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JANIO DE FREITAS
Você na corrupção
Logo você, que se mostra indignado com a corrupção, integrante dos 84% que a querem
investigada no Congresso e dos
80% que responsabilizam Fernando Henrique Cardoso pelas
ações corruptas no governo, logo
você é que está dando dinheiro
seu, que ganhou com o seu trabalho, para impedir que seja instalada a CPI da Corrupção. Convenhamos, é decepcionante, para
dizer o mínimo dos mínimos sobre sua atitude.
Por que a presunção de que você é um daqueles tantos por cento
e de que está pagando para evitar
a CPI? É simples. Se frequenta este
quintalzinho aqui, posso presumir sua discordância dos que, na
mídia, protegem a corrupção a
pretexto de que apoiar a investigação pela CPI tem o propósito,
apenas, de atingir Fernando Henrique. Não seria difícil demonstrar as motivações muito concretas de tal pretexto, mas não faltará oportunidade de fazê-lo. Por
ora, interessa pôr às claras a sua
contribuição financeira contra a
CPI da Corrupção.
Saiba você, se ainda não soube,
que a correção de 28,5% das tabelas do seu imposto de renda, diminuindo a quantia a pagar ou
aumentando a devolução a receber, foi aprovada no Senado e
chegou à Câmara sob a decisão,
tornada pública pelos líderes de
bancadas, de aprová-la em regime de urgência. Projeto do senador Paulo Hartung (PPS-ES). Já
era mais do que tempo: desde 95,
o governo Fernando Henrique
aumenta ano a ano o imposto de
renda, na moita, com o artifício
de não corrigir as tabelas.
Aplicada a correção de 28,5%, o
total de impostos arrecadados pelo governo neste ano diminuiria,
segundo os próprios cálculos governamentais, em R$ 3,5 bi a R$
3,8 bi. Ninharia, no montante final. Ainda assim, o cálculo é
mentiroso para cima, porque o
contribuinte, pagando menos ou
recebendo maior devolução, teria
mais dinheiro para gastar e, com
isso, geraria maior montante de
impostos recolhidos pelo governo.
Mas vá lá que o cálculo fosse honesto. Daqueles bilhões, então, o
governo federal só deixaria de receber entre R$ 1,5 bi e R$ 2 bi, e o
demais sairia da quota dividida
pelos estados.
Enquanto os deputados caminhavam para a aprovação do
projeto, o requerimento de CPI
empacava em 25 dos 81 senadores
(seriam necessárias 27 assinaturas) e em 144 dos 513 deputados
(necessárias 171 assinaturas).
Empacamento obtido por processo conhecido. Quando o apoio à
CPI no Senado e na Câmara fizera soar o alarme na moralidade
de Fernando Henrique, uma promessa presidencial depressa adquirira a solidariedade da maioria parlamentar: os bilhões tão do
agrado dos parlamentares, para
uso e desuso junto à sua clientela
eleitoral, seriam liberados em troca da recusa à CPI. O consagrado
método do é dando (dinheiro público) que se recebe (favores).
Recomposta a integridade moral do presidente, a meio da última semana os líderes das bancadas governistas foram chamados
para um papinho no palácio. Logo eram avisados de que Fernando Henrique acha "muito justa" a
correção do IR, como viria a narrar Geddel Vieira Lima antes de
voltar às compras, mas, se aprovada, provocaria uma reação
presidencial: seria suspensa a liberação de verbas "de interesse
social". O alarme soou na moralidade dos líderes das bancadas governistas.
Isso mesmo. Se aprovada a correção, embora ainda muito insuficiente, das tabelas do imposto de
renda, os bilhões prometidos aos
parlamentares não seriam liberados. Ou seja, é o seu dinheiro, leitor indignado com a corrupção e
ansioso por investigações, que está barrando a CPI da Corrupção.
Sai do seu trabalho, entra no seu
bolso, sai do seu bolso para o Tesouro Nacional, o governo o repassa ao destino desejado pelos
parlamentares governistas - e,
pronto, estão asseguradas a continuidade da corrupção e a tranquila impunidade dos corruptos.
No Brasil colônia, alguém que
diria que fosse se queixar ao bispo. Hoje não se dirá nem mesmo
que se queixe à ministra da corrupção. Quando muito, digo-lhe
eu que o atual Palácio do Planalto é a fonte da corrupção e o túmulo da decência política e administrativa.
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