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D. WALMOR OLIVEIRA DE AZEVEDO
"A fé como uma
simples tradição
entrou em colapso"
DA REDAÇÃO
Embora acredite no laço familiar da catequese, d. Walmor Oliveira de Azevedo, 49, novo arcebispo de Belo Horizonte, enxerga
que é a conscientização -sustentada por um misto de fé e razão-
que trará mais fiéis para a Igreja.
A fé meramente tradicional, segundo ele, entrou em colapso.
D. Walmor foi um dos responsáveis pela tradução da Bíblia para o português, pela CNBB (Conferência Nacional dos Bispos do
Brasil), e é identificado com o setor moderado do clero.
Em Belo Horizonte, ele deverá
substituir o atual arcebispo, o cardeal Serafim Fernandes de Araújo, 78, que renunciou ao completar os 75 anos regulamentares.
Folha - É possível falar que, com a
posse dos novos arcebispos, a Igreja encerra um ciclo de renovação?
D. Walmor Oliveira de Azevedo -
Sem dúvida, as substituições naturais que estão sendo feitas revelam um rosto novo para a Igreja,
em função das respostas que a
realidade, a vida e a própria Igreja
pedem que sejam dadas.
Folha - Quais são essas respostas?
D. Walmor - Elas estão inscritas
nos quadros de rearticulações de
dimensões muito fundamentais
da vida. Nós estamos em um tempo em que, embora constatemos
tantos progressos e tantas conquistas, a pobreza aumentou. Não
temos conseguido soluções para
problemas muitas vezes básicos.
Folha - Existe uma tendência nas
populações mais carentes de optar
por um outro tipo de Igreja, as neopentecostais. O senhor acredita
que a Igreja Católica tenha de assumir uma postura mais combativa
por causa dessa fuga de fiéis?
D. Walmor - O que precisamos é
dar respostas bem articuladas, de
modo a olhar com sinceridade,
com competência e com lucidez a
realidade social, política e econômica. Creio que esse é o modo de
a Igreja enfrentar o que as estatísticas mostram, não como quem
quer meramente reconquistar para dizer que tem número.
Folha - O senhor crê em uma certa
transformação da fé, deixando de
ser algo meramente tradicional para outra, mais consolidada?
D. Walmor - Nós estamos em um
contexto sociocultural e religioso
em que a superação de uma fé por
simples tradição de fato entrou
em colapso, podemos até dizer.
Mas não quer dizer o fim da importância da dinâmica da tradição de pai para filho. Em uma sociedade moderna, a hegemonia
da racionalidade abriu caminhos
interessantes, entre eles o da conscientização. A conseqüência de
assumir decisões é a de fazer opções com a consciência elaborada.
Folha - O governo Lula, sobretudo o programa Fome Zero, foi bastante criticado por figuras da Igreja Católica. Até que ponto a entrada de Patrus Ananias, historicamente ligado à Igreja, pode melhorar essa avaliação do governo?
D. Walmor - Patrus Ananias é um
ministro de grande competência.
Isso é muito importante para que
projetos na área social que estão
sob sua responsabilidade possam
de fato decolar. Penso que o governo neste primeiro ano com esse projeto Fome Zero encontrou
dificuldades, pois muitas vezes a
burocracia não conseguiu agilizar
questões importantes. A Igreja,
em função de sua presença em
tantos lugares, tem grande contribuição a dar para esse projeto.
Folha - E como o senhor avalia a
relação da Igreja com o governo?
D. Walmor - A relação Igreja-governo é sempre importante, sobretudo no diálogo. Isso tem que
ser feito de maneira nacional,
com a CNBB. Nos Estados e nos
municípios também. A Igreja deve participar dessa construção.
Folha - A Igreja acusou os laboratórios farmacêuticos de genocídio,
por não baratearem medicamentos contra a Aids, mas ao mesmo
tempo é contra o uso de preservativos e a distribuição de seringas
descartáveis. Não é contraditório?
D. Walmor - A Igreja quer salvar
as populações e sabe que precisa
batalhar e exigir que aqueles que
têm o poder dêem as condições de
promover essa melhora. Quando
se fala da distribuição de preservativos, muitas vezes se pensa como resposta à necessidade imediata e se esquece da necessidade
de se partir de princípios éticos. A
crítica que o Vaticano faz da não-disponibilização de medicamentos é para dizer que princípios
apenas burocráticos são insuficientes para superar epidemias.
Folha - Há dois anos, o noticiário
sobre religião teve uma concentração de denúncias de pedofilia na
Igreja Católica. Passado esse período, como a Igreja enfrenta assuntos polêmicos como esse?
D. Walmor - A Igreja Católica,
mesmo se na história tenha essa
ou aquela falha, é especialista em
humanidade. Embora com tanto
alarde acerca do assunto, a Igreja,
sabendo do problema, vai sempre
trabalhar. A recomposição do humano é a coragem de tocar em
suas próprias feridas.
(MSS)
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