São Paulo, domingo, 07 de janeiro de 2001

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GOVERNO
Congresso ainda não votou o uso do real como moeda e a privatização de bancos; ainda há MPs do governo Itamar
FHC editou 86% das medidas provisórias

MARCELO SOARES
DA REDAÇÃO

O presidente Fernando Henrique Cardoso, em seis anos de governo, foi responsável por 85,6% das edições de medidas provisórias, somando originais e reeditadas. Elas surgiram há 12 anos, com a Constituição de 1988, e se transformaram no principal instrumento político do Executivo.
À frequência de reedições no governo FHC corresponde uma queda no número de MPs que se tornaram leis definitivas. Entre 1988 e 1994, 82,2% das MPs viraram lei. De 1995 a 2000, 58,3%.
Medidas importantes, como a própria circulação do real, ainda são provisórias. Essa MP, originalmente de número 1.053, foi editada 72 vezes desde o lançamento, em março de 1995.
Também não viraram leis a MP que determina a saída do Estado da atividade bancária (de 1996), a criação do cadastro dos inadimplentes com o governo (de 1995) e a que autoriza parentes a proibir a retirada de órgãos de alguém que morreu, na falta de declaração em contrário do morto (de 1998).
A maior parte das MPs se refere a assuntos econômicos, o que confirma afirmações de pesquisadores de que elas são usadas principalmente para ajustes rápidos na política macroeconômica. São 341, ou 58,4%, das 584 medidas lançadas até o final de 2000.
Questionado sobre as reedições de MPs, o governo costuma citar apenas o número de medidas lançadas, que é baixo. Foram 3,33 MPs novas por mês no primeiro governo e 2,96 mensais no segundo. Contando as reedições, a média foi de 54,4 e 92.
Mas ainda são editadas 40 MPs herdadas do primeiro mandato de FHC e duas da gestão Itamar Franco. Uma, editada 87 vezes desde abril de 1994, permite usar títulos públicos em privatizações.
Elas são mantidas com sucessivas reedições, muitas vezes modificando-se o texto original e incluindo novas disposições.
É o caso da MP 2.088, que criou a possibilidade de multar procuradores em até R$ 151 mil se a investigação for considerada descabida. Ela é a 35ª reedição da MP 1.669, de junho de 1998.
A MP que determinava o pagamento dos servidores públicos entre o segundo e o quinto dia útil do mês, com adiantamento no dia 20, também foi mudada em uma reedição. Hoje, a antiga MP 936, editada 76 vezes desde março de 1995, dá prazo até o quinto dia útil, sem adiantamento.
As reedições de MPs ocorrem quando expira seu prazo de 30 dias e o Congresso não as vota.
A Constituição não menciona a reedição. A possibilidade surgiu em 1989, no governo José Sarney. O projeto de resolução para regulamentar a tramitação das medidas foi feito pelo então senador Fernando Henrique Cardoso.
Ao defender a resolução 1/89, FHC argumentou que a perda da eficácia de MPs não votadas implicaria rejeição tácita da medida. Ele propôs que não houvesse reedições, mas o artigo foi rejeitado.
Segundo a cientista política Argelina Figueiredo, as reedições sucessivas sem conversão tornam indiferente o fato de a determinação ter a forma de lei ou de MP.
"Há uma certa inércia para votar algumas MPs. Se fossem votadas, ninguém se oporia. Elas acabam se tornando lei mesmo sem serem convertidas em lei", diz.
O único país que teria um instrumento legal similar à medida provisória é a Itália. Ele consta da Constituição de 1948.
Segundo Argelina, reedições sucessivas foram comuns até recentemente. Após várias tentativas do Legislativo, a Corte Constitucional (instância máxima do Judiciário italiano) decidiu proibi-las.


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