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Governo retém dinheiro de agências para pagar dívida
No primeiro mandato de Lula, 79% da verba aprovada por lei aos órgãos não foi gasta
Bloqueio neste ano passa de R$ 5,3 bilhões, mas agência de aviação civil foi poupada; especialistas criticam cortes, e governo não se manifesta
MARTA SALOMON
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
Criadas para incentivar investimentos privados no país e
fiscalizar a prestação de serviços públicos, as agências reguladoras vêm contribuindo com
um volume cada vez maior de
dinheiro para o ajuste fiscal do
governo. No primeiro mandato
do presidente Luiz Inácio Lula
da Silva, 79% do orçamento
aprovado por lei para as agências não foi gasto por elas, reforçando o caixa do governo.
Neste ano, o bloqueio preliminar de verbas nas agências
passa dos R$ 5,3 bilhões, mostra o Siafi (sistema informatizado de acompanhamento dos
gastos federais). De 2003 a
2006, a diferença entre as despesas autorizadas e o gasto registrado foi de R$ 14,6 bilhões,
quase três vezes o custo do projeto de transposição do rio São
Francisco, uma das prioridades
do PAC (Programa de Aceleração do Crescimento).
Com o apoio da ONG Contas
Abertas, a Folha pesquisou as
contas de dez agências reguladoras desde 2001. A cada ano,
cresce a parcela dos gastos autorizados destinados ao pagamento da dívida pública. A partir de 2004, a maior parte das agências passou a sofrer um
bloqueio antecipado de gastos,
chamado de "reserva de contingência". Em 2007, essa reserva representa 73% do orçamento das agências. A Anac (Agência Nacional de Aviação
Civil) -atualmente na berlinda, por conta de sua atuação no
apagão aéreo- foi poupada do
corte antecipado.
A origem do dinheiro contingenciado das agências são taxas
cobradas dos concessionários e
operadores. A maior parcela de
verbas retidas são pagamentos
de compensações financeiras
para a exploração de petróleo e
gás. Por lei, eles deveriam reforçar o caixa da ANP (Agência
Nacional de Petróleo).
"Trata-se de uma política de
governo de tentar inibir as
agências por asfixia; o orçamento é o combustível das
agências", avalia Álvaro Machado, presidente da Associação Brasileira das Agências de
Regulação. Ele diz que os cortes de verbas, combinados à demora no preenchimento das
vagas de dirigentes, teriam por
objetivo enfraquecer as agências, que começaram a ser criadas no final dos anos 90, acompanhando as privatizações de serviços públicos pelo governo
Fernando Henrique Cardoso.
Para Machado, os cortes de
verbas justificariam falhas na
fiscalização, entre outras atividades das agências, e podem
acabar por desestimular investimentos privados em setores
de infra-estrutura. "Os cortes
comprometem muito a fiscalização e o funcionamento das
agências", disse.
Um dos objetivos das agências reguladoras seria oferecer
aos investidores estabilidade
de regras dos negócios, independentemente das mudanças
políticas. Outro objetivo seria
criar mecanismos de fiscalização dos serviços privatizados.
Mas o que acontece é que as
agências se baseiam em informações repassadas pelas próprias empresas fiscalizadas.
Tesouro Nacional
Procurada pela Folha, a Secretaria do Tesouro Nacional
não quis se manifestar sobre o
bloqueio de gastos nas agências
reguladoras. Por meio da assessoria de imprensa, informou
que os gastos com ações de fiscalização das agências cresceram de R$ 74 milhões, em
2001, para R$ 266 milhões, em
2006. Nesse período, os gastos
totais das agências subiu de R$
811 milhões para R$ 1,3 bilhão,
de acordo com dados do Siafi.
A Abdib (Associação Brasileira da Infra-Estrutura e Indústrias de Base) critica o suposto enfraquecimento das
agências reguladoras. "Cortes
têm prejudicado o cumprimento de tarefas importantes, como a fiscalização de redes elétricas e de atuação de concessionárias até estudos para futuras rodadas de concessões à
iniciativa privada", relata a associação, como base em relatórios de gestão das agências.
De acordo com levantamento feito pela Abdib entre 1998 e
2005, as agências reguladoras
nas áreas de petróleo e telefonia foram as maiores vítimas
do bloqueio de gastos; eles
também atingiram as agências
de telefonia e transportes.
Colaborou HUMBERTO MEDINA , da Sucursal de
Brasília
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