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CRIME ORGANIZADO
Mariners montam escola para combate ao tráfico na selva, o que poderia pressionar o Brasil
Ação dos EUA no Peru preocupa a PF
ELVIRA LOBATO
enviada especial ao Peru
A presença de fuzileiros navais
norte-americanos na cidade de
Iquitos, no Peru, a 150 km da
fronteira com o Brasil, a propósito de treinar policiais para o combate ao narcotráfico na selva,
preocupa a Polícia Federal brasileira.
Cerca de cem mariners se instalaram em Iquitos, com a criação
de uma escola de operações ribeirinhas pelo Comando Sul (EUA),
em convênio com a Marinha de
Guerra do Peru. Os militares norte-americanos investiram US$ 78
milhões na escola.
Documentos internos da Polícia
Federal, obtidos pela Folha, interpretam a presença de militares
norte-americanos na região como
uma forma de pressão para a militarização do combate ao narcotráfico na América Latina.
A Polícia Federal critica a presença dos fuzileiros navais norte-americanos no país vizinho, mas
apóia a participação da DEA
(Drug Enforcement Administration), agência de combate ao tráfico dos EUA que tem caráter civil.
Em dezembro passado foi criada, em Lima, a Escola Regional da
Comunidade Andina de Inteligência Antidrogas, que reúne as
polícias do Brasil, Peru, Colômbia, Bolívia, Equador e Chile.
A escola é vista pela PF como
uma oportunidade de criação de
uma doutrina regional de combate ao narcotráfico e como uma
contraposição à influência norte-americana.
Desde 1996, o Brasil e países vizinhos andinos passaram a trabalhar em conjunto para identificar
os líderes do tráfico internacional
de cocaína. Os problemas são comuns, porque as organizações invadiram as fronteiras e se tornaram regionais.
A principal organização traficante de cocaína do Peru, o grupo
Cachique Rivera, está infiltrado
na região do Alto Solimões, no Estado do Amazonas. Por outro lado, brasileiros estão assumindo
funções de comando intermediário em organizações peruanas.
Oito brasileiros estão presos no
Peru por tráfico internacional de
cocaína, segundo informação da
Dinandro, Divisão Nacional Antidrogas daquele país. Segundo o
general Dennis Del Castillo, chefe
da Dinandro, é crescente o envolvimento de brasileiros com o narcotráfico em território peruano.
A Superintendência da Polícia
Federal no Amazonas instaurou
inquéritos para apurar o desaparecimento de seis aviões pilotados
por brasileiros sobre a selva peruana nos últimos três anos.
Os pilotos, segundo a PF, estavam supostamente transportando pasta-base de coca do Peru para os laboratórios de refino da Colômbia e foram abatidos.
No início de dezembro, foram
encontrados na selva peruana os
corpos de dois brasileiros, ainda
não identificados, entre os de três
integrantes de uma organização
local chamada Cristóvão.
A última prisão de brasileiro em
solo peruano por tráfico de cocaína ocorreu no dia 17 de novembro. Segundo a Dinandro, Gustavo Loja Fernandes foi preso com 4
kg de cocaína pura escondidos
em uma mochila, quando tentava
apanhar um vôo interno. As demais prisões ocorreram entre janeiro de 97 e junho de 99.
Segundo a Dinandro, os brasileiros ficarão pelo menos seis
anos presos.
O governo do Peru deflagrou,
há quatro anos, um cerco contra
a produção, o consumo e o tráfico de cocaína em seu país. Apesar de reduzir a área de plantio à
metade, estima-se que a droga
ainda gere uma receita de US$
500 milhões por ano.
Segundo o general Del Castillo,
há ""decisão política" de eliminar
o narcotráfico no país, que começou pela aprovação de uma lei
que incentiva os traficantes a denunciarem os chefes das organizações. O benefício para o delator vai da redução ao indulto da
pena.
A legislação sobre o uso do espaço aéreo também foi alterada e
a polícia está autorizada a derrubar aeronaves que estejam trafegando sem autorização.
Se o piloto não responder à ordem de pouso, a aeronave é derrubada. Nos último três anos,
nove aviões foram abatidos e, entre eles, estavam os seis aviões
brasileiros informados pela PF.
O general Del Castillo diz que o
cerco exercido pelo governo peruano, em conjunto com os Estados Unidos, levou as organizações narcotraficantes a mudarem sua estratégia de ação.
Ele explica que o Peru é, tradicionalmente, fornecedor de pasta-base de coca para os laboratórios da Colômbia. A pasta-base é
um estágio intermediário da industrialização da folha de coca,
que precede o refino.
Antes do cerco, iniciado em 96,
a pasta-base seguia diretamente
para a Colômbia, por aviões.
Com o risco de abatimento das
aeronaves, os traficantes passaram a levar a droga por barcos
até a fronteira com o Amazonas e
o Acre, onde é apanhada por pilotos brasileiros e levada para a
Colômbia. A segunda rota é o
Equador, que se tornou um corredor no transporte da pasta-base do Peru para a Colômbia, semelhante ao Brasil.
O general diz que a política de
combate ao narcotráfico no país
é definida pelo governo peruano
e que os norte-americanos dão
apenas suporte às suas ações,
que são traçadas pela Dinandro e
pelo Serviço de Inteligência, ligado à Presidência da República.
""Não há interferência. Somos
um país soberano", afirmou.
Ele diz que as polícias do Brasil,
Peru, Bolívia, Colômbia e Equador estão agindo juntas para enfrentar as organizações de tráfico
de cocaína na região amazônica
e, na avaliação dele, o Brasil vem
assumindo uma posição de liderança nesse campo. Segundo o
general, cem aviões de traficantes foram apreendidos nos últimos anos como resultado da
ação conjunta desses países.
A repressão nas fronteiras tem
levado a uma sofisticação do narcotráfico no Peru. Segundo o general, as organizações, que antes
se limitavam a produzir a pasta-base no país, estão montando laboratórios de refino próximos a
Lima, na costa do Pacífico.
Com a atividade mais produtiva (o refino) ficando no país, o
Peru vem se tornando também
um país de lavagem de dinheiro
do narcotráfico.
Segundo o general, o valor de
bens apreendidos em poder de
narcotraficantes triplicou nos últimos três anos, passando de US$
8 milhões em 1997 para US$ 24
milhões no ano passado.
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