São Paulo, quarta-feira, 07 de março de 2001

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A MORTE DE COVAS

Para seguidores, governador se tornou "herói"

FLÁVIA DE LEON
LUIZ CAVERSAN
DA REPORTAGEM LOCAL

Se para as milhares de pessoas que compareceram ontem ao velório do governador Mário Covas ele era em vida um exemplo de político, depois de morto transformou-se praticamente num herói.
Maria Bezerra de Menezes, 50, Leandra Mendes, 44, e Anita Infante, 71, passaram a manhã de ontem agarradas às grades do portão n.º 1 do Palácio dos Bandeirantes. Em comum, as três tinham a paixão por Covas e a determinação de não voltar para casa antes de prestar a última homenagem àquele que definiram como "um pai", "paixão" e "um dos políticos que jamais esquecerei".
Elas eram apenas uma amostra da variedade de fãs de Covas que foram se despedir.
A abertura dos portões do palácio ao público ocorreu às 13h10 e, até 19h, cerca de 8.000 pessoas tinham passado por ali, segundo estimativa do capitão PM Roberto, da guarda do Bandeirantes. Naquele horário, ao menos 200 coroas de flores haviam sido entregues no local.
Com uma foto em que aparece ao lado de Covas, Maria deixava correr algumas lágrimas ao se lembrar da ocasião. "Ele foi inaugurar um hospital em Sapopemba (zona leste)." Na foto, Maria segura sua neta, Tainá, no colo. "Hoje de manhã cedo, quando ouvi a notícia, liguei pra ela e contei. Ela ficou chorando", disse.
A seu lado, Leandra, moradora de Guarulhos, dizia que Covas era seu ídolo político: "Eu era apaixonada por ele, de marido ter ciúmes e tudo".
A santista Anita Infante, que atualmente mora na Penha, acordou cedo para ver seu conterrâneo pela última vez. "Logo que ouvi no rádio, às 5h50, tratei de me arrumar logo e vir para cá, pois no velório do Ayrton Senna (piloto de F1, morto em 94) foi um sacrifício."
Anita participou das últimas homenagens a várias figuras públicas. "Além do Senna, fui ao velório da Elis Regina, ao do Jânio Quadros (prefeito, morto em 89) e até ao do Altemar Dutra.
Mais de 1.200 panfletos e quase 200 camisetas, todos com a foto de Covas, foram levados por uma comitiva do diretório municipal do PSDB de Itu, que fretou um ônibus para chegar a São Paulo. Também estiveram no palácio representantes do PSDB da Terceira Idade e do PSDB Jovem, cujos representantes levaram bandeiras da última campanha eleitoral com o nome de Covas.
Quem se definiu como uma fã ardorosa de Covas foi Carolina Cardoso, 23, que atua num programa social do governo do Estado na Zona Norte da cidade de São Paulo. Com os olhos cheios de água após ver de perto o corpo do governador, Carolina disse que Covas era "um homem admirável, que fez muitos projetos bons, como o que abre as escolas públicas nos fins-de-semana para tirar os jovens da rua".
Emoção diante do corpo do governador também sentiu, e demonstrou chorando muito, o motorista desempregado Sérgio Oliveira, 32. Vestido com uma camisa do Santos Futebol Clube autografada por Pelé, ele disse que Covas "deixou o Estado em dia. E eu admiro o fato de ele ter encarado tudo de frente. Lembra daquela frase dele, quando foi atacado pelos professores, que dizia que, se não pudesse sair de casa, não seria mais governador? Aquele professor que atirou um ovo nele deveria pedir desculpas publicamente."
Oponente político do governador à época das rusgas com o magistério, o professor Leandro (ele não quis dizer o sobrenome) arregimentou um grupo de alunos e colegas do Colégio Estadual Ascendino Reis, do Tatuapé, e foi homenagear o governador. "A nossa escola foi a última a ser visitada pelo Covas, em agosto. A postura dele como político era imaculada, apesar de nossas divergências."
Dar exemplo de um comportamento político elogiável foi o objetivo do comerciante José Nonato, 53, que levou a filha Lilian, 14, ao velório de Covas. Ele afirmou que estava lá porque respeitava muito Covas desde que foi prefeito. A garota, por sua vez, fez questão de afirmar que Covas foi "um homem muito corajoso, um verdadeiro herói".
Já o estudante Carlos Alberto Oliveira, 18, morador de Jandira, caminhou de Pinheiros até o Morumbi enrolado numa bandeira do Brasil. "Eu votei no Covas. Saí de casa de trem e fui até Pinheiros. De lá, caminhei até aqui. É uma última homenagem. Mesmo morto, tenho certeza de que ele está vendo", afirmou.
Quem não aguentou muito tempo na frente do palácio foi o ambulante Roberto Oliveira, 40, que trocou as mercadorias que vende no centro da cidade por flores artificiais. Oferecia duas rosas de tecido por R$ 1,00. Antes das 13h, já havia ido embora.


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