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PRIVATIZAÇÕES SOB SUSPEITA
Acusação é de improbidade administrativa em empréstimos para a privatização da Eletropaulo
18 ex-dirigentes do BNDES estão na Justiça
ELVIRA LOBATO
DA SUCURSAL DO RIO
ANDRÉA MICHAEL
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
Quatro ex-presidentes e 14 ex-diretores do BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social) são acusados de
improbidade administrativa na
concessão de empréstimos para a
privatização da Eletropaulo, entre
98 e 2001, em ação que tramita na
10ª Vara Federal de São Paulo.
Os procuradores José Roberto
Pimenta Oliveira, Luciana Costa
Pinto e Suzana Fairbanks Oliveira
acusam os ex-dirigentes de negligência na exigência de garantias
dos empréstimos ao grupo AES,
controlador da Eletropaulo.
Segundo eles, os executivos teriam ignorado normas de proteção de crédito e exposto o banco a
riscos desnecessários. Há um parecer do auditor do Ministério
Público Federal Antônio Venerando da Silva dizendo que a inadimplência da AES causou prejuízo ao BNDES, mas a diretoria
atual do banco nega prejuízos.
Proposta a ação, em julho do
ano passado, a Justiça Federal em
São Paulo determinou a quebra
de sigilos fiscal e bancário e a indisponibilidade dos bens dos acusados. A medida foi suspensa por
recurso dos ex-diretores do
BNDES ao Tribunal Regional Federal da 3ª Região.
Dos cinco ex-presidentes do
BNDES do período a que se refere
a ação, apenas André Lara Resende ficou de fora, pois não houve
empréstimos à AES nem renegociação em sua gestão (de abril de
98 a novembro de 99).
O ex-ministro das Comunicações Luiz Carlos Mendonça de
Barros, que presidiu o banco de
abril de 95 a abril de 98, é um dos
réus. A ação questiona dois fatos
da gestão dele: a criação do Pepe
(Programa de Estímulo à Privatização Estadual), em julho de 97, e
o financiamento de US$ 888 milhões para a privatização da Eletropaulo, em abril de 98.
O Pepe permitiu que o BNDES
antecipasse aos Estados 50% do
valor mínimo de venda das estatais para amortizar dívidas com a
União e financiou os compradores. Os grupos estrangeiros receberam empréstimos corrigidos
pelo dólar e deram as ações leiloadas em garantia.
"O financiamento concedido
pelo BNDES foi ilegal, desleal e
imoral. O banco entrou na privatização por uma decisão de governo, mas ainda assim é dever do
administrador preservar as garantias ao bem público", afirma o
procurador Pimenta Oliveira.
A Eletropaulo foi vendida à
Lightgás, em abril de 98, pelo preço mínimo estipulado no edital:
US$ 1,78 bilhão. O BNDES emprestou metade do valor, para pagamento em nove parcelas semestrais e um ano de carência.
Segundo a ação, não houve avaliação prévia da situação econômico-financeira da Lightgás, como prevê a resolução 862/96 do
banco. Eles apontam outras supostas falhas, como a inexistência
de compromisso dos acionistas
controladores da Lightgás (a EDF
francesa e a AES) com o cumprimento do contrato. A Lightgás foi
criada em junho de 97, tendo a
Light Serviços de Eletricidade
(que atua no RJ) como acionista
majoritária. Em novembro de
2001, a Light saiu da empresa e o
nome mudou para AES Elpa.
Antes de vencer a primeira parcela, a empresa quis renegociar a
dívida, alegando crise por causa
da desvalorização do câmbio. A
renegociação foi aprovada em fevereiro de 99 e a empresa ganhou
mais 24 meses para começar a
amortizar o empréstimo. Para o
MPF, o então presidente do
BNDES, José Pio Borges, e a diretoria do banco à época deveriam
ter exigido garantias adicionais.
Os acusados também são questionados por terem permitido que
a Eletropaulo distribuísse lucro
para acionistas controladores.
Em janeiro de 2001, o BNDES
voltou a financiar o grupo AES. O
banco vendeu ações preferenciais
da Eletropaulo, no valor de R$
2,05 bilhões, à AES Transgás, controlada por empresas sediadas
nas Ilhas Cayman. Para os procuradores, a venda repetiu os "mesmos vícios" da privatização. O
banco financiou o comprador,
aceitando as ações como garantia.
Na segunda parcela da dívida, a
empresa ficou inadimplente.
A quarta operação analisada foi
o descasamento societário da
Light e da Eletropaulo, em 2001,
quando houve a troca de ações
entre o grupo francês EDF (que ficou com a Light) e a AES Elpa,
que assumiu o controle da Eletropaulo. Segundo os procuradores,
o banco autorizou a operação sem
exigir o reforço de garantias.
Em 2002, ocorreu nova renegociação da dívida, e o banco exigiu
garantias adicionais. Porém, a
empresa voltou a ficar inadimplente no ano seguinte.
O primeiro ano do governo de
Luiz Inácio Lula da Silva foi marcado por uma queda-de-braço
entre o BNDES e o grupo AES. Em
dezembro de 2003, foi feito um
novo acordo, em que metade da
dívida, de US$ 1,2 bilhão, foi convertida em ações da Brasiliana
Energia, empresa que passou a
englobar todos os ativos da AES
no Brasil -Eletropaulo, AES Tietê e Uruguaiana.
Pelo acordo, US$ 90 milhões foram pagos em dinheiro e o restante foi transformado em títulos de
dívidas (debêntures) conversíveis
em ações da Brasiliana. "Essa foi a
única negociação séria, com garantias reais para o banco", diz o
procurador Pimenta Oliveira.
As privatizações voltaram à cena depois de Lula ter afirmado
que, no início de seu governo, um
"alto companheiro" o avisou de
que uma instituição estava quebrada por causa do "processo de
corrupção" em algumas privatizações na gestão de Fernando
Henrique Cardoso (95-2002), e
que, ao saber disso, orientou o
"companheiro" a "fechar a boca".
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