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Campanha de Arruda no DF financiou 236 candidatos
Prestação de contas à Justiça omitiu datas de pagamentos e CNPJ de beneficiados
Promotor diz que o elevado número de candidaturas ajudadas também pode indicar fraude; responsável por doações não é localizado
SILVIO NAVARRO
DO PAINEL
RUBENS VALENTE
DA REPORTAGEM LOCAL
Investigado por suspeita de
caixa dois e pagamento de
mensalão para deputados distritais, o governador do Distrito
Federal, José Roberto Arruda
(DEM), montou em seu escritório político uma espécie de
balcão de financiamento de
campanhas em 2006. Dali,
abasteceu 220 candidaturas à
Câmara Legislativa do Distrito
Federal, hoje alvo do escândalo, e 16 à Câmara dos Deputados, num total de R$ 642 mil.
Ao informar a saída dos valores da conta de campanha, a
prestação de contas de Arruda
omitiu à Justiça Eleitoral as datas dos pagamentos e o CNPJ
de quem os recebeu.
Flagrado em vídeos da Operação Caixa de Pandora da Polícia Federal recebendo maços
de dinheiro do seu ex-secretário Durval Barbosa (Relações
Institucionais), Arruda alega
que as gravações são do período
pré-campanha de 2006.
Promotor eleitoral em São
Paulo, Maurício Antônio Ribeiro Lopes afirmou que o elevado
número de candidatos ajudados por Arruda surpreende e
que, em tese, a ausência de datas pode significar ilegalidade.
"Isso é sério, pode caracterizar
fraude. Existem prazos para a
captação e a transferência de
recursos. Sem as datas, não há
como fiscalizar." O promotor,
porém, não vê ilegalidade na
distribuição em si.
Na prática, a conta da campanha ao governo do DF funcionou como um comitê eleitoral.
Candidatos ouvidos pela Folha
relataram, inclusive, que achavam ter sacado os valores de
um "comitê" ou do "diretório
regional" do partido. Mas, para
a Justiça Eleitoral, esse comitê
jamais existiu formalmente.
Os valores foram pagos em
duas remessas, de R$ 2.100 e
R$ 1.050 para cada aliado. Foram 397 repasses. A maioria
das campanhas desses candidatos só teve essa fonte de recursos. Alguns não declararam
à Justiça a entrada das doações
e outros nem sequer prestaram
contas da campanha.
Ao médico Dr. Ranon
(PMN), por exemplo, Arruda
declarou ter doado R$ 3.150 em
duas parcelas. O candidato, porém, informou à Justiça Eleitoral que arrecadou R$ 9.000 e
gastou R$ 3.000 na campanha,
mas que esses recursos foram
doados pela sua própria clínica.
"Sou empresário e a campanha
foi bancada por mim. Não me
lembro de ter recebido nenhum recurso dele [Arruda]."
Segundo relatos, funcionava
assim: o candidato recebia um
telefonema dos dirigentes do
seu partido e buscava os recursos em mãos, ora em cheques,
ora em dinheiro vivo, no escritório da campanha de Arruda.
"Fui até o partido, o DEM, e
peguei um cheque. Mas não
lembro quem assinava", diz Fabiano Alves (PR), 301 votos nas
urnas. Segundo dados do TSE
(Tribunal Superior Eleitoral),
ele não declarou a entrada desse dinheiro porque não prestou
contas de sua campanha.
"O partido [PPS] comunicou
que o comitê do Arruda iria disponibilizar R$ 3.100, aí eu fui lá
buscar os cheques", disse
Wisdnay Souza Sales (PPS),
259 votos. "Ele [Arruda] me
passou os recursos através do
PPS, deu o cheque através do
PPS. Eu peguei o cheque nominal e declarei. As pessoas do
PPS é que conversaram com o
Arruda, houve um acerto para a
aliança", disse Pedro Lacerda
Neto (PPS), 214 votos.
Legislação
A Lei Eleitoral permite que
um candidato redistribua doações feitas a ele para outras
campanhas, mas três características incomuns foram adotadas por Arruda: 1) o volume
pulverizado de 236 candidatos
a deputado; 2) a omissão das
datas em que os repasses foram
efetuados; 3) e o fato de alguns
não terem declarado a entrada
do dinheiro à Justiça.
Arruda informou à Justiça
ter arrecadado R$ 8 milhões e
desembolsado o mesmo valor
na corrida eleitoral. O principal
financiador de sua campanha
foi oculto. Cerca de R$ 3,57 milhões (44,3% do total) vieram
do Diretório Nacional do DEM,
cuja sede fica em Brasília. Por
uma brecha da lei, os diretórios
podem captar recursos de empresas e pessoas e repassá-los a
determinado candidato sem revelar a origem do dinheiro.
Segundo os candidatos ouvidos, o responsável pela entrega
das doações era o atual coordenador político do governo do
DF, Adelson Cardoso. Procurado, ele não ligou de volta.
O sistema de pulverizar doações é similar ao adotado em
2008 pelo candidato vitorioso à
Prefeitura de São Bernardo do
Campo (SP), Luiz Marinho
(PT). Ele declarou ter repassado às campanhas de 242 candidatos a vereador um total de
R$ 5 milhões dos R$ 11,2 milhões que arrecadou.
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