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BRASIL PROFUNDO
Em uma cidade do interior de São Paulo, campanha eleitoral é quase ficção
Casa do chapéu
ARMANDO ANTENORE
ENVIADO A BARRA DO CHAPÉU (SP)
A pequena e pobre Barra do
Chapéu -no Vale do Ribeira, sudoeste de São Paulo- é uma cidade predominantemente evangélica. Por ali, entretanto, mal se
tem notícia de Anthony Garotinho. Não há cartazes do candidato nas estreitas ruas, todas de terra, que compõem o lugarejo.
Também não há faixas, folhetos
ou adesivos. Nada.
Parte dos "crentes" locais nem
mesmo sabe que um evangélico
deseja alcançar a Presidência da
República. São os "sem TV"
-aqueles que, por razões religiosas, não vêem televisão. Rádio, escutam, mas evitam os programas
políticos. Assim como passam
longe de comícios e de qualquer
evento do gênero.
Uma outra parcela, menos ortodoxa, mantém-se razoavelmente
informada e conhece Garotinho.
Só que, discretíssima, não revela
em quem votará.
Resumindo: na cidade dos
evangélicos, distante 344 km da
capital paulista (menos que a distância entre o Rio e são Paulo), o
desempenho do presidenciável
ainda é uma incógnita.
O candidato do PSB pode tanto
estourar quanto submergir fundo. Se depender da prefeita
-Maria Anunciata da Silva Leme, 37, tucana de última hora e
católica-, Garotinho naufragará.
""Escreva: José Serra irá surpreender na Barra", promete.
"O povo daqui me respeita muito." Se depender dos inimigos da
prefeita, vai dar Lula.
Barra do Chapéu virou município em 1991, quando se emancipou de Apiaí. Com 4.840 habitantes e 3.845 eleitores, exibe um dos
piores IDHs (Índice de Desenvolvimento Humano) do Estado. Só
perde para Barra do Turvo, também no Vale do Ribeira.
Possuir IDH ruim -um indicador medido pelo IBGE- signfica
registrar altas taxas de analfabetismo e mortalidade infantil, carecer de infra-estrutura e amargar
renda per capita irrisória.
Sem dúvida, a miséria motivou
a ascensão evangélica na Barra do
Chapéu. A negligência católica,
porém, contribuiu igualmente.
Moradores relatam que, por décadas, o padre da região visitava
pouco o município. Como levava
meses para voltar, vários namorados de lá casaram-se em 8 de setembro -dia da padroeira.
"Era certeza de que o sacerdote
apareceria", recorda a comerciante Alina Lima Conceição, 76.
Hoje, o pároco de Apiaí reza
missas semanais na Barra, onde
existem nove igrejas. Chega, celebra a eucaristia e vai embora. Já os
evangélicos contam com a presença constante de cinco pastores,
que vivem na cidade.
Dispõem, ainda, de 23 templos.
A maioria (14) pertence à Congregação Cristã no Brasil. Os demais
distribuem-se entre os batistas,
presbiterianos, adventistas e
adeptos da Assembléia de Deus.
Juntos, os "crentes" somam algo
como 70% da população, de acordo com a prefeitura. Pentecostal,
a Congregação Cristã é a única da
Barra que pede para os fiéis não
assistirem à TV.
Recomenda, também, que se
afastem das campanhas e discussões políticas. "A televisão disse
mina a violência, a droga e a sexualidade deturpada", acredita o
pastor Valderi Luiz Vidal Cezar,
43. "Já a política estimula a intriga
e o conflito."
"Se você sair perguntando, não
ouvirá ninguém dizer que vai votar no Garotinho, porque somos
assim, meio caladões", explica
Edivaldo Sebastião da Silva, 39,
presbítero da Assembléia de
Deus. "Podemos até parecer bobos, mas não se engane: na hora
H, o pessoal da nossa igreja saberá
o que fazer."
A prefeita -que se elegeu pelo
PPB como "Mãezinha do Povão"
e está no PSDB há um ano-
aposta em frenético corpo-a-corpo para emplacar Serra entre os
eleitores da cidade.
Espalhou faixas e banners de tucanos por boa parte da área urbana, de tal modo que o azul e o
amarelo prevalecem com larga
vantagem sobre as cores dos outros concorrentes.
Na zona rural, a prefeita distribuiu "santinhos" de casa em casa
-cerca de 10 mil folhetos, que
trazem o número do presidenciável governista.
Trabalha forte, ainda, por seu
padrinho político, Adhemar de
Barros Filho. O pepebista disputa
uma vaga na Câmara.
"Ela que espalhe quantos cartazes quiser. Cartaz não vota", desdenha o pedreiro João Batista Rafael da Mota, 38, que integra o diretório municipal do PT e se opõe
à prefeita. "Nossa campanha é
mesmo mais modesta, pois o Lula, aqui, já nem precisa de propaganda", diz ele.
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