São Paulo, #!L#Domingo, 06 de Fevereiro de 2000


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União deve R$ 153 mi por terreno

SERGIO TORRES
da Sucursal do Rio

O governo federal deve R$ 153.460.058,56 a descendentes do visconde de Albuquerque pela ocupação de um terreno da família durante a Segunda Guerra Mundial. É o segundo maior precatório do país.
Com 4.776 metros quadrados, o terreno fica no Leblon, bairro nobre da zona sul do Rio, e ocupa trecho do lado par da avenida Visconde de Albuquerque. Nele, funciona hoje o 23º BPM (Batalhão de Polícia Militar).
O dinheiro do precatório é suficiente para a compra de pelo menos 306 apartamentos de três quartos na avenida Delfim Moreira- de frente para a praia do Leblon-, espaço dos mais valorizados da orla carioca. Em média, um apartamento do tipo vale cerca de R$ 500 mil.
Passados 56 anos e nove meses da ocupação do terreno pelo antigo Ministério da Guerra, a União ainda não indenizou a família.
Durante o período, morreram as duas titulares da ação -as irmãs Joanna Cavalcanti de Albuquerque Figueira de Mello e Maria Emília Fleury Cavalcanti de Albuquerque. Morreram também os advogados contratados para defender a causa e todos os funcionários do governo envolvidos no processo que levou à ocupação do terreno pelos militares.
A expectativa dos oito herdeiros dos espólios de Joanna e Maria Emília é a de receber logo a quantia do precatório, estipulada pela Justiça Federal do Rio. O Orçamento da União para este ano prevê o pagamento da dívida.
Será o ponto final de uma luta iniciada pelos Albuquerque em 1946. Três anos antes, no mês de maio, o Ministério da Guerra havia ocupado o terreno da família, com base no decreto 10.358 (de 31 de agosto de 1942), do então presidente da República, Getúlio Vargas. O decreto -que declarava o estado de guerra- suspendia a garantia do direito de propriedade, prevista na Constituição de 1937.
Com o término da Segunda Guerra, em 1945, e a decretação presidencial do fim do estado de guerra, a família esperava receber uma indenização ou reaver o terreno, onde o ministério havia instalado o 8º Grupo Móvel de Artilharia de Costa. A expectativa se frustrou. Diante da recusa governamental, os descendentes do visconde resolveram entrar na Justiça com uma ação intitulada de "apropriação indireta".
Começava uma disputa jurídica só encerrada em 15 de outubro de 1998, quando se tornou definitiva a sentença pró-indenização formulada quatro anos antes.
Em 20 de junho de 1994, a então juíza substituta da 1ª Vara Federal do Rio, Cláudia Maria Bastos Neiva, expediu sentença condenando a União a indenizar os herdeiros dos proprietários do terreno.
A União ainda recorreu da sentença ao TRF (Tribunal Regional Federal) e ao STJ (Superior Tribunal de Justiça), mas os recursos fracassaram.
Na Justiça Federal do Rio, causa espanto o fato de uma ação ter demorado 52 anos entre o início e a sentença definitiva.
O advogado da família, Antônio de Oliveira Tavares Paes, alega questões éticas para não comentar os procedimentos adotados pelas partes (União e família Albuquerque) envolvidas na disputa judicial ao longo desse período.
Pareceres, contestações, consultas, perícias, medições e recursos os mais variados fizeram o processo circular pela Justiça do antigo Distrito Federal, do antigo Estado da Guanabara e do atual Estado do Rio, com passagens pelo antigo Tribunal Federal de Recursos, pelo TRF, pelo STJ e pela Procuradoria da República.
Como estratégia de defesa, a União sempre argumentou que a família Albuquerque não era a proprietária do terreno.
Baseado em parecer emitido pelo Ministério do Exército, o governo federal sustentou que o terreno pertencia à Prefeitura do Distrito Federal, não cabendo a indenização reivindicada.
O argumento foi desconsiderado pela Justiça, que, ao analisar documentos de registros de imóveis apresentados pelas partes, concluiu pela legitimidade da pretensão dos Albuquerque.
A partir do 20º aniversário da ocupação do terreno, o governo federal passou a defender a tese de que a ação estava prescrita.
De acordo com essa alegação, imóvel ocupado de forma contínua por mais de 20 anos passaria a integrar o patrimônio do responsável pela ocupação.
A Justiça Federal entendeu que a tese seria válida se não houvesse uma contestação judicial. Como a ocupação vinha sendo questionada na Justiça, o argumento governamental foi rechaçado.





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