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NEGÓCIO MILIONÁRIO
Empresas movimentaram R$ 119,6 mi em 97; entidades recebem em média 5% dos recursos envolvidos
Filantropia é fachada para sorteios de TVs
ELVIRA LOBATO
da Sucursal do Rio
A pretexto de arrecadar dinheiro
para entidades filantrópicas, montou-se no país um esquema milionário de sorteios pela TV que já
movimentou R$ 119,6 milhões em
97. Levantamento da Folha mostra que as entidades filantrópicas
são as que menos ganham nessa
nova indústria do jogo, que envolve as grandes redes de televisão.
Em junho, foram sorteados três
carros -um Audi, um Mercedes e
um BMW- para arrecadar fundos para a Santa Casa de Misericórdia de Cachoeira Paulista. O
contador da Santa Casa, Edson
Vieira, disse que os organizadores
do sorteio informaram que não
houve lucro, mas que eles farão
uma doação à entidade. "Até agora, não recebemos nada."
A Rede Record sorteou R$ 176,4
mil em prêmios para ajudar a
AMA (Associação de Amigos do
Autista) de São Paulo, em um de
seus programas de maior audiência: o de Ana Maria Braga.
A entidade levou um susto ao receber a prestação de contas do sorteio. A planilha de custos apresentada pela Abba Telecomunicações,
que administra os sorteios na Record, diz que houve uma receita
bruta de R$ 950.223 em ligações,
mas que R$ 940.182,52 foram consumidos com despesas do próprio
sorteio. Sobraram apenas R$
10.040,48 para os autistas.
A superintendente da AMA, Marisa Furia Silva, resume sua reação: "Foi uma afronta, uma vergonha. Usaram nosso nome e nossa credibilidade".
Nos sorteios da Globo, SBT,
Manchete e CNT, as entidades filantrópicas têm ficado, em média,
com 5% da arrecadação.
De dezembro de 96 a abril de 97,
foram feitos 130 sorteios para arrecadar fundos para as Apaes (Associações dos Pais e Amigos dos Excepcionais) no SBT, Manchete e
CNT. Cada entidade embolsou,
em média, R$ 10 mil.
A Globo foi a última das grandes
emissoras a entrar no esquema.
Seu primeiro sorteio foi ao ar na
madrugada de 29 de junho, durante a luta entre Mike Tyson e Evander Holyfield, e houve recorde de
ligações: 2,87 milhões de chamadas, que deram uma receita bruta
de R$ 8,6 milhões. As Apaes ainda
não receberam seu quinhão, mas a
federação calcula que o repasse será da ordem de R$ 367 mil.
Os sorteios pela TV foram legalizados em dezembro de 96, por
portaria do Ministério da Justiça. É
permitido um sorteio anual por
entidade filantrópica.
Pela portaria, as filantrópicas só
podem sortear um bem que elas
tenham recebido como doação de
terceiros, e aí reside mais uma distorção do sistema.
A listagem dos 400 sorteios já autorizados pelo Ministério da Justiça, obtida pela Folha, mostra que
as doações são feitas pelas próprias
emissoras de televisão ou por empresas diretamente ligadas à organização dos sorteios.
A prestação de contas da Abba
Telecomunicações para a Associação de Amigos do Autista de São
Paulo mostra que os prêmios foram lançados como despesa do
sorteio, contrariando o que determina a portaria. Os carros sorteados pela Globo aparecem como
doações da própria TV.
Os quatro Mercedes sorteados
mensalmente no programa de Hebe Camargo e as peruas Blazer sorteadas no humorístico "A Praça é
Nossa" figuram como doações da
Azimuth Zero Marketing e Propaganda Ltda., que negocia a compra
do espaço publicitário no SBT para os mesmos sorteios.
Em alguns casos, é o artista que
apresenta os sorteios quem assume o papel de doador. As cinco picapes sorteadas em agosto no programa de Sula Miranda (Manchete) foram registradas como doações da Sula Miranda Produções,
Comércio e Representação.
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