São Paulo, domingo, 08 de fevereiro de 2009

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ELIO GASPARI

A turma da banca deve contar quanto ganha


Os doutores das filiais de casas internacionais deixam a Viúva no escuro, e esse é um mau negócio


FELIZMENTE, a crise financeira revogou a santidade operacional usufruída nas últimas décadas pela banca internacional. O companheiro Obama empombou com o valor dos bônus pagos em Wall Street e sofreu a humilhação de ver desmoralizadas quatro pessoas de sua equipe porque não gostavam de pagar impostos. Em Pindorama, a Comissão de Valores Mobiliários baixou uma resolução (nº 562) determinando que as companhias de capital aberto explicitem os valores e as características dos benefícios oferecidos aos seus executivos. Beleza. Fica faltando o Banco Central fazer algo parecido com as filiais brasileiras de bancos de investimento estrangeiros.
Estima-se que existam no Brasil pelo menos 300 funcionários (quase sempre diretores) de casas da banca internacional com rendimento anual superior a US$ 1 milhão, algo como R$ 200 mil mensais. De uma maneira geral, 30% desse ervanário é pago em ações dos bancos, depositadas em Nova York. A posse desses papéis deve ser declarada à Receita Federal e comunicada ao Banco Central. Quem conhece o meio acredita que não chega a dez o número de executivos que exibem essa parte de seus patrimônios. Pelo menos um, tendo-o feito, caiu na malha fina do Leão, que suspeitou ter descoberto um mecanismo de lavagem de dinheiro.
Seria razoável supor que o pagamento fosse informado também pelos patrões, mas não há lei que os obrigue a fazê-lo.
Os empregados de uma casa bancária estabelecida no Brasil receberam um documento lembrando que o rendimento depositado no exterior deve ser informado ao BC. Esqueceram de mencionar a Receita, mas deixa pra lá. A mesma casa produziu um memorando interno informando que o bônus em ações é "um plano discricionário regido pelas leis dos Estados Unidos da América, não fazendo parte da sua remuneração de acordo com as leis locais brasileiras". Tudo bem, mas se o bônus tivesse sido pago a um executivo que opera na sede da empresa, em Nova York, a Receita local trataria o dinheirinho como rendimento. O lembrete destina-se a contornar o pagamento das obrigações trabalhistas, equivalentes a algo como 25% da renda. Pode-se dizer que isso é feito em nome da redução do "custo Brasil", mas os bancos brasileiros (e alguns estrangeiros) que não procedem assim acabam penalizados por fazer as coisas direito.
Empresas estabelecidas no Brasil não deveriam se associar a um mecanismo que permite aos seus funcionários enganar a Viúva, sumindo com um patrimônio depositado em Nova York. Imagine-se a assistente de um diretor beneficiário do truque. Ela tem um salário de R$ 5.000 por mês e desconta na fonte cerca de R$ 500 de Imposto de Renda. Seu chefe, que recebe o equivalente a R$ 200 mil mensais, sonega em 120 dias o equivalente a tudo o que a moça ganha num ano. (Admitindo-se que o bônus foi um rendimento do trabalho.)
Walter Wriston, presidente do Citibank mundial de 1967 a 1984, não promovia funcionários que fumavam porque, "se ele não cuida da própria saúde, não haverá de cuidar da saúde do banco". Se um diretor de uma casa de papéis faz de bobo o fisco do país onde trabalha, porque não fará de bobo o banqueiro que o emprega?
O tsunami financeiro mostrou ao mundo a fragilidade de uma banca que relaxou a relação de confiança que deve existir entre a instituição, seus gerentes e a clientela. Quando um acha que pode fazer o outro de bobo, todos acabam no papel de paspalhos. Pior: quando uma filial acha que pode fazer na terra dos outros o que não faz na sua, produz uma cultura colonial que desemboca em desconfianças, dissimulações e desfalques.
Como é que resolve? Bastaria criar um mecanismo pelo qual essas casas bancárias passassem a exigir dos seus executivos (para controle interno) uma cópia da comunicação feita ao Banco Central, detalhando o tamanho do bônus custodiado fora do Brasil. Quem não o fizer talvez não mereça a confiança de quem o emprega.

TOFFOLI NO STF
Pelo andar da carruagem, o advogado-geral da União, José Antonio Toffoli, de 41 anos, irá para a vaga da ministra Ellen Gracie no Supremo Tribunal Federal. Toffoli poderá ficar na corte até 2037, quando completará 70 anos.

DESFECHO
Quando a semana terminou, já havia maioria de votos no Supremo Tribunal Federal a favor da extradição de Cesare Battisti.

TRÊS EM NADA
Obama está com "pepinaço" maior do que se imagina. Não só pelo legume que recebeu de George Bush, mas também pelas encrencas que ele mesmo criou. O companheiro tinha três nomes para a Secretaria do Tesouro (Timothy Geithner, Lawrence Summers e Paul Volcker) e nomeou os três. Um para a secretaria, outro para sua assessoria e o terceiro para presidir um conselho.
Geithner assumiu abatido pelas liberdades que tomou deixando de pagar impostos. Enquanto claudicava, circulou a notícia (errada) de que seria substituído por Summers.
Obama só anunciou a composição do conselho chefiado por Volcker na sexta-feira, depois que ele fez chegar à Casa Branca o seu desconforto com a demora. Se o plano econômico de Obama vai funcionar, não se sabe. O que se sabe é que armação com muito cacique e pouco índio raramente funciona.

ITALIA BELLA
O Senado italiano aprovou uma lei que permite aos médicos da rede pública de saúde denunciar estrangeiros que vivem ilegalmente no país e buscam atendimento. Em 1935, o governo alemão vedou aos judeus o acesso às redes municipais de saúde. Nada a ver? Tudo bem, nada a ver.

O POTE DE OURO
Com a eleição de Michel Temer para a presidência da Câmara, Nosso Guia começou a costurar a manobra para preencher um cargo muito mais importante em ano eleitoral, o de presidente do PMDB.
Além dos votos, o partido dispõe de um tesouro eletrônico na partilha do horário gratuito de rádio e televisão durante a campanha de 2010.

EREMILDO, O IDIOTA
Eremildo é um idiota e está solidário com o deputado Edmar Moreira, o novo corregedor da Câmara, que ganha a vida numa empresa de segurança e construiu um castelo no interior de Minas. A única coisa que o cretino não admite é ser discriminado. O barão Edmar atribuiu o interesse pela sua propriedade à "curiosidade feminina". Eremildo é um idiota do gênero masculino e também gostaria de conhecer as qualidades que turbinaram o corregedor dos métodos de acumulação patrimonial dos outros deputados.

ALMANAQUE
Uma informação para quem mitifica a máquina militar dos Estados Unidos: o "Situation Room", aquela sala que há décadas entra no imaginário das pessoas como templo de modernas tecnologias, foi uma biboca até 2002, quando o presidente George Bush mandou reconstruí-lo. Noves fora os papéis espalhados pelas mesas e o barulho das máquinas de fax, tinha uma pequena cozinha, na qual não havia pia. Quem conhecer uma pessoa capaz de projetar e manter uma cozinha sem pia ganha uma viagem a Cabul.


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