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TRABALHO INFANTIL
700 menores de 18 anos cavam a terra em busca de cassiterita no garimpo do Bom Futuro, em RO
Mineradora permite exploração de crianças
MARIO CESAR CARVALHO
enviado especial a Ariquemes (RO)
Vistos de longe, cobertos de lama, parecem animais na toca. Ao
se aproximar, vê-se que são crianças, de até 6 anos, cavando a terra
em busca de cassiterita no garimpo
do Bom Futuro, em Rondônia.
Não é um garimpo qualquer. A
jazida é explorada pela Ebesa (Empresa Brasileira de Estanho S.A.),
2¦ maior produtora desse metal no
país, do grupo Paranapanema.
Ali, trabalham cerca de 300
crianças com menos de 14 anos e
outras 400 de até 18 anos, segundo
Evandro Afonso Mesquita, 28,
coordenador da Comissão de
Combate ao Trabalho Infantil.
A lei permite que só maiores de
18 anos trabalhem em jazidas por
causa do perigo.
``Isso aqui é um campo de genocídio, é o garimpo em piores condições do Brasil'', diz Antonio do
Amaral, 48, presidente do Sindicato dos Trabalhadores nas Indústrias Extrativas de Rondônia.
Um diretor da Ebesa diz que a
mineradora não tem como coibir o
trabalho infantil e reconhece que
as condições são ``sub-humanas''.
Abundância e miséria
Bom Futuro é a segunda maior
jazida de cassiterita do Brasil. Neste ano, deve produzir 14.400 toneladas de cassiterita.
A cassiterita é uma matéria-prima estratégica -é com ela que se
faz estanho, usado para fazer solda
para produtos eletrônicos.
Em 1987, os garimpeiros começaram a chegar ao Bom Futuro,
distante 280 km de Porto Velho.
No começo desta década, chegou
a ter 25 mil habitantes -hoje são 3
mil. Em 1991, a Ebesa ganhou o direito de lavra sobre a jazida.
Uma decisão judicial garantiu
que os garimpeiros continuassem
na região -cooperativas vendem
a cassiterita para a Ebesa.
``Bom Futuro é uma experiência
única. Tentamos conciliar a atividade de uma grande empresa com
a dos garimpeiros'', diz Renato
Muzzolon, 42, geólogo da Ebesa.
O resultado social da experiência
é catastrófico, segundo Mesquita.
A maioria dos garimpeiros ganha
R$ 400, R$ 500 ao mês, mas acaba
gastando quase tudo para sobreviver. Do arroz à cerveja, tudo custa
o dobro, ao menos, por lá.
A miséria faz com que os pais coloquem as crianças para garimpar.
A cassiterita ocorre em filões em
meio à terra. Depois que escavadeiras cortam os barrancos, a
crianças entram com picaretas
atrás dos filões. O quilo do minério
é vendido a atravessadores por R$
1,20 o quilo -um terço do preço
de um quilo de estanho fundido.
Vilcemar Francisco Pinto, 14, faz
isso há quatro anos. Ganha R$ 400,
R$ 500 por mês. ``Trabalhar é melhor do que estudar. Tudo que eu
quero comprar, eu compro'', diz
ele, que saiu da escola na 3¦ série.
Artur Lima, 6, aprende o ofício
com o pai, carregando sacos de 5
kg na cabeça. ``Gosto de brincar de
carrinho e de trabalhar'', conta.
Mortes
De vez em quando cai um barranco. Em 1994, 19 pessoas morreram, para a Ebesa. O sindicato diz
ter contado 42 mortos, entre eles
uma criança de 6 e outra de 4 anos.
Pior que barrancos são os poços,
de até 23 metros, ligados por galerias que já somam 2 km. São ilegais, seguem operando e desabam.
Amaral diz que a Ebesa é conivente com a exploração de crianças porque não precisa contratar
mais funcionários. ``Ela tem 200
empregados e precisaria ter uns
800. Criança barateia tudo'', diz.
Centenas de multas do Ministério do Trabalho, uma intervenção
da Polícia Federal e duas do Ministério Público não foram suficientes para mudar Bom Futuro.
Mesquita vê duas saídas para o
garimpo: ou a Ebesa contrata os
garimpeiros, e veta crianças, ou o
governo intervém no local.
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