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"Não senti com namorada o que sinto hoje pela Igreja"
da Reportagem Local
Leia, a seguir, a continuação da
entrevista concedida pelo padre
Marcelo Rossi à Folha.
Folha - O sr. pretende gravar
músicas com temas sociais?
Padre Marcelo - Sim. Até pensei em pegar uma música do padre Zezinho, mas, infelizmente,
por outros problemas, não pude
usar (leia texto ao lado).
Folha - Qual música?
Padre Marcelo - "Oração pela
Família". Aquela que diz que há
famílias debaixo da ponte.
Folha - Como as escolhe?
Padre Marcelo - Escolho as que
me tocam o coração e testo no
Santuário do Terço Bizantino.
Canto e vejo a reação dos fiéis.
Folha - Surpreendeu-se com a
repercussão de alguma canção?
Padre Marcelo - "Erguei as
Mãos". Não esperava o sucesso.
Chegou uma época em que não
aguentava mais cantá-la.
Folha - Cansou-se dela?
Padre Marcelo - Nossa Senhora! No ano passado, não podia
nem ouvi-la. Meu Jesus Cristo!
Folha - Em público, o sr. a cantava com desânimo?
Padre Marcelo - Não mostrava
isso. Fazia com amor, mas pessoalmente... Eu não escutava mais
essa música. Só que era obrigatório cantá-la. Ai de mim se não
cantasse. Não podia ir embora.
Não tinha jeito, ela pegou.
Folha - E hoje, o sr. a escuta?
Padre Marcelo - Sou obrigado.
Em Miami, vou cantá-la.
Folha - Mas, se dependesse do
sr., escutaria?
Padre Marcelo - Não.
Folha - Ainda consegue trabalhar em sua paróquia?
Padre Marcelo - Difícil, difícil.
Nossa Senhora do Perpétuo Socorro ainda é minha paróquia.
Sou o pároco. Da parte administrativa, estou tomando conta.
Mas não celebro missas lá. Outros
sacerdotes celebram. Rezo só no
Santuário, que, no fundo, é uma
extensão da minha paróquia.
Folha - E confissão, faz?
Padre Marcelo - Sim, sou padre. Mas restrinjo aos meus paroquianos ou estou perdido. Lido
com muitas pessoas. Mesmo que
queira, é lógico que só consigo
atender 0,01%. Mas aí faço as pessoas irem para os outros sacerdotes. Não tem de ser comigo.
Folha - O que de fato mudou
em sua vida paroquial?
Padre Marcelo - Muita coisa.
Não posso sair tranquilamente.
Folha - Pode visitar hospitais e
creches?
Padre Marcelo - Hospital, continuo visitando. O coração é mole.
Creches, favelas, não dá mais. Não
tenho tempo. Outro exemplo:
quero ir ao banco, não posso.
Folha - Mas isso não está relacionado à vida paroquial.
Padre Marcelo - Claro que está,
administro a paróquia. As pessoas não se controlam. Quando
me vêem, chegam, pedem a benção, vem uma, outra. É um alto
preço, muito alto. Fazer o quê?
Folha - Termina hoje encontro
nacional de presbíteros em São
Paulo. O texto que serviu de base para os debates criticava os
padres cantores. Dizia, por
exemplo, que tais sacerdotes
estimulam a fuga da realidade e
correm o risco de se deixar levar
pelas vaidades do estrelismo,
de ceder à certa mundanidade
da mídia (roupas de grife, companhia de colunáveis) e de se
aproximar demais do "rio de dinheiro" que circula nas TVs. O
que o sr. pensa disso?
Padre Marcelo - Dinheiro: nunca fiquei com nada. Tudo foi aplicado na igreja.
Folha - Sua família fica?
Padre Marcelo - Não. Meu pai
nunca foi rico, mas minha família
é de classe média alta.
Folha - O sr. vive de salário?
Padre Marcelo - A paróquia
sempre me sustentou. Mas nunca
na minha vida peguei meu salário. Não preciso. Não gasto. A paróquia banca a minha alimentação, e eu nunca fui de abusar.
Folha - O sr. não compra nada?
Padre Marcelo - Nunca ganhei
tanta coisa na minha vida. Ganho
de presente. É roupa, é tudo. O
povo dá. As roupas que tenho,
pessoas vão fazendo.
Folha - O sr. não anda com dinheiro no bolso?
Padre Marcelo - Não. Tenho
carteira, cheque, cartão de crédito, mas não uso há um ano e
meio, dois. Quando preciso, peço
para meu pai. Mas poderia pegar
com a igreja.
Folha - Por que não pega?
Padre Marcelo - Prefiro entregar meu dinheiro... Ficar falando
para vocês é ruim... Se sei que há
pessoas passando necessidade,
ajudo. Mas não escrevam isso.
Folha - O sr. doa o seu salário?
Padre Marcelo - Sim.
Folha - Todo?
Padre Marcelo - Sim.
Folha - De quanto é?
Padre Marcelo - Não é muito.
Estou tirando R$ 350. Nunca peguei esse dinheiro.
Folha - Do que vivem os pais
do sr.?
Padre Marcelo - Meu pai é gerente de banco aposentado. Ganhou uma ação trabalhista. Um
bom dinheiro, graças a Deus, que
ele tem guardado. Peço para meu
pai, olha que absurdo: "Pai, não
use seu dinheiro". Não o deixo fazer certas coisas porque alguns
podem pensar que está tirando
dinheiro da igreja. Olha que absurdo! Ele estava para trocar o
carro, eu pedi, nunca pensei que
faria isso na vida. "Pai, não troque
o carro". Como padre secular, eu
poderia ficar com todo o dinheiro
dos CDs. E olha que não foi pouco
dinheiro. Foi muito.
Folha - Quanto?
Padre Marcelo - Idéia eu tenho,
mas não gosto de falar.
Folha - Por que não?
Padre Marcelo - Nunca acho
positivo falar nisso.
Folha - Medo de sequestro?
Padre Marcelo - Sequestro?
Não tenho dinheiro nenhum.
Folha - Anda com seguranças?
Padre Marcelo - Não, nada. Ridículo, eu sou padre. Quem anda
comigo é ele aqui (bate nas costas
do assessor). Ele dirige. Adoro dirigir, mas não posso.
Folha - Por quê?
Padre Marcelo - Porque me fecham. Jogam o carro na frente e
param. Querem me cumprimentar: "Padre, pelo amor de Deus".
Folha - Se ele dirige, não fecham do mesmo modo?
Padre Marcelo - Mas, se o carro
bater, não é o padre guiando.
Folha - Gosta de dirigir?
Padre Marcelo - Sempre gostei.
Era o motorista do seminário.
Mas vamos retomar àquelas críticas... Quero falar...
Folha - Uma das críticas que o
sr. recebe é deixar-se levar pelas
vaidades do estrelismo. O sr. já
apareceu na revista "Caras"...
Padre Marcelo - Não busco nada disso. Pode ter certeza. Mas
não vou me fechar a ninguém
porque Jesus vai a qualquer lugar.
Fiz um trabalho de divulgação do
CD. Então vou a todo programa, a
todo lugar. Estou levando a palavra de sacerdote e não estou perdendo a dignidade. Em 99, estive
nos programas de pessoas que me
respeitam como sacerdote.
Folha - Outra crítica: estimular
a fuga da realidade.
Padre Marcelo - Isso podem falar da Renovação Carismática.
Não sou carismático.
Folha - Acha que a Renovação
Carismática promove a fuga da
realidade?
Padre Marcelo - Não. É uma
bênção, sempre no equilíbrio.
Folha - O sr. não se considera
da Renovação Carismática?
Padre Marcelo - Sou padre da
Igreja Católica Apostólica Romana. Um sacerdote não pode estar
preso a nenhum movimento. Estou aberto a todos.
Folha - O sr. estimula os trabalhos nas pastorais?
Padre Marcelo - Lógico.
Folha - Como o sr. se define
politicamente?
Padre Marcelo - Depois que me
ordenei, não dá para separar o
Marcelo do padre. Aprendi que a
consciência política é superimportante. Mas a igreja não pode se
prender a partidos. É apartidária.
Tem de dar consciência política,
óbvio. Mas sem citar candidatos.
Folha - O sr. vota em candidatos de esquerda ou de direita?
Padre Marcelo - Isso nem a minha mãe sabe.
Folha - Em quem votou na última eleição para presidente?
Padre Marcelo - Não vou falar.
Posso influenciar.
Folha - Tem pretensões hierárquicas dentro da igreja?
Padre Marcelo - Nunca.
Folha - Não quer virar bispo?
Padre Marcelo - Não.
Folha - Vai ser sempre padre?
Padre Marcelo - Amo o que faço. Tenho consciência de que isso
tudo é um momento e de que vai
acabar. Graças a Deus.
Folha - O que o sr. vai fazer
quando esse momento acabar?
Padre Marcelo - Vou tocar a
minha vida, fazendo o que sei e o
que acredito. Ser padre.
Folha - O sr. já foi convidado
para ser candidato?
Padre Marcelo - Não posso.
Acho que ninguém vai fazer isso
comigo. Se vier, vai escutar um
não. Nunca recebi um convite.
Folha - O sr. vai aceitar convites para participar do Carnaval
no Rio, como foi divulgado?
Padre Marcelo - Não. Se aceitasse o convite de uma escola, teria de ir a todas, para abençoar.
Folha - O sr. pulava Carnaval
antes de ser padre?
Padre Marcelo - Vou ser honesto. Malhava tanto, fazia tanta ginástica, que treinava de segunda a
segunda. Ficava dez horas por dia
na academia, duas horas dando
aula. Hoje não faço nada, é uma
vergonha. Não tenho tempo.
Folha - É vaidoso?
Padre Marcelo - Na época da ginástica, era muito vaidoso com o
corpo. Só que nunca fui de roupa
de grife, acho um absurdo.
Folha - Já usou drogas?
Padre Marcelo - Nunca provei.
Amigos chegaram a me oferecer,
mas afetaria meu treinamento.
Folha - E namoradas, teve?
Padre Marcelo - Sérias, duas vezes. Comecei a namorar com 16 e
fui até meus 20. Uma delas, de
quem quase fiquei noivo, não encontrei mais. A outra, batizei o filho, foi lindo. Essa namorei mais
tempo, uns dois anos e meio.
Folha - Era apaixonado?
Padre Marcelo - Sinceramente?
Era muito voltado para mim mesmo. Não acho que fui apaixonado. Nunca senti com as namoradas o que sinto pela Igreja.
Folha - O que o sr. quer dizer
com namoro sério?
Padre Marcelo - Ficar... (gagueja). Como sacerdote, é uma coisa
tão... colocar. Como um rapaz
normal. Sou normal.
Folha - O sr. teve relações sexuais antes de ser padre?
Padre Marcelo - É uma coisa
tão íntima que prefiro não falar,
devido à função que ocupo agora.
Folha - O sr. é contra o sexo
antes do casamento?
Padre Marcelo - Sigo a orientação da Igreja. No mundo de hoje,
as pessoas são usadas, como copo
descartável. Usou uma vez, joga
fora. Sugo de você o máximo que
você tem. Isso não é amor; é o ficar. Hoje gosto de alguém; amanhã, odeio. Vai de um extremo a
outro. Tudo o que vemos é um
mundo erotizado, que coloca o
sexo em primeiro lugar. Não é assim. Sou celibatário, vivo o celibato e creio nele. E digo de coração.
Sou um homem normal e consigo
viver, acredito na missão. É lógico
que tem a graça de Deus, a oração... No dia em que eu... Se você
parar a oração... E também tem a
exposição. Estamos em um mundo em que há filmes pornográficos. Uma pessoa que vai se expondo a isso, é lógico que só vai
pensar nisso. Uma pessoa que reza... Tudo depende do que está
entrando em contato com você.
Folha - O sr. é assediado?
Padre Marcelo - Digo de coração. Nunca recebi nenhuma cantada. Tenho muita postura. Logo
coloco a mão na cabeça de quem
se aproxima, para abençoar.
Folha - É uma defesa?
Padre Marcelo - Pode ser, sempre me defendi. Você sabe quando a pessoa está com olhar malicioso. O importante é que eu não
tenho. Quando você não tem isso
e se policia, olha com carinho, não
deixa a pessoa ter um acesso
maior. Se percebo que alguém está com má intenção, não sou bobo, não vou ficar sozinho com essa pessoa, não vou dar chance.
Folha - Viu a propaganda de
moto que faz referência ao sr. e
a outros padres cantores?
Padre Marcelo - Vi uma vez e
prefiro não julgar. Eu não brinco
com as coisas religiosas.
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