São Paulo, terça-feira, 08 de outubro de 2002

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JANIO DE FREITAS

O erro na contagem

A inexplicada ocorrência na contagem dos votos de Lula da Silva, por alguns instantes diminuindo-os até chegarem ao absurdo de 41 mil abaixo de zero, faz com que a legitimidade eleitoral esteja na dependência de duas providências indispensáveis do TSE: o exame rigoroso do programa informático de apuração, particularmente dos votos para a Presidência, e a recontagem total desses votos.
A atitude do TSE diante do problema é previsível. O autoritarismo que o preside ficou bem exposto, publicamente, na prepotência com que o ministro Nelson Jobim censurou, a meio de suas tergiversações na "entrevista" de domingo à noite, a correta pergunta sobre a contradição entre o recurso à eletrônica e a lentidão que prejudicou as eleições.
A totalização dos votos pode estar exata. Mas disso não há certeza. A incorreção que em instantes devorou uma multidão, e forçou a suspensão da contagem por uns dez minutos, pode ter ocorrido, e não necessariamente uma só vez, com menos voracidade e por isso não ter sido notada. Tanto no caso de Lula da Silva, como de algum dos outros. Tanto fazendo subtração de votos, como acréscimo.
Uma certeza é resistente a tudo o que seja dito em contrário: ficou provado que o programa de totalização dos votos para presidente é falho e capaz de retirá-los a pelo menos um candidato.
Não é o caso, e tomara que não venha a sê-lo, de suspeitas. Ao menos por ora, o fato não é mais do que um comprovado defeito técnico, do qual todo o país pôde ter conhecimento pela notícia imediata em TV e rádio, embora rápida e logo mandada ao conveniente esquecimento. A explicação devida pelo TSE bastou-se em declarar um "erro de formatação nos votos de Lula". Mais vago, só um "pois é". E, no entanto, é isso mesmo: um erro em programa que não pode errar sem que isso fira gravemente o princípio da democracia e o fundamento do regime constitucional brasileiro.
A primeira utilização de contagem eletrônica deixou um precedente que deve sobreviver como alerta para todas as eleições. O "caso Proconsult" consistiu na adoção de um programa que, a cada quantidade determinada de votos para Leonel Brizola, transferia xis votos dele para Moreira Franco. A operação envolvera o próprio Moreira Franco, os técnicos em informática da Proconsult, o SNI e gente da TV Globo, na qual se realizaram reuniões das quais Brizola foi avisado por Homero Caza y Sanchez, então especialista da TV em marketing. Mas a difícil descoberta da manipulação, por intermédio da totalização informatizada, foi feita pelo jornalista Procópio Mineira com César Maia.
A rememoração do "caso Proconsult" não serve para comparação com o ocorrido agora, na contagem pelo TSE. Presta-se para lembrar o quanto é fácil, em informática, o uso de irrealidades reais para criar realidades irreais.
Daqui a três semanas, o programa de totalização informatizada de votos do TSE será incumbido de dizer quem presidirá o Brasil. Sua legitimidade para esta incumbência está em questão.


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