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TRANSIÇÃO
Movimento elege latifúndio como alvo e promete abrandar invasões
Com Lula, governo deixa de ser "inimigo", anuncia MST
FÁBIO GUIBU
DA AGÊNCIA FOLHA, EM CARUARU
A direção nacional do MST
anunciou ontem em Caruaru
(PE) que, a partir de janeiro, o latifúndio, e não o governo, passará a
ser o novo "inimigo" do movimento. A entidade afirmou que
deseja a participação do presidente eleito, Luiz Inácio Lula da Silva
(PT), na luta contra as grandes
propriedades rurais, mas avisou
que não concederá uma trégua
formal ao futuro governo com relação às invasões -embora diga
que elas devam ser "abrandadas".
"Nós vamos fazer o possível para acabar com o latifúndio", afirmou o dirigente nacional do MST
(Movimento dos Trabalhadores
Rurais Sem Terra) Gilmar Mauro.
"Lula conhece os problemas do
campo e sabe que os brasileiros
querem mudanças."
Segundo Mauro, os sem-terra
esperam "uma atuação contundente" do futuro presidente contra o que chamou de "inimigo da
humanidade e do povo".
Inicialmente, disse, as pressões
do MST se voltarão contra os latifúndios que consideram improdutivos. Mas não está descartada
a possibilidade de ocorrerem
ações em grandes áreas produtivas, principalmente se elas não estiverem voltadas à produção de
alimentos. "Entendemos que todo processo de concentração gera
desigualdade", declarou Mauro.
A decisão de priorizar o combate ao latifúndio e reivindicar o
apoio de Lula foi tomada pelo
MST durante os três dias em que
as lideranças nacionais do movimento estiveram reunidas em Caruaru para avaliar e definir o comportamento da entidade em relação ao futuro governo.
Os dirigentes aprovaram uma
posição de "autonomia" em relação ao Estado e divulgaram uma
carta "ao povo brasileiro e ao presidente Lula" confirmando o otimismo dos sem-terra em relação
ao próximo governo.
Na carta, que será entregue hoje
a Lula e ao presidente nacional do
PT, José Dirceu, o MST responsabiliza a atual administração federal pelo "aumento da pobreza, da
desigualdade, do êxodo, da falta
de trabalho e de terra" e reivindica
a "construção de um novo modelo agrícola que priorize o mercado
interno, a produção de alimentos
e a distribuição de renda".
O movimento decidiu que não
aceitará cargos no futuro governo
por considerar a prática "oportunista". Entretanto, não se opôs a
participar de uma reunião com
integrantes da equipe de transição do PT, hoje em São Paulo.
"Vamos apenas ouvir o eles têm
a dizer", afirmou Gilmar Mauro.
"Por enquanto, não vamos apresentar nenhuma pauta de reivindicações", declarou.
As prioridades do MST deverão
ser encaminhadas progressivamente, até o final do ano. Entre as
principais estão o assentamento
de 100 mil famílias que estariam
acampadas em todo o país e a revogação da lei que suspende por
dois anos a reforma agrária nas
propriedades rurais invadidas.
Segundo os líderes sem-terra, as
invasões poderão continuar no
próximo governo. Entretanto, admitiram que poderá haver um
"abrandamento natural" das
ações, em razão da "perspectiva
otimista" dos lavradores.
"Mas, se houver ocupações no
início do próximo ano, isso não
significará uma afronta ao Lula",
disse Mauro. "Há situações que
levam o agricultor a esse tipo de
pressão", declarou.
A decisão de não conceder uma
trégua formal e ao mesmo tempo
admitir a possibilidade de um
abrandamento das ações sugere
que o MST optou por evitar riscos
de confrontos internos ou com o
futuro governo federal.
Ao manter a possibilidade de
haver invasões no governo Lula, o
movimento fica livre da acusação
de trair um eventual acordo ou de
não ter comando sobre suas próprias bases.
Na carta a Lula, o MST diz que
"o Brasil sofreu oito anos de um
modelo econômico neoliberal
implementado pelo governo
FHC, que só aumentou o sofrimento do povo e trouxe graves
prejuízos para quem vive no meio
rural, com o aumento da pobreza,
da desigualdade, do êxodo, da falta de trabalho e de terra".
O documento afirma que "o povo brasileiro disse não a este modelo econômico e agrícola. Votou
maciçamente nas mudanças e elegeu o presidente Lula. É uma vitória do povo. E uma derrota das elites e de seu projeto".
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