São Paulo, domingo, 08 de setembro de 2002

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PODER PARALELO

Pesquisa mostra que traficantes conseguem assumir poder de fato nas periferias de São Paulo e do Rio

Unesco aponta elo entre tráfico e violência

DA AGÊNCIA FOLHA

Apesar das diferenças encontradas pelo estudo da Unesco quanto à estruturação do tráfico em São Paulo e Rio de Janeiro, em nenhum dos mercados foi possível determinar com clareza como é feito o comando na ponta inicial da hierarquia dos traficantes.
A pesquisa, baseada em análises distintas nas duas cidades, mostra o tráfico de drogas diretamente relacionado à violência, especialmente aos casos de homicídio.
São nos bairros e áreas mais periféricas, em que Estado se mostra menos presente, que os traficantes conseguem transformar sua superioridade econômica em poder de fato e, por meio de repressão armada, dominam a vida social de comunidades inteiras.
Para o coordenador-geral do estudo, Michel Schiray, "apesar de casos fantásticos como o do [traficante Luiz Fernando da Costa] Fernandinho Beira-Mar, é muito difícil se chegar às responsabilidades altas pelo tráfico e mostrar as implicações acima do morro".
Schiray aponta diferenças na estrutura dos mercados paulista e carioca. Segundo ele, a lógica de São Paulo segue o modelo liberal clássico, com vários vendedores e consumidores. "O tráfico é menos sistemático do que no Rio."
O pesquisador Guaracy Mingardi identifica três principais níveis de traficantes no Estado: médios, pequenos e minitraficantes, presentes principalmente na cracolândia (região de consumo de crack no centro da cidade). A classificação policial varia de grande a pequeno traficante.
A maconha vem principalmente do Paraguai e do Nordeste e a pasta de coca, em pequenas quantidades, do Paraguai ou Bolívia. A maioria da cocaína em pó que entra no Estado é transportada para o exterior por grupos internacionais para a África e a Europa.
Já o estudo da professora da Uerj (Universidade Estadual do Rio de Janeiro) Alba Zaluar faz uma análise mais antropológica da estruturação do tráfico no Rio. Ela mostra a hierarquia do tráfico no varejo, com forte dominância do grande traficante sobre as instâncias inferiores.
"As taxas de homicídios cresceram barbaramente na periferia nos últimos anos. Isso não pode ser explicado pela migração, que na década de 60 já estava baixando, nem pela pobreza, que não aumentou dessa maneira no mesmo período. Os traficantes impõem sua força, tanto em São Paulo quanto no Rio." Para Alba, o crime organizado encontra no desenvolvimento da economia informal, inclusive do mercado de vendedores ambulantes, condições para crescer nas zonas mais pobres, como perspectivas de poder e dinheiro para o jovem.

Redes internacionais
Diante das dificuldades em identificar a utilização do território brasileiro por redes internacionais de tráfico de drogas, normalmente dados sobre movimentação financeira fornecem os melhores indícios sobre a influência do crime nas economias locais.
No Amazonas, Acre e em Rondônia -fronteiras de grandes produtores de cocaína, como Colômbia, Peru e Bolívia-, o incremento do tráfico a partir dos anos 80 é analisado na pesquisa da Unesco, que partiu do aumento de 76% das agências bancárias.
De 81 a 85, foi registrado um crescimento de 38% nas filiais bancárias no Amazonas, 82% no Acre e 173,5% em Rondônia. O período corresponde à duplicação da produção da droga nos três países produtores, gerando operações de dinheiro possivelmente para financiar atividades de tráfico e lavar benefícios. (AC)


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