|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
SANTA CATARINA
Hulse afirma que só hoje sabe da ação de pessoas que "usaram metodologia" para maquiar "situações"
Vice diz que não emitiria títulos de novo
LUCIO VAZ
enviado especial a Florianópolis
O vice-governador de Santa
Catarina, José
Augusto Hulse
(PMDB), disse à
Folha que não
faria de novo a
emissão de títulos do Estado para o pagamento de
precatórios.
"É claro que hoje, conhecendo
tudo isso, eu não faria", disse. O
governador Paulo Afonso Vieira
disse ontem, em Florianópolis,
que faria a emissão novamente.
Hulse assumirá o governo do Estado se o governador Paulo Afonso
Vieira (PMDB) for afastado do
cargo pela Assembléia Legislativa,
dentro de aproximadamente 60
dias, e, depois, se perder definitivamente o cargo após concluído o
processo de impeachment.
O vice-governador afirmou que
não tinha conhecimento dos valores da operação comandada por
Paulo Afonso. Afirmou que, hoje,
tem conhecimento da ação de pessoas que "usaram metodologia de
cálculos para maquiar situações,
valores".
Hulse se declarou inocente:
"Não conheci nenhuma dessas
pessoas. Portanto, posso declarar
uma inocência total em relação ao
conhecimento desses encaminhamentos, por mais corretos que
possam ter sido, ou equivocados".
O vice-governador disse que só
assinou documentos que "os técnicos, os assessores e a estrutura
do governo haviam montado".
Ele afirmou que não sabia que o
valor total dos precatórios era de
apenas R$ 37 milhões. "Não, nunca lidei com valores." Também
afirmou não saber que o valor das
emissões chegaria a R$ 605 milhões. "Não imaginei que chegasse a tanto."
Folha - Dentro de cerca de 60
dias a Assembléia vai decidir se
aceita ou não a acusação contra o
governador. Qual o resultado que
o senhor espera dessa votação?
José Augusto Hulse - Acho que
a razão vai acolher a defesa do governador. E esperamos que o governador possa concluir o processo sem o afastamento ou, mesmo
que haja necessidade de afastamento, sem a perda do mandato.
Folha - O PFL, com a retirada do
plenário, ajudou o senhor. Por que
ajudou?
Hulse - A ausência ajudou, a
presença também ajudaria. Mesmo que o PFL estivesse presente,
pela manifestação de vários deputados, naquela circunstância, haveria votos favoráveis.
Folha - Um dia antes, o governador havia anunciado uma ampla
reforma do secretariado, com a
participação de outros partidos. Isso não teria influenciado a decisão
do PFL?
Hulse - Apresentamos as nossas renúncias para que o governador tivesse liberdade para começar
a fazer as alterações que o momento estava a exigir. Podem mudar
alguns nomes, mas não muda o
objetivo do governo. Esperamos
apenas fortalecer o perfil de estrutura partidária, com figuras que
sejam reconhecidamente lideranças políticas, já que estamos num
ano pré-eleitoral. Se houve alguma
influência na decisão do PFL? Talvez tenha até tido, em função do
desejo de muitos deputados e até
de outras lideranças que insistiam
na exoneração de alguns secretários, por razões de estarem citados
no processo.
Folha - A idéia é recompor a
aliança que o governo tinha com o
PFL, PDT e PSDB?
Hulse - Não é a idéia básica. Pode, eventualmente, ter pessoas de
outras siglas. O governo não é uma
exclusividade da sigla PMDB. A vitória na eleição se deu com o apoio
de outros partidos. Se houver alguém de outro partido, e hoje nós
temos, não é pecado nenhum. O
importante é que esteja alinhado
ao interesse do governo e que seja
fiel ao governador. E que tenha
também um compromisso político e desenvolva ações para que, ao
chegar o ano que vem, tenhamos
realizado um governo que nos garanta a sucessão, elegendo o maior
número de deputados e também o
governador.
Folha - Hoje, analisando todos
os problemas decorrentes dessa
emissão de títulos do Estado, se
dependesse do senhor, lá naquele
13 de junho de 96, o senhor teria
emitido aqueles R$ 605 milhões?
Hulse - Na CPI da Assembléia,
quando perguntado se faria a operação, disse que, sendo do interesse do Estado e sendo uma alternativa, faria. Houve uma interpretação de que eu faria tudo de novo.
Não é bem assim. Hoje, à luz do
conhecimento de que houve a participação de pessoas que, vindo de
fora, com tecnologia de cálculo
para maquiar algumas situações,
valores, com acesso ao Tribunal de
Justiça, para de lá extrair relações e
dados, e encaminhar de uma forma que criou toda essa polêmica,
claro que podemos dizer que não
repetiríamos aquilo. Talvez, hoje,
a CPI do Senado devesse se voltar
ao sistema financeiro nacional,
onde quadrilhas, espertos, que
não eram conhecidos por nenhum
catarinense, encaminharam essas
operações. Mas ainda cabe uma
explicação. Não conheci nenhuma
dessas pessoas, em nenhum momento tive contato com eles. Portanto, posso declarar uma inocência total em relação ao conhecimento desses encaminhamentos,
por mais corretos que possam ter
sido, ou equivocados. Se precisarmos, hoje, sabemos que existem
outras fontes de recursos para
mais investimentos. Mas fazer
uma coisa que hoje todos condenam não seria de bom alvitre, de
bom senso. É claro que hoje, conhecendo tudo isso, eu não faria.
Folha - Nesse episódio da emissão dos títulos, o senhor acha que
o governador, do ponto de vista
técnico ou político, cometeu algum erro?
Hulse - Tecnicamente, a operação foi montada dentro das normas. Pela questão legal, não vi
também nenhuma razão para o
desamparo. Eu creio que todos
agiram com a consciência de estarem agindo da forma correta.
Folha - O senhor foi envolvido
nesse processo porque assinou documentos com informações pedidas pelo Senado. O senhor tinha
conhecimento do que estava assinando?
Hulse - Assinei dois documentos encaminhando informações
complementares, uma delas à Comissão de Assuntos Econômicos
do Senado. Encaminhei todos os
processos. E isso representou milhares de cópias. Um outro, encaminhado ao Banco Central, informando que as ações encaminhadas pelo Tribunal se tratam de
ações cujos processos haviam
transitado em julgado. Isso sem
acrescentar valor, sem acrescentar
dados, encaminhamos ofícios que
os técnicos, as assessorias e as estruturas do governo haviam montado. É claro que não cabe ao governador, ao vice-governador,
conferir milhares de processos. Isso representou uma Kombi cheia
de cópias.
Folha - O senhor tinha conhecimento de que o valor total dos
precatórios era de R$ 37 milhões?
Hulse - Não. Nunca lidei com
os valores, não sabia o quanto significavam.
Folha - Mas sabia que a emissão
era para o pagamento de precatórios?
Hulse - Precatórios. E, se não
usado o dinheiro para o pagamento de precatórios, os recursos estariam no Tesouro. Se sobrou recurso, se foi usado para outra coisa, só
um levantamento do Tesouro poderá dizer. Agora, não se deixou de
pagar nenhum precatório.
Folha - O senhor tinha noção de
que o valor dos precatórios era 6%
do valor que estava sendo emitido?
Hulse - Não, porque não me
envolvi em ver valores, em conferir quantidades, em discutir se era
30 ou 300. A única coisa que fiz foi
encaminhar a relação extraída do
Tribunal, atualizada por uma metodologia que foi trazida por técnicos que eu nunca ouvi falar e nunca vi na minha vida. Que chegaram
aqui, que estiveram na Fazenda,
na Procuradoria, no Tribunal de
Justiça, e de lá extraíram complementos, valores e correções que
acabaram transformando os valores iniciais em valores que chegaram a R$ 600 milhões.
Folha - O senhor não sabia que o
valor chegaria a isso?
Hulse - Não, não imaginei que
chegasse a tanto. Soube posteriormente. Mas todos eles calculados
por técnicos que vieram com a metodologia que aplicaram em Alagoas, São Paulo, Pernambuco.
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
|