São Paulo, domingo, 08 de dezembro de 2002

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JANIO DE FREITAS

Contrários, mas favoráveis

A volta da inflação, já outra vez acima dos 10%, ao fim de oito anos de Brasil sacrificado a pretexto de liquidá-la, é atribuída a Luiz Inácio Lula da Silva: o que trouxe de volta a inflação foi a retomada da alta do dólar, por sua vez provocada pela demora de divulgação do futuro ministério e do presidente do Banco Central.
Mesmo a porta-bandeira, na mídia, das políticas fernandistas de todo o poder ao "mercado", reconhece: "No dia 30 de novembro de 1994, o presidente eleito Fernando Henrique anunciou os nomes de Pedro Malan, para o Ministério da Fazenda, e de Pérsio Arida, para presidente do Banco Central. Fora eleito no dia 3 de outubro e demorara 57 dias para fazer o anúncio. Lula foi eleito há 39 dias e está sendo tratado como se estivesse atrasadíssimo no processo de montagem do novo governo" (Míriam Leitão, "O Globo", anteontem).
O dólar voltou a subir porque voltou a especulação tal qual ocorrera na campanha eleitoral, lançada pelo próprio presidente do Banco Central, Armínio Fraga, com o anúncio intempestivo de que o governo quitaria, em vez de prorrogar, os títulos cambiais, que são corrigidos pelo valor médio do dólar nos três dias anteriores ao vencimento. Em vez de Armínio Fraga, o candidato Lula da Silva foi responsabilizado, em todos os jornais, TVs, revistas e rádios, pela alta do dólar e suas consequências.
Por mais que haja interessados, não pode haver especulação se não houver quem a alimente. Antes da eleição, agora e no futuro. E quem a alimenta é a mídia. Sobretudo os jornais, que no Brasil se põem como porta-vozes diários dos economistas e administradores do sistema financeiro, que faz fortunas cotidianas com jogadas na moeda e nas bolsas. Todos os dias se pode ler ou ouvir punhados de economistas obscuros ou desqualificados, mastigando os seus jargões em agressão ao idioma e à inteligência: mais do que admitidos, são bem-vindos, são solicitados pelos jornais e certas rádios. O jornalismo que condena a inflação e a especulação é o mesmo jornalismo que, por outra via, as alimenta.

Autoconvidados
Não bastando os escolhidos que certos jornalistas inventam, pelo vício do chute impune ou para responder à pressão das chefias por informações no entanto inexistentes, a cada dia cresce o número dos adeptos de nova e intensa atividade. São os que distribuem, a ouvidos predispostos, a confidência de um convite ou sondagem para assumir esse ou aquele cargo.
Vários logo chegam aos jornais. Mas o objetivo não é necessariamente esse. As confidências são inventadas com o destino certo de criar ou recompor prestígios junto a determinados lugares e pessoas. Os autores passam a ser vistos como pessoas "próximas dos homens", o que abre muitas portas.
Só a lista dos autoconvidados para presidir o Banco Central encheria toda esta coluna.

Improbidades
Há tão poucos meses atrás, algum petista entraria logo com ação judicial contra o gasto de R$ 4 milhões dos cofres públicos em propaganda, na TV, informando que Fernando Henrique obteve um prêmio na ONU. A legislação proíbe o uso de dinheiro público em propaganda que beneficie o governante.
É por essas e centenas de outras que Fernando Henrique faz todos os esforços possíveis, não importa o grau de legitimidade, para obter foro privilegiado nos processos por improbidade contra contra governantes e ex-governantes.
Facilitar ou não dificultar a aprovação desse foro inconstitucional foi, aliás, um dos dois pedidos de Fernando Henrique a Lula da Silva, quando o convidou ao palácio e ofertou-lhe uma transição amigável. Amigável, bem entendido, de parte a parte.
O outro pedido foi, não se sabe por quê, a permanência de José Gregori na Embaixada em Portugal.



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