parece agora extemporânea, na medida em que parece muito atenuada a influência
que os teólogos da libertação tiveram na mídia, na igreja e na
política, nos anos 80, época de
profunda agitação em toda a
América Latina.
Frei Betto faz, porém, uma
ressalva. "A Teologia da Libertação não acabou. O que mudou
é que, antes, havia a iminência
de uma revolução que era perpassada pela teologia. Agora,
não representa mais um fator
revolucionário porque a revolução não está na agenda da
América Latina", diz.
De todo modo, punir Sobrino
é ressuscitar um pouco o ambiente que João Paulo 2º, encontrou em sua primeira viagem à América Latina (México,
1979). Também então haveria
uma conferência do episcopado latino-americano, em Puebla. E a guerra entre conservadores e progressistas (rótulos
que a igreja sempre procurou
rejeitar) era feroz.
A divergência que levou à punição de Sobrino é mais celestial que política. Ele é acusado
de minimizar o lado divino de
Jesus para enfatizar o humano.
Tamayo, porém, faz leitura
bem mais politizada da questão. Lamenta que a igreja "tenha um comportamento pouco
generoso com os mártires e as
testemunhas", que seriam os
jesuítas mortos e Sobrino.
"Costuma acusá-los de ter-se
desviado da missão evangelizadora, de meter-se na política
quando deveriam cuidar do
culto, e de lutar pela libertação
dos pobres ombro a ombro com
eles, quando deveriam cuidar
da salvação da alma." Seria esse
o recado contido na punição.
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