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"Programa busca gerar leitores competentes"
DA SUCURSAL DO RIO
Folha - Por que construtivistas
e defensores do método fônico brigam tanto?
Telma Weisz - A polarização que
vem sendo estabelecida pelos defensores do método dito fônico
não é entre estes e os construtivistas. Muitíssimos educadores que
não se consideram construtivistas
também não apóiam a idéia de
que o método fônico seja a solução para a alfabetização no Brasil.
Mesmo os que não se vêem como construtivistas ou que aceitam apenas parcialmente esta teoria reconhecem, ao contrário dos
defensores da volta ao método fônico, a importância das pesquisas
e descobertas feitas na área da psicolingüística nos anos 70 sobre o
processo através do qual as crianças se alfabetizam.
Folha - Estados Unidos, Inglaterra e França estão priorizando o método fônico. Por que remar contra a
maré?
Weisz - O fato de esses países serem mais ricos não significa que
devamos importar acriticamente
tudo o que lá acontece. Estes movimentos de favorecimento do
método fônico são reações a movimentos locais anteriores ocorridos nesses países.
Na França, onde há uma forte
oposição ao movimento chamado de leiturização, cujo mais importante pensador é o professor
Jean Foucambert, isso acontece
exatamente porque este movimento pregava que a leitura deve
ser ensinada sem qualquer informação sobre as correspondências
entre letra e sons.
Nos Estados Unidos, a reação é
ao movimento conhecido como
linguagem total [whole language,
em inglês], criado pelos lingüistas
Keneth e Yeta Goodman. Este
movimento, que se disseminou
como um rastilho entre os professores americanos, também acreditava que a simples imersão no
universo dos textos escritos seria
suficiente para ensinar a ler e a escrever. Nós também questionamos a falta de importância que os
Goodman davam às questões relacionadas à compreensão da natureza alfabética do nosso sistema
de escrita e à aprendizagem dos
valores sonoros convencionais
das letras.
Mas não estamos remando contra a maré, apesar do sentimento
de inferioridade que faz com que
gente que conhece educação pelo
lado do financiamento, mas nada
sabe sobre didática, diga que só
somos competentes para jogar futebol e que, para pensar a educação, não temos alternativa a não
ser importar. Não só idéias, mas
também práticas, sem considerar
seus contextos de origem.
Folha - O MEC, ao abraçar teorias
construtivistas nos PCNs, não beneficia autores dessa proposta com
a compra de livros e prejudica os do
método fônico?
Weisz - Os PCNs não são obrigatórios. Só as diretrizes definidas
pelo Conselho Nacional de Educação é que são. Tanto quanto me
lembro, elas não assumem o
construtivismo nem se referem a
cartilhas ou métodos. As compras
do Programa Nacional do Livro
Didático são orientadas pela avaliação de qualidade produzida
por um grupo de professores de
diferentes áreas. Se as cartilhas do
método fônico estivessem sendo
pedidas pelos professores, elas seriam compradas, mesmo que mal
avaliadas.
Quanto a benefícios auferidos
pelos defensores da teoria construtivista, do ponto de vista financeiro, são nulos. Os recursos didáticos produzidos para apoiar a
formação dos professores como o
Profa (Programa de Formação de
Professores Alfabetizadores), entre outros, são gratuitos pois os
autores cederam os direitos autorais.
Quando se trata de livros didáticos, as cartilhas, algumas compostas de várias brochuras, são
muito lucrativas, chegando a custar centenas de reais por aluno
por ano. As discussões sobre métodos milagrosos costumam ter
significativos interesses financeiros por trás.
Folha - O construtivismo parece
funcionar muito bem em escolas
particulares, mas, nas públicas,
não seria melhor adotar o método
fônico?
Weisz - Eu diria que é exatamente o contrário. Para os alunos das
escolas particulares, que me desculpem suas esforçadas professoras, qualquer forma de ensinar
funciona. Eles vêm de ambientes
onde a escrita é muito presente
tanto do ponto de vista da existência de material impresso como
das práticas sociais que a envolvam. São os alunos das classes populares, que estudam na escola
pública, que sempre fracassaram,
e são eles que precisam de um
atendimento mais dialógico.
Hoje sabemos que nenhuma
criança chega à escola sem saber
nada sobre a escrita. Mas os saberes das crianças que vêm de famílias usuárias da leitura e da escrita
são muito mais avançados do que
os saberes das que vêm de comunidades pouco escolarizadas. Elas
precisam ser introduzidas no
mundo da cultura escrita para entender do que o professor está falando quando informa sobre letras e sons. Para estas crianças, a
escrita é um encadeamento de sinais gráficos aleatórios e elas precisam trabalhar e pensar bastante
sobre este objeto sociocultural para chegar a compreender a relação entre letras e sons dentro de
um sistema alfabético.
Fazer os alunos compreenderem o beabá sempre foi fácil para
as escolas da elite, mas isso não
basta. É preciso produzir leitores
competentes. É isso que as escolas
particulares buscam na metodologia construtivista. E é isso que
queremos para todos, e não apenas para a classe dominante.
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