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EXUBERÂNCIA ELEITORAL
8 anos em 2: para consertar os anos FHC
VINICIUS TORRES FREIRE
Os programas dos candidatos a
presidente costumam ser massacrados por comentaristas de
um pessimismo terrível e conservador, para não falar dos comentaristas econômicos francamente
direitistas e incapazes de conceber que um governo possa ser
mais imaginativo e atuante que o
de Fernando Henrique Cardoso.
Decerto os programas padecem
de "exuberância eleitoral" (o nome desta coluna, referência ao
"exuberância irracional" de Alan
Greenspan, presidente do banco
central dos EUA, que com a expressão discutia o exagero otimista dos mercados). Mas programas
são apenas isso: diretrizes, ênfases, metas a perseguir. Exigir precisão numérica e realizações imediatas é ignorar a realidade sempre imprevisível (tome-se o caso
de FHC, que mesmo no segundo
governo, já bem experiente, viu
suas metas serem desbaratadas
logo depois de anunciadas).
Enfim, num país de gente mais
instruída certas demagogias seriam aparadas. Mas não somos
assim e vamos dar o desconto.
Mais interessante é discutir
quais os empecilhos iniciais que o
novo presidente vai enfrentar antes de tocar seu programa (vai levar uns dois anos para arrumar a
casa). Considere o problema do
emprego. Os candidatos querem
incentivar a criação de trabalho
na agropecuária e com obras de
saneamento e casas populares.
Para criar emprego na agropecuária é preciso exportar mais ou
aumentar a renda da população.
A princípio, a exportação não vai
crescer o bastante: a economia
mundial cresce e consome pouco.
Um real mais desvalorizado (dólar mais caro) ajuda a exportar,
mas a tática tem limite: no fim
das contas, cria inflação, o que
inibe exportações e diminui a
renda das pessoas. E, caso o país
volte a crescer em 2002, os novos
empregos vão pagar bem pouco.
Para fazer obra de saneamento
ou casas populares é preciso investimento ou crédito. Investimento do governo não haverá tão
cedo. Algum crédito pode vir do
Banco Mundial. O crédito privado está muito caro, o que prejudica até a criação de um mercado
de capitais para o setor imobiliário. Uma saída pode ser a privatização de empresas de saneamento. Alguém vai encarar?
Para ter crédito mais barato pode-se, por exemplo, diminuir o
depósito compulsório dos bancos
(o dinheiro que eles não podem
emprestar, por ordem do governo), facilitar a cobrança de inadimplentes e reduzir impostos sobre os bancos (e passar a conta
para alguém). Pode-se aumentar
a economia do governo, o tal superávit fiscal. Tudo isso ajuda a
derrubar os juros. Alguém vai defender bancos e avisar que não
haverá programa social agora?
Mas medidas relativas a juros e
renda têm influência direta na
nossa capacidade de obter dólares, de que precisamos para pagar
contas no exterior. Se o juro cair
muito, entra menos financiamento em dólar. Se renda (emprego) e
crédito crescem rápido demais, o
consumo interno sobe muito, o
que piora a balança comercial
(políticas de exportação levam
tempo para funcionar).
Isso pode ser remediado com a
diminuição do consumo interno,
por meio de corte dos gastos do
governo (com o que se limitam investimentos e programas sociais).
Há mais perguntas: se o país voltar a crescer, de onde vai vir a
energia elétrica, o desastre dos
anos FHC? E a Previdência?
Isso não quer dizer que não é
possível fazer nada. Quer dizer
apenas que o novo presidente terá
de ser criativo, paciente e que, em
todos os casos, o seu ponto de partida vai ser uma terrível e impopular economia de gastos.
VINICIUS TORRES FREIRE, editor de Dinheiro, escreve às sextas-feiras
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