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Previdência Social redistribui renda, diz secretário
DA REDAÇÃO
Helmut Schwarzer, secretário
de Previdência Social do governo
federal, diz que fica "arrepiado"
quando alguém classifica o Estado brasileiro de "assistencialista".
Em sua opinião, o modelo criado
pela Constituição de 88 é de redistribuição de renda.
Apesar de discordar em quase
tudo do economista Raul Velloso
(veja entrevista acima), Schwarzer reconhece que os benefícios
criados pela Constituição de 88
são os principais responsáveis pelo crescente déficit do INSS (Instituto Nacional do Seguro Social).
Para o secretário, a aposentadoria rural não tem caráter assistencialista, mas previdenciário, por
estar relacionada à trajetória de
vida e de trabalho de quem vai recebê-la. Schwarzer sustenta que
todos os sistemas previdenciários
públicos do mundo têm um objetivo redistributivo.
A seguir, os principais trechos
da entrevista do secretário:
(CLÁUDIA TREVISAN)
Folha - O sr. concorda com a tese,
defendida pelo economista Raul
Velloso, de que devem ser excluídos das contas do INSS benefícios
que teriam característica assistencial, como aposentadoria rural?
Helmut Schwarzer - Em primeiro
lugar, os benefícios assistenciais
nos termos da legislação, que são
os benefícios da Loas [Lei Orgânica da Assistência Social], eles nem
aparecem nas contas da Previdência, porque são benefícios que
têm contrapartida automática do
Tesouro Nacional.
O segundo ponto diz respeito à
Previdência rural. O que ocorre é
uma diferença conceitual entre o
dr. Raul Velloso -e outras pessoas que têm a mesma posição-
e nós. Nós entendemos que Previdência rural é Previdência sim e
não Assistência Social. Embora
não exista uma contribuição individual monetária do trabalhador
em regime de economia familiar
na área rural, esse segurado contribui com 2,2% do valor da produção comercializada. Então, a rigor, existe uma contribuição.
Além disso, os benefícios que os
trabalhadores rurais recebem são
consequência da sua trajetória de
vida e de trabalho. Não é resultado de uma situação na qual a pessoa precise de Assistência Social.
Conceitualmente, Assistência Social é quando você não tem mais
meios para conseguir se sustentar, quando está abaixo de determinada linha da pobreza e não
tem mais renda nem patrimônio.
Folha - Outro ponto que Velloso
considera assistencial, ou melhor,
como benefício subsidiado, são as
contribuições urbanas equivalentes a um salário mínimo, porque
não teriam contribuições correspondentes ao benefício.
Schwarzer - É um benefício subsidiado, mas não assistencial. Internacionalmente, na evolução
dos sistemas de Previdência Social, as sociedades se decidiram
-e essa não é uma particularidade do Brasil- a incorporar no
sistema de Previdência Social elementos de distribuição de renda.
Internacionalmente, sistemas
públicos de Previdência têm esse
objetivo.
Folha - O sr. fez um estudo sobre o
impacto da aposentadoria rural na
redução da pobreza, não?
Schwarzer -Sim, junto com Guilherme Delgado e outros técnicos
do Ipea [Instituto de Pesquisa
Econômica Aplicada], fizemos
vários estudos, principalmente
nesse viés, que é o combate à pobreza e a criação de uma rede de
proteção social que não seja dependente de uma relação de favor, de esmola que o trabalhador
rural tenha em relação a alguém.
É um benefício que recebe em
função de sua trajetória profissional e lhe dá auto-estima, orgulho.
Não rebaixa a uma condição de
cidadão de segunda categoria.
O impacto da aposentadoria rural é extremamente favorável em
termos de redução da pobreza e
da indigência na área rural.
Folha - Mas, quando se olha para
a estrutura de despesa não-financeira da União, vê-se que os benefícios do INSS têm hoje um peso bem
maior ao que tinham antes da
Constituição de 88. Eram 18,8% da
despesa em 1987 e em 2001 eram
36,5% do total. Por isso, Raul Velloso sustenta que o perfil de Estado
que se adotou em 88 é o de um Estado assistencialista.
Schwarzer - Não, é equivocado.
É um Estado redistributivista, um
Estado que redistribui renda, e isso não necessariamente é assistencialista. A redistribuição de
renda é um pressuposto para que
se tenha economia de mercado
com estabilidade social.
Folha - Mas o argumento de que o
Orçamento da Seguridade é superdimensionado não é razoável?
Schwarzer - Acho que são duas
coisas diferentes. É claro que temos de manter um controle macroeconômico, tanto é que estamos propondo a reforma da Previdência do funcionalismo público, que não está vinculada à Seguridade Social, nos termos da
Constituição brasileira.
Agora, eu entendo que os gastos
redistributivos por meio da Previdência Social e do SUS [Sistema
Único de Saúde] são extremamente importantes para que possamos manter a estabilidade social. Essa rede de proteção social é
importante para o país.
Folha - Para alguns economistas,
esses benefícios estão superdimensionados e deveriam ser reduzidos.
Schwarzer - O que precisamos fazer é melhorar os controles para
evitar abusos, fraudes e malversação dos recursos. Mas no caso da
Previdência rural, que estudei, o
grau de equívoco é muito baixo.
São muito poucos os agricultores
que, a rigor, não deveriam estar
recebendo os benefícios.
Folha - O governo propôs a reforma da Previdência do setor público, mas não há nada no texto que
ataque o desequilíbrio do INSS. E a
LDO (Lei de Diretrizes Orçamentárias) estima uma trajetória explosiva do déficit do INSS, que passaria
de R$ 34,63 bilhões em 2004 para
R$ 147,8 bilhões em 2022. Não há o
risco de continuar o descontrole?
Schwarzer - Nós entendemos
que a maior parte do desequilíbrio do INSS é devida aos elementos redistributivos que estão embutidos no sistema. A Previdência
rural foi responsável por R$ 15 bilhões dos R$ 17 bilhões de déficit
que o INSS teve no ano passado.
Há uma série de elementos de
redistribuição de renda que, a rigor, precisam ser financiados
com recursos tributários e não
com recursos de contribuição.
Isso por uma lado explica, mas
não justifica o desequilíbrio. Não
nos sentimos confortáveis com o
desequilíbrio do INSS. Porque
existe um impacto macroeconômico e sobre as contas fiscais.
Por outro lado, o desequilíbrio
tem sua contrapartida social muito positiva. A trajetória dos últimos meses do desequilíbrio do
INSS foi causada pela evolução
mais recente do mercado de trabalho. Nós tivemos uma queda da
massa salarial nos últimos 12 meses. Se tivermos crescimento forte
e alta na formalização da mão-de-obra vamos corrigir a projeção.
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