São Paulo, sábado, 07 de agosto de 2004

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BC SOB PRESSÃO

Presidente do BC afirma que está a ponto de "perder a paciência" com denúncias, mas não pretende sair

Acusações beiram o ridículo, diz Meirelles

DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

O presidente do Banco Central, Henrique Meirelles, disse ontem que está a ponto de "perder a paciência" por considerar que as acusações contra ele chegaram ao nível do "patético, do ridículo".
Questionado se perder a paciência significava a possibilidade de deixar o governo, Meirelles foi enfático: "Não", apesar de já esperar novas denúncias "nos próximos dias, meses", por conta do clima eleitoral. Sua reação, a partir de agora, pode ser o silêncio. Meirelles diz estar analisando a possibilidade de parar de comentar as acusações feitas ele. "Talvez eu esteja cometendo um erro ao explicar tudo, porque criou a obrigação de explicar tudo", afirmou.
Segundo ele, um jornalista não entende um item qualquer de sua declaração de renda, "porque o criminoso que quebrou o meu sigilo fiscal passou para ele", e ele, Meirelles, tem de explicar.
O presidente do BC diz não saber o nome do "criminoso", mas, em tom de desabafo, afirma que o "mundo passou a funcionar ao contrário", ao comentar que nos últimos dias tem gastado seu tempo tentando esclarecer as acusações. "Eu não tenho que ficar correndo para provar."
Meirelles disse que até anteontem estava tranqüilo, porque avaliava que as acusações mereciam explicações, como as envolvendo a ordem bancária de US$ 50.677,12 e seu domicílio fiscal.
Quando tomou conhecimento do caso envolvendo o valor de um terreno seu em Vassouras (RJ), porém, avalia que passaram a "exagerar, chegando ao nível do patético, ridículo". "Minha inclinação a partir de agora é, quem tiver denúncia, que oficie a Receita. Não vou mais comentar, vou preservar meu direito de sigilo fiscal ou meu direito de perder a paciência", disse Meirelles.

Erro de cálculo
Sobre o terreno em Vassouras, afirma que houve um erro do cartório. Diz que o terreno foi adquirido em 1989 por NCz$ 2.200, mas a escritura foi registrada em seu nome apenas em 1998.
Na hora do registro, o cartório acabou não fazendo a conversão do valor em cruzados novos para reais. Escreveu apenas que o imóvel estava sendo registrado pelo menor valor da moeda atual, R$ 0,01, mas que ele havia sido adquirido em 1989 por NCz$ 2.200. "Mas está lá na escritura, foi comprado por NCz$ 2.200. Será que não leram isso?", disse.
Segundo Meirelles, seu contador, quando foi fazer sua declaração de renda, deparou-se com dois valores contraditórios na escritura, R$ 0,01 e NCz$ 2.200, que convertidos para real valeriam R$ 2.328,78. "Ele resolveu ser conservador e botou o menor valor da unidade real, que foi R$ 1. De uma simplicidade atroz. Só que nós estamos num clima que está me fazendo perder um pouco a paciência, que tudo que um sujeito olha e não entende fica suspeito."
Meirelles afirma que o erro acabou gerando prejuízo para ele: se for vender o terreno, para fazer o cálculo do Imposto de Renda a ser pago terá de deduzir apenas R$ 1 e não R$ 2.328,78, que seria o valor corrigido. Na sua declaração de bens encaminhada em 5 de julho de 2002 à Justiça Eleitoral de Goiás, o terreno aparece com o valor de R$ 4.000, que seria seu valor de mercado à época.

Novas acusações
Meirelles espera novas acusações para os próximos dias. "Como minha declaração é extensa, então a capacidade dos caras denunciarem nos próximos dias, meses, é enorme." Segundo ele, o clima eleitoral facilita a divulgação das acusações. Ele se antecipa e conta duas acusações que tem ouvido falar que serão publicadas contra ele. Uma, sobre "um apartamento milionário em Goiânia", que valeria R$ 1,03 milhão.
"Eu de fato tenho um apartamento em Goiânia, muito bom e o valor é esse mesmo. Qual é o problema? É uma situação complicada, o sujeito mistura a inveja dele com uma suspeita."
A outra acusação que foi ventilada seria sobre um imóvel que vendeu nos Estados Unidos. Ele não teria recolhido imposto sobre R$ 2 milhões recebidos da venda do imóvel. Segundo Meirelles, a versão da denúncia que ouviu seria embasada na declaração de tributaristas -segundo os quais o valor deveria ser tributado no Brasil. "Está errado, não é tributável, é uma dessas denúncias que circulam, é um dinheiro que tinha de ficar lá até terminar todos os cálculos de imposto americano."
Meirelles finaliza, em tom de desabafo: "É aquela coisa, homem público que tem tudo isso [patrimônio elevado] é ladrão. Só que eu ganhei esse dinheiro sendo presidente mundial de uma corporação americana. Desculpe, mas aconteceu. Ainda bem, bom para o Brasil, tem um brasileiro que foi lá e conseguiu".


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