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ENTREVISTA DA 2ª
Mais de cem farmacêuticas
foram interditadas em 98
"Você tem poucos
fiscais com multas
que não representam
nada. A multa mais
alta é de R$ 15 mil."
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VANESSA HAIGH
da Sucursal de Brasília
O caso do lote de pílulas anticoncepcionais Microvlar, fabricadas
pelo laboratório Schering do Brasil, que chegou ao mercado contendo farinha no lugar do princípio ativo, mostrou que a ameaça à
saúde do consumidor brasileiro
pode vir de onde ele menos espera.
Por um motivo básico: das 382
empresas da área farmacêutica,
apenas 40% têm práticas de produção que podem ser consideradas confiáveis. Só neste ano, mais
de uma centena de empresas, entre indústrias e distribuidoras, foram interditadas.
Os dados são da secretária nacional da Vigilância Sanitária, Marta
Nóbrega, há um ano e três meses
no posto. Foi a responsável pela
interdição da Schering e pela determinação de suspender a produção e a venda da Microvlar.
A Vigilância Sanitária agiu rápido no caso das pílulas. Mas não
tem funcionários suficientes para
garantir uma fiscalização constante, se ampara em uma legislação
com multas que não assustam e só
há três anos começou a oferecer
um sistema de normas para guiar
os procedimentos do setor.
Folha - A Schering do Brasil foi
fiscalizada em 95 e a Vigilância Sanitária apontou problemas no descarte dos medicamentos que iriam
ser incinerados. A desorganização
nesse processo pode ter contribuído para o roubo do lote de pílulas
anticoncepcionais Microvlar contendo placebo. Por que esse problema não foi resolvido?
Marta Nóbrega - Por causa do
número de fiscais que temos, geralmente fazemos a fiscalização sanitária pelo grau de risco. Você
acaba confiando em estruturas
que têm história e tradição dentro
da área. De 82 laboratórios de
grande porte, apenas oito apresentaram inadequação às boas práticas de fabricação e controle nas
vistorias feitas em 95 e 96.
Folha - O que faltou para que em
três anos a Schering do Brasil não
tivesse resolvido seu problema com o processo de descarte?
Marta - Um
dos itens é a
multa. Você
tem um número reduzido de
fiscais com
multas que não
representam
nada. A multa mais alta é R$ 15 mil.
Folha - Se as multas fossem mais
altas, os laboratórios seriam mais
cuidadosos?
Marta - Deve-se associar multas elevadas a uma ação de fiscalização que dê orientação aliada a
visitas mais frequentes da Vigilância Sanitária. A média internacional de fiscalização de empresas que
já apresentam boas práticas é de
dois anos. Quanto às multas, o ministro José Serra já pediu que nós
trabalhássemos para mudar essa
legislação, para criar penalidades a
outros procedimentos.
Todo o processo de distribuição,
por exemplo, não recebe penas.
Cerca de 85% dos medicamentos
que saem dos laboratórios passam
por distribuidores antes de chegar
às farmácias.
Folha - Se a sra. fosse uma das
vítimas da falsa Microvlar, que direitos reivindicaria?
Marta - O mais importante é ter
a atitude de cidadania de denunciar o fato de imediato para que
providências sejam tomadas. Em
segundo lugar, é buscar seu lado
individual, verificar até que ponto
você terá seus
direitos. Você
está aí com
uma gravidez
não programada. É natural
que você não
tenha se estabelecido para
receber aquela
criança naquele momento.
Você tem que
recorrer a quem causou o dano.
O laboratório não colocou o produto no mercado com o princípio
ativo porque ele tem um sistema
que não garantiu a segurança da
saída dos seus produtos ao mercado. Um produto medicamentoso
não pode ter o mesmo procedimento da fabricação de sandálias.
Folha - Que avaliação a Vigilância Sanitária faz dos laboratórios
farmacêuticos no Brasil?
Marta Nóbrega - Há 382 empresas produtoras na área farmacêutica e elas estão em estágios diferentes. Cerca de 40% acompanham os moldes internacionais de
boas práticas de fabricação e controle, 30% estão em um limiar no
qual nós somos obrigados a interditar algumas áreas de produção e
30% têm limitações bem maiores.
Só este ano, 101 empresas foram
interditadas, de um total de 809.
Esse número inclui os laboratórios
produtores e as empresas que importam o produto, embalam e rotulam aqui no Brasil.
Folha - Qual a estrutura da Vigilância Sanitária hoje?
Temos 600 fiscais atuando na
área de portos, aeroportos e fronteiras. Nos últimos cinco anos a importação no setor farmacêutico
aumentou de US$ 80 milhões para
US$ 1,2 bilhão por ano. Para examinar os 382 laboratórios, as empresas que só embalam -que somam junto com os laboratórios
quase 900 empresas-, os 7.000
distribuidores e as 55 mil farmácias, temos 800 fiscais. No total, há
cerca de 2.000 fiscais para fazer toda a fiscalização do setor de medicamentos e também do setor de
alimentos. Não é suficiente. Calculamos que tenhamos de aumentar
este número para 10 mil fiscais.
Folha - Quais os problemas mais
frequentes levantados nas vistorias de laboratórios feitas pela Vigilância Sanitária?
Marta - Não ter garantia de esterilidade quando ela é necessária,
como no caso de produtos injetáveis. Não ter os procedimentos escritos, indicando que a equipe de
garantia de qualidade da empresa
passou frequentemente por todas
as etapas necessárias.
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