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TÃO PERTO, TÃO LONGE
Índios guarani andam até 20 km a pé para conseguir uma ambulância
Tribo enfrenta "fraqueza" e distância
AMAURI ARRAIS
ENVIADO A ITANHAÉM
Não é "desnutrição" a resposta que se ouve ao perguntar a índios guarani a principal dificuldade enfrentada na aldeia Rio
Branco, um pequeno povoado
entranhado no Parque Nacional
da Serra do Mar próximo a Itanhaém (98 km de São Paulo).
Localizada no distrito Litoral
Sul, que teve o maior crescimento da mortalidade infantil indígena segundo a Funasa (Fundação Nacional de Saúde), a aldeia
é responsável por uma das quatro mortes por desnutrição registradas em 2004. Mas, para
quem vive na comunidade, o
motivo que levou à morte uma
criança em meados do ano passado foi o que se convencionou
chamar de "fraqueza".
"Foi de repente. A criança vivia com fraqueza, diarréia",
conta o cacique Daniel Benite,
34, agente da Funasa, que diz ter
visto a criança morrer no colo
da mãe. "É muito difícil, mas estou agüentando porque não
quero abandonar a comunidade", afirma o cacique, que passou a acumular as duas funções
há apenas dois meses.
Para ele, assim como para outros membros da tribo, o pior
problema é o isolamento.
Para chegar à aldeia -na verdade, um conjunto de barracos
de madeira onde vivem 17 famílias- é preciso vencer 32 km de
estradas tortuosas, a maior parte de barro. Em casos de urgência, segundo os guarani, chega-se a percorrer a pé cerca de 20
km para conseguir uma ambulância ou dar um telefonema.
O atendimento à saúde é prestado semanalmente por uma
equipe com enfermeiro e dentista da Funasa. Há um mês, no
entanto, a aldeia não recebe a visita de um médico. Segundo Daniel, o mesmo profissional é responsável pelo atendimento em
outras cinco aldeias na região.
A comunidade não é beneficiada pelo programa Fome Zero
Indígena, do governo federal. A
única alimentação doada é a
merenda escolar que a Prefeitura de Itanhaém entrega semanalmente à escola indígena, a
maior edificação e a única com
energia elétrica da aldeia.
A ração garante o lanche diário das 18 crianças que aprendem português com um professor da própria aldeia na escola.
"Mas todos comem", afirma o
vice-cacique, João Mariano.
A subsistência vem das culturas de milho, mandioca, banana
e da extração de palmito, que,
com o artesanato, é vendido nas
feiras de Itanhaém e cidades
próximas. Os turistas, principais compradores, chegam a pagar até R$ 30 por uma réplica de
arco-e-flecha ou zarabatana.
Em dias bons, a venda chega a
R$ 80, diz o guarani Alexandre
Benite, 25, vendedor. Dividida, a
renda é usada para complementar a alimentação da aldeia.
A atividade, porém, pode ficar
inviável devido ao preço do
transporte entre a cidade e a aldeia, que não sai por menos de
R$ 140. A justificativa para o alto
valor cobrado para transportar
idosos, mulheres e crianças na
carroceria de uma camionete é
dada pelo motorista. "Só eu faço
esse caminho. E é por caridade."
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